Felipe Miranda: Você querrrr dançar comigo?
Por Felipe Miranda & Equipe
“Alguém passa por mim e pergunta: como vão tuas ideias fixas? E eu, que as tenho inarredáveis, respondo: vão bem, vão ótimas! Bem sei que há contra elas uma série de preconceitos, inclusive de ordem psiquiátrica. Mas quem não tem três ou quatro que, fidelíssimas, acompanham o homem até sua última lágrima de paixão e de vida.” – Nelson Rodrigues.
A pergunta-título desta newsletter não poderia jamais partir de mim, claro. Sou o pior dançarino do planeta Terra – se vida extraterrestre fosse comprovada e lá também houvesse dança, seria promovido ao pior entre todos, fossem eles terráqueos ou não. Caprichando no sotaque carioca e suando em bicas depois de ter mandado uns 10 gramas de cocaína pra dentro, Zé Pequeno convida Helena: “Você querrr dançar comigo?”. No Rio, a abordagem virou parte da cultura popular. Faz menos sentido em outros estados brasileiros. Não pegou, sabe?
Hoje é um dia de convites. Sei lá como vamos fazer, mas o fato é que acontecem vários eventos ao mesmo tempo. Gostaria de formalizar aqui a coisa, para que possamos nos encontrar ao vivo, mesmo que seja apenas em um deles. Está na hora de acabarmos com essa assimetria de comunicação e nos olharmos nos olhos, feito conversa de homem (no sentido de hombridade, não de gênero).
Amanhã, acontece o evento de aniversário de 9 anos da Empiricus, mediante convite – cheque em sua caixa postal se recebeu algo com o título “Misbehaving” (combina com a gente, entende?). Muita gente bacana aqui da Empiricus vai palestrar e teremos também apresentações do José Cordeiro e do Pedro Malan, além de um debate entre mim e o Richard Thaler (tenho vergonha desse paralelismo forçado e descabido, mas foi ele quem pediu esse formato).
Na segunda, participarei como palestrante do primeiro encontro ao vivo do Antagonista.
Ainda há os últimos ingressos disponíveis e será um prazer falar ao lado dos amigos Marcos Troyjo, Diogo Mainardi e Mário Sabino. Por fim, na terça, estarei com a Luciana Seabra na Livraria Cultura do shopping Iguatemi, às 19h, numa mesa debatendo o best-seller “Conversas com Gestores de Ações Brasileiros”, em versão remasterizada e cheia de novidades. O evento é aberto e ficaremos muito felizes se você puder aparecer por lá, para filar um suco e um bolo. Quem sabe o Rodolfo não libera o cartão e jantamos um arroz biro-biro com picanha fatiada, ao ponto, ali mesmo depois?
Como falar em três eventos em cinco dias? Muito simples: são as mesmas groselhas, repetidas sob ângulos diferentes. No fundo, eu tenho uma única ideia na vida, que, para falar a verdade, nem é minha. Tudo se resume à convexidade. Empiricus, empreendedorismo, decisões cotidianas, liberalismo, gestão de ativos. Ou, apresentado de outra forma, ao já famigerado X não é F(x) – conheci o Nassim Taleb vestindo uma camiseta ganha de um assinante com essa expressão, ao que ele respondeu: “You got the whole point. That’s it”.
É só isso, mas não vou antecipar aqui porque não sobraria nada para os eventos e eu gostaria mesmo de conhecê-lo(a) pessoalmente.
Posso dizer aqui no que isso se traduz em termos pragmáticos. Ao final do dia, é o que interessa. O mercado financeiro pertence aos praticantes. O resto é bobagem. O que você está comprando agora? O que você tem em seu portfólio?
Olha, eu tenho tudo. Just in case, sabe? Vai que… E pronto. Tenho dólar, ouro, criptomoeda, ação, fundo de ações, Tesouro Direto, multimercado, fundo imobiliário, imóvel físico, tela que comprei do meu talentosíssimo amigo Gabriel “Americano” Lima, fazenda – lá, crio porco, vaca, galinha (pouca galinha, porque morro de medo) e sou metido a encantador de cavalos, embora a realidade aponte mais para “contador de cavalos”.
Eu me apaixonei perdidamente pelo Robert Redford naquele filme (como não se apaixonar pelo Robert Redford?), e depois fui pesquisar tudo que podia sobre o Monty Roberts. A exemplo do “homem que ouve cavalos”, sempre achei que comunicação boa mesmo era aquela em que a gente não precisava falar. Não é incrível que até ele esteja aplicando a fórmula de lançamento digital do Jeff Walker? Bom, essa é outra história.
Da última vez que fui lá na roça, inventei de começar a amansar mula. Espora não pus, porque só acredito na doma amigável e carinhosa, apesar da insistência do meu primo. “Uai, Lipe, cê num vai calçá? Trem faz é cócega no animal, sô! Ela gosta do cutucãozim na barriga. Cê devia de calçá.”
Mula é diferente mesmo. Bicho teimoso, bruto e pulador, hein? Se vacilar, joga a gente no chão lá do alto. Ao mesmo tempo, apaixonante. Ventania era a mais mansa; levantava as orelhas enormes de maneira firme e inclinava o pescoço para trás assim que eu aparecia no curral. Depois, abaixava e levantava a cabeça enquanto lambia os beiços, como se me convidasse para pastar com ela. Saudade é sinal de que a gente viveu alguma coisa boa. Apesar de encantadora, Ventania dava um trabalho…
Até montar em touro já topei. Só risco de crédito que ainda não encaro, porque daí já é demais também. Tudo tem limite nesta vida – se bem que a Luciana está quase me convencendo a comprar o fundo de debêntures incentivadas da Kinea. Sabe como é, eu não tenho nada de risco de crédito na carteira, porque acho que o spread no Brasil não compensa o risco e entramos naquela história de apostar dólares para ganhar centavos. Mas como não tenho nada, pode fazer sentido colocar um bocadim pra dentro.
Essa é uma luta ferrenha minha. O quanto você tem de um ativo ou de uma classe de ativos deveria depender mais da posição desse ativo ou classe em seu portfólio do que propriamente da perspectiva individual para ele ou ela. Afinal, no fundo, ninguém tem uma perspectiva minimamente confiável para nada. Seria como montar na Ventania tentando adivinhar qual seria seu próximo pulo. Então, eu tenho ouro não porque ache necessariamente que esse negócio vai subir, mas por precaução, sabe? E se acontece um grande reset no mundo, por qualquer motivo, não importa. Um grande ataque cibernético, uma explosão do mercado de títulos de crédito em meio à redução da liquidez global, uma nova guerra mundial, sei lá. Qualquer coisa… Taleb diz que o mundo hoje está mais frágil do em que em 2007, então, just in case, vamos ter aqui um bocado de seguros clássicos.
O que precisa ser entendido é que a posição num determinado ativo é côncava dentro de seu portfólio. O benefício marginal de se ter mais Bolsa, se você já tem muita Bolsa, é baixo. Você já tem muito daquilo, pode inclusive estar além de seu ponto de saturação. Toda a ideia de portfólios de mínimo risco assenta-se sobre essa noção. Já se você tem pouca Bolsa, o benefício marginal de ter mais é grande.
Hoje em dia, fujo (sem nenhum exagero) de discussões sobre política e sobre tentativas, principalmente em festas de criança, de extraírem-me a “dica quente para investir”. Começo a comer feito louco, para a pessoa entender a impossibilidade de conversa – aponto para o hot dog tentando mostrar o “communication breakdown” daquele momento. Se não há chance de entupir-me de salgadinhos e outras guloseimas, apelo para a bebida – “wine is fine, but whisky is faster”, já nos ensinava o sábio Ozzy Osbourne. Tenho a esperança de que ninguém vai querer conselhos financeiros de um bêbado.
Quando se esgotam todas as possibilidades supracitadas e a pessoa insiste, eu danço conforme a música, respondendo do fundo do coração: compre tudo o que puder. Depois que fizer isso, a gente volta a conversar.