Yuan Digital: Depois do hype, moeda digital enfrenta dificuldades para provar que é útil à China
O Yuan Digital (e-CNY) estava no centro do palco mundial em janeiro do ano passado, quando o Banco Central da China lançou um projeto-piloto para desenvolvê-lo e incentivar sua adoção. Os esforços de Pequim fizeram com que, no fim de 2022, a CBDC chinesa somasse 13,61 bilhões de yuans em circulação – o equivalente a US$ 2 bilhões.
Mas, para analistas e profissionais do mercado financeiro ouvidos pelo site The Block, o hype em torno da moeda digital chinesa desapareceu, e o Yuan Digital enfrenta, agora, a dura missão de provar que é, de fato, útil à China.
“Demora um pouco mais construir uma moeda digital onipresente, do que lançar uma criptomoeda da noite para o dia, porque você deve assegurar que ela funcionará a qualquer momento para qualquer usuário”, afirmou Richard Turrin, consultor de fintechs baseado em Xangai, ao The Block.
Para os especialistas, a privacidade dos usuários, a mudança de hábito e a interoperabilidade com sistemas de pagamento já existentes, como o Alipay e o WeChat Pay, estão entre os desafios para consolidar a adoção do Yuan Digital.
“Responder a esses desafios é crucial para expandir os casos de uso, construir confiança e estimular uma ampla adoção do e-CNY no futuro”, explicou Youwei Yang, economista-chefe do Bit Mining, ao The Block.
Outros observadores afirmam que é prematuro decretar o fim do entusiasmo com a CBDC chinesa, já que diversos projetos de adoção estão em andamento. “Apesar das persistentes baixas taxas de adoção, o e-CNY é, de longe, o maior projeto-piloto de CBDC do mundo, em termos dos montantes envolvidos e do número de usuários’, afirmou Matteo Giovannini, gerente sênior do ICBC, maior banco comercial estatal da China em ativos.
Desde que os primeiros testes, no fim de 2019, o Banco Central chinês já expandiu o projeto-piloto da CBDC para, pelo menos, 26 localidades em 17 cidades e regiões, incluindo Pequim, Xangai, Shenzhen e Suzhou.
Yuan Digital quer ser adotado por instituições financeiras
Além disso, o Banco Central chinês está mudando seu enfoque em relação à moeda digital. Nos anos anteriores, a autoridade monetária se concentrou em estimular os consumidores a adotarem o e-CNY. Agora, o foco é incentivar a participação de instituições financeiras e transações B2B, isto é, entre empresas.
“Veremos o Banco Central agora comercializando o e-CNY de uma perspectiva business-to-business, bem como induzindo os bancos a, possivelmente, pagar salários via e-CNY, estimulando, deste modo, mais varejistas a aceitarem a moeda digital”, explicou Stanley Chao, diretor da consultoria ALL In Consulting, ao The Block.
Um exemplo foi divulgado no começo de julho, quando o DBS Bank passou a permitir que clientes corporativos possam receber pagamentos com Yuan Digital. O serviço é um dos primeiros oferecidos por um banco estrangeiro em terras chinesas.
A adesão de grandes bancos ocidentais, sediados em países com tradição democrática, seria um grande passo para a popularização da CBDC da China, mas esbarra em conflitos geopolíticos. O The Block lembra que, recentemente, o francês BNP Paribas foi questionado por um deputado republicado dos Estados Unidos sobre uma iniciativa semelhante à do DBS Bank.
“O problema é que, atualmente, é complicado para instituições financeiras ocidentais se engajarem em parceria com Pequim para promover o yuan, enquanto esforços de desdolarização crescem em vários países”, avalia Giovannini, do ICBC. Para ele, os bancos ocidentais precisa navegar por um “ambiente de mercado muito desafiador, em que a geopolítica prevalece sobre as considerações comerciais”.
Yuan Digital enfrenta a concorrência do Alipay
Enquanto essa frente é obstruída por disputas políticas, o governo chinês também busca contornar outro obstáculo: a onipresença do Alipay e do WeChat Pay, as duas maiores plataformas de pagamento para consumidores na China. Atualmente, essas ferramentas permitem que os chineses “driblem” o yuan digital, já que é possível pagar as contas com o dinheiro que os cidadãos têm em suas contas bancárias.
Algumas instituições financeiras estatais, como o Banco da China (o maior do país), estão testando ferramentas de pagamento offline atrelados a cartões SIM para uso do yuan digital. Já a cidade de Shenzen iniciou, no mês passado, um teste para pré-pagamentos usando o e-CNY, envolvendo mais de 200 empresas de setores como educação, treinamento e beleza.
“O e-CNY encara significativos ventos contrários dos canais de pagamento existentes incorporados a outros aplicativos, já que não há benefícios tangíveis para os usuários, em relação ao que esses canais já oferecem, e, portanto, não há motivos para converter o renminbi para o e-CNY”, explicou, ao The Block, Donald Day, diretor de operações da VDX, plataforma cripto sediada em Hong Kong.