‘Trump pode tornar agronegócio dos EUA menos competitivo e saída do Acordo de Paris pouco representa na prática’
O mundo acompanha de perto a volta de Donald Trump ao mais alto posto do governo dos Estados Unidos, e o que o seu retorno pode representar para a economia do mundo, além de setores como o agronegócio.
Na semana que marcou a posse do presidente, Trump disse que aumentará a produção de combustíveis fósseis, assim como a saída do país do Acordo de Paris e Organização Mundial da Saúde (OMS).
Para Leonardo Munhoz, advogado e pesquisador do Observatório de Bioeconomia da Fundação Getulio Vargas (FGV), a retirada dos EUA do Acordo de Paris, ainda que seja uma atitude política e ideologicamente forte, na prática, não significa muito. Por outro lado, o pesquisador reforça que a saída do país pode incentivar outros países a fazerem o mesmo.
“Os EUA, um grande emissor de gases de efeitos estufa, nunca endereçou a agenda climática de forma proativa, até mesmo em termos de financiamento. Não só com o Acordo de Paris criado em 2015, mas desde o início da Convenção Quadro Clima das Nações Unida (UNFCCC) em 1994, os EUA nunca conseguiram grande alteração na sua matriz energética baseada em combustíveis fósseis e reduções de emissões. Entre 1990 – 2022, houve apenas uma redução de 2% das emissões de CO₂ do país”, explica.
A título de comparação, o governo Biden fez um aporte de R$ 290 milhões para o Fundo Amazônia. Por outro lado, somente a Noruega já aportou R$ 3 bilhões, seguida pela Alemanha (R$ 388 milhões) e o Reino Unido (R$ 284 bilhões). Ou seja, para o tamanho da economia americana (aproximadamente US$ 27 trilhões em 2024), os seus aportes financeiros ao Fundo Amazônia foram pouco relevantes.
Trump deve enfraquecer pagamento por boas práticas ambientais
Outra ação esperada do governo Trump, pode ser menores incentivos dos programas de preservação ambiental dentro do Farm Bill, principal política agrícola dos EUA. Em 1985, a seção ambiental do Farm Bill, conhecida como Conservation Title, foi incorporada, introduzindo três principais programas voltados à preservação de recursos naturais em áreas rurais: Working Lands Conservation Programs; Land Retirement Programs e Easements Programs.
Esses três programas têm como estrutura central o pagamento financeiro público por boas práticas agrícolas e preservação de parcelas de matas ciliares no imóvel rural. Trump deve reduzir a verba federal destinada a esses programas.
“O enfraquecimento dos Conservation Programs pode levar a menor sustentabilidade dos produtos agropecuários dos EUA, já que o produtor americano não terá incentivos para preservar matas e adotar boas práticas. Tal fato em um contexto de maiores restrições ambientais, exigindo melhores práticas e menor desmatamento pode prejudicar o acesso de produtos americanos a outros mercados como o europeu. Deve-se destacar que a partir de 2026 a Lei anti-desmatamento (EUDR) entrará em vigor, demandando rastreabilidade de produtos agropecuários, comprovando origem de área não desmatada para todos os países que exportem para território europeu”, explica Munhoz.
Portanto, a menor exigência sustentável na produção americana, em especial no agro, pode levar a perda de competitividade desses produtos nos mercados estrangeiros. Também, fica incerto a disponibilidade do governo americano em investir em sistemas de rastreabilidade de produtos e seu cruzamento com dados ambientais dos imóveis rurais.
Nesse ponto, o Brasil pode ter vantagens comerciais com relação aos produtos agropecuários dos EUA, uma vez que tem o Código Florestal, em especial o Cadastro Ambiental Rural (CAR), com a adoção de boas práticas na produção rural por parte dos produtores brasileiros.