Economia

Bônus demográfico do Brasil chegou ao fim

12 mar 2019, 15:49 - atualizado em 12 mar 2019, 15:54
Documento aborda os fatores que levam à necessidade de reforma previdenciária (CNT)

A Instituição Fiscal Independente (IFI) do Senado publicou um detalhado estudo sobre a proposta de emenda à Constituição que traz novas regras de aposentadoria. Dividido em quatro capítulos, o documento faz o diagnóstico da atual condição demográfica, detalha a atual Previdência Social, analisa a PEC 6/2019 e calcula os impactos das mudanças contidas na proposta para o Benefício de Prestação Continuada (BPC) e o abono salarial. (veja o estudo no final do texto)

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Ao apresentar o relatório, o diretor-executivo da IFI, Felipe Salto, destacou a fixação de idade mínima e a criação das alíquotas progressivas como dois importantes pilares da PEC, que, para ele, traz mudança relevante para o cenário fiscal.

O documento aborda os fatores que levam à necessidade de reforma previdenciária, mostrando como o maior envelhecimento e a queda da natalidade — e, como consequência, a redução do crescimento da população em idade ativa — estão dificultando o financiamento da Previdência. De acordo com a IFI, a queda relativa da população economicamente ativa indica perda da capacidade de financiar os grupos dependentes da população, que são os jovens de até 14 anos e os idosos.

“Em um sistema de Previdência Social baseado no regime de repartição, em que os trabalhadores da ativa sustentam os indivíduos aposentados, isso configura um fator de preocupação”, destaca o texto.

Para se ter ideia, o deficit previdenciário, incluindo regimes público e privado, foi de 5,1% do PIB em 2017. Os números fornecidos pelo estudo mostram a despesa com aposentadorias por idade e por tempo de contribuição do regime geral saltando dos atuais 4,3% do PIB para de 8,5% a 10% do PIB até 2060, caso nada mude.

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“O deficit agregado da Previdência Social, contabilizados os regimes público e privado, é da ordem de R$ 900 bilhões”, diz Felipe Salto, diretor da IFI (Pedro França/Agência Senado)

Bônus

— A análise dos dados previdenciários evidencia que o período do chamado bônus demográfico já está terminando. Essas questões demográficas trarão dificuldades ao financiamento dos gastos com aposentadorias, pensões e benefícios sociais. O deficit agregado da Previdência Social, contabilizados os regimes público e privado, é da ordem de R$ 900 bilhões, mais de 13% do PIB — ressalta Felipe Salto, diretor-executivo da IFI.

Em boa parte do mundo, a idade mínima é o critério mais usado para a concessão das aposentadorias. O Brasil é um dos poucos países do mundo em que a idade mínima não constitui uma condição necessária para os indivíduos se aposentarem. A IFI, inclusive, compara o sistema brasileiro ao dos países do G-20 e da América Latina, onde recentes mudanças já elevaram a idade mínima para aposentadoria.

Na América do Sul, Argentina, Chile e Peru já exigem, ao menos, 65 anos. Na Alemanha, Austrália, Coreia do Sul e Estados Unidos, estão valendo regras de transição para elevar gradualmente a idade mínima de aposentadoria.

A razão de dependência pode ser decomposta em: razão de dependência de jovens (RDJ) e razão de dependência de idosos (RDI). A soma das duas componentes fornece a razão de dependência total (RDT).

O gráfico ilustra o fenômeno do fim do bônus demográfico. A RDT começará a crescer a partir do início da próxima década, impulsionada pelo maior incremento na RDI. A título de comparação, em 2000, segundo o IBGE, a RDT registrada foi de 55,4%, em que 46,7% era devido à RDJ e 8,7%, à RDI. Em 2020, a RDT deverá ser de 44,3%, com 30,1% de RDJ e 14,2% de RDI. Até 2060, as projeções do IBGE indicam uma RDT de 67,2%, sendo 24,6% devido à RDJ e 42,6%, à RDI.

“O envelhecimento da população, fenômeno que indica melhores condições de saúde para os cidadãos brasileiros, trará consequências não apenas para o sistema previdenciário, como também para a economia, impondo ao país o desafio de elevar os níveis de produtividade do trabalho para manter o crescimento econômico em bases sustentáveis”, destaca o estudo.

Regimes

Com 80 páginas, o relatório detalha a situação dos trabalhadores vinculados ao Regime Geral da Previdência Social (RGPS) e dos servidores públicos. Além disso, a correção do salário mínimo vem elevando os Benefícios de Prestação Continuada a 7,6 vezes o nível de 1999. De acordo com a IFI, os benefícios do regime geral evoluíram acima da inflação nos últimos 20 anos. Por outro lado, a aposentadoria média do servidor público federal equivale a 19 vezes à do regime geral, diz o documento. Da mesma forma, as pensões no serviço público federal são 17 vezes superiores ao benefício médio do regime geral.

A PEC torna as regras de aposentadorias e pensões mais restritivas para reduzir o deficit financeiro e atuarial dos dois regimes que hoje existem — o RGPS e o Regime Próprio da Previdência Social (RPPS), este último financiado pelos servidores públicos.

Na avaliação da IFI, a principal inovação introduzida pela PEC é a mudança das regras relativas ao recebimento das aposentadoria e pensões do RPPS e do RGPS. Além disso, a PEC traz a progressividade na cobrança das alíquotas previdenciárias. O impacto fiscal esperado é de R$ 1,1 trilhão, em 10 anos.

Serão exigidos 65 anos de idade para homens e 62 anos para mulheres (Imagem: Ministério da Economia)

Novas regras

A PEC altera as regras de aposentadoria e pensão do RGPS e do RPPS. Atualmente as regras do regime geral são de 35 anos de contribuição para homens e 30 anos para mulheres. Também é possível a aposentadoria por idade: 65 anos, se homem, e 60, se mulher, desde que tenham sido cumpridos 15 anos de contribuição.

A PEC propõe nova regra para os trabalhadores da iniciativa privada: idade mínima de 65 anos para homens e 62 para mulheres, além de 20 anos de contribuição para ambos os sexos.

Já no caso do regime próprio dos servidores públicos, a regra atual prevê o mínimo de 10 anos de serviço público e 5 anos no cargo em que se der a aposentadoria, além da exigência de 60 anos de idade e 35 anos de contribuição, se homem, e 55 anos de idade e 30 anos de contribuição, se mulher. Há também a possibilidade de aposentadoria com 65 anos de idade para homens e 60 para mulheres, com benefício proporcional ao tempo de contribuição.

Pela nova regra proposta pela PEC, serão exigidos 65 anos de idade para homens e 62 anos para mulheres, desde que cumpridos 25 anos de contribuição, 10 anos de serviço público e 5 anos no cargo.

“A regra básica de elegibilidade será a idade. Nota-se, portanto, o fim da aposentadoria por tempo de contribuição, já que não há mais a possibilidade de se aposentar atendendo apenas a esse requisito”, resume o documento.

A IFI pontua, contudo, que o cálculo da aposentadoria também levará em conta a média dos salários e o tempo de contribuição. Isso será feito com base na média aritmética simples das remunerações e dos salários de contribuição utilizados como base para a contribuição ao RPPS e RGPS. Sobre essa média aplica-se o percentual de 60%, percentual esse que sobe dois pontos percentuais para cada ano a mais de contribuição que ultrapassar os 20 anos.

Sonegação

O documento avalia como outro pilar do projeto de reforma da Previdência Social as cobranças da dívida ativa da União, em especial as que se originam das contribuições previdenciárias. Um projeto ainda a ser enviado pelo governo ao Congresso deve tratar especificamente desse tema, mas já foi adiantado que a ideia é aperfeiçoar e intensificar a cobrança das pessoas físicas e jurídicas que devem à União para atenuar o desequilíbrio do INSS.

Do que pode ser cobrado, estimado em R$ 427,4 bilhões, cerca de 63% (ou R$ 269,4 bilhões) apresentam chance remota de recuperação, enquanto 37% (ou R$ 157,9 bilhões) podem, em algum grau, ser recuperados.

— O montante de recursos que pode ser recuperado por meio do endurecimento das ações de cobrança é calculado em R$ 87 bilhões — afirma a IFI.

Veja o documento na íntegra: