Veja o que deve ser pauta no primeiro encontro entre Joe Biden e Jair Bolsonaro
O presidente da República Jair Bolsonaro (PL) deve encontrar o presidente dos EUA Joe Biden na quinta-feira (8), em primeira reunião bilateral realizada entre os líderes desde a posse do chefe do executivo americano.
O encontro ocorre durante a Cúpula das Américas, convenção que reúne governantes do continente em Los Angeles (EUA) e que, desde antes de seu início, já contava com turbulências. No início da semana, a decisão americana de não convidar a Venezuela, a Nicarágua e Cuba ao evento causou um mal-estar diplomático.
Como resultado, o México informou na segunda (6) que seu presidente, Andrés Manuel López Obrador, não iria à reuniões, mesmo após Biden ter despachado um representante diplomático para convencer a delegação mexicana do contrário.
Buscando salvar a Cúpula de uma frustração diplomática, a expectativa é que Biden corra atrás do prejuízo se relacionando com economias de peso no continente, como o Brasil.
Entretanto, o encontro entre o chefe do executivo brasileiro e o americano não está necessariamente previsto para ser amistoso.
Atenções estão no doméstico
Para Kai Enno Lehmann, professor de relações internacionais da USP, as expectativas para o encontro entre os dois presidentes e para a Cúpula como um todo são baixas, já que os líderes dos países participantes estão atualmente mais atentos a problemas internos de seus países.
“Bolsonaro está preocupado com as eleições e tem muito mais interesse nos preços do combustível do que qualquer outra coisa sobre a América. O presidente Joe Biden enfrentará eleições complicadas daqui 5 meses e tem que lutar por sua presidência, pois se perder as casas legislativas, seu mandato acaba”, diz.
O professor é descrente sobre a relevância dos encontros para a população, que enfrentam variados problemas econômicos em seu cotidiano.
“Política externa para os presidentes é muito boa quando as coisa em casa estão funcionando bem. Aí, eles gostam de mostrar para o mundo. Mas a maior parte da população das américas não se importa muito com isso, se importa com coisas concretas que impactam o seu sustento e o sustento de suas famílias”, afirma.
Lehmann também entende que o impasse diplomático envolvendo o México, uma das maiores economias do continente, diminui o potencial de deliberações importantes.
“Esse impasse tirou da Cúpula um dos países mais importantes da região”, diz.
“Mais complicadores do que simplificadores”
O cientista político e professor da USP Leonardo Trevisan acredita que Biden, no encontro com Bolsonaro, correrá atrás do atraso após ter sofrido o boicote mexicano.
“Quem mais precisa do encontro é o Biden, e não o Bolsonaro. Essa inversão que não é comum, mas, de fato, mostra que a diplomacia americana foi, de alguma forma, ambiciosa demais quanto às suas possibilidades com a América Latina na Cúpula”, diz
Para Trevisan, a ausência de uma das economias mais importantes do continente tornou a presença brasileira proporcionalmente mais relevante do que o usual, já que os EUA teriam perdido um de seus principais parceiros para o sucesso da cúpula.
“E é compreensível a postura de Biden, pois está em pleno processo eleitoral e tem a Flórida como um de seus estados mais importantes. Lá está uma grande comunidade de cubanos e de latinos. Bolsonaro, como qualquer parceiro, aproveitou a situação e cobrou este encontro bilateral que, importante dizer, não estava proposto antes.”, diz.
Amazônia e jornalista desaparecido podem ser cobrados
Ao final das edições da Cúpula, um comunicado oficial é tradicionalmente emitido contendo as principais deliberações e conclusões às quais chegaram os líderes durante as reuniões.
Para Trevisan, da USP, é possível que a abordagem de temas sensíveis à delegação brasileira, como o ambiental, deixe o Brasil de fora do comunicado e pressionem Bolsonaro no encontro com Biden.
“A diplomacia brasileira se retirou do trabalho de edição do comunicado final da cúpula, pois sabem que haverá uma atenção muito grande para a questão ambiental. Poderemos não ter a assinatura do Brasil neste comunicado e Biden muito provavelmente cobrará posicionamento sobre a Amazônia. O Brasil manterá a maior distância possível dessa questão”, afirma.
Além disso, o professor chama atenção ao recente desaparecimento do indigenista brasileiro Bruno Araújo Pereira e do jornalista britânico Dom Phillips na região do Vale do Javarí, na Amazônia, como um potencial assunto a ser cobrado por parte da delegação americana.
Os desparecidos foram vistos pela última vez no domingo (5), ao iniciarem uma travessia entre duas comunidades amazônicas, e não chegaram a seu destino.
Pereira, da Fundação Nacional do Índio (Funai), já havia sofrido ameaças por parte de madeireiros, garimpeiros e pescadores, devido a sua atuação, e o desaparecimento da dupla despertou choque e indignação da comunidade internacional.
A Marinha atualmente articula uma operação de buscas na região.
“É um complicador absolutamente inesperado para a questão da Amazônia. Temos um líder ativista e um jornalista do The Guardian provavelmente vítima dos mesmos problemas envolvendo garimpeiros, indígenas, tudo o que já era denunciado e já havia pressão em cima. Este aperto de mãos pode se tornar um puxão de orelha”, conclui.
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