Tranquilidade agrícola escapa das mãos de novo presidente da Argentina
Alberto Fernández assume a presidência da Argentina na terça-feira com a esperança de impulsionar as exportações para estimular o crescimento e pagar dívidas. Porém, assim que for dada a largada para seu mandato de quatro anos, Fernández terá que enfrentar um grande obstáculo no agronegócio, que responde por mais de 30% dos embarques.
A seca devastou plantações de trigo e cevada no cinturão dos Pampas, que gera receitas importantes de exportação no período da nova temporada. O trigo é vendido principalmente para moinhos no Brasil.
A cevada é exportada para a Arábia Saudita para ração de camelos. E a maior parte do que resta para colher em campos ressecados já foi negociada por agricultores experientes, o que significa que o plano de Fernández de ficar com uma fatia do bolo aumentando os impostos de exportação será, em grande, parte inútil.
No caso de Claudio Sánchez, agricultor de Frapal, na província de Buenos Aires, suas plantações de trigo, espalhadas por 4 mil hectares, devem render 40% menos que no ano passado.
Ele já vendeu cerca de 70% dos grãos ainda sem colher para exportadores em contratos futuros. Isso significa que Sánchez paga o imposto atual de exportação de quase 7%, em vez da taxa mais alta esperada sob o comando de Fernández.
A seca reverteu os prognósticos de uma colheita recorde de trigo. Na Bolsa de Cereais de Buenos Aires, a estimativa diminuiu 12% desde o início da temporada, para 18,5 milhões de toneladas.
Ainda é uma boa colheita, colocando a Argentina à frente da Austrália, sua rival do hemisfério sul. No entanto, uma safra maior seria melhor para Fernández, que precisa de toda a ajuda possível para tirar o país da recessão e honrar os pagamentos de títulos.
“Para mim, a coisa mais importante para a Argentina no período que virá é trazer dólares”, disse Fernández ao anunciar o ministro da Agricultura em 6 de dezembro. “Temos que desenvolver o setor agrícola o máximo que pudermos.”
As exportações de trigo e cevada devem trazer receita de apenas US$ 2,9 bilhões nesta temporada, segundo Agustin Tejeda, economista-chefe da Bolsa de Buenos Aires. Na temporada passada, a receita encostou em US$ 4 bilhões.
O clima seco também está ameaçando as culturas mais rentáveis da Argentina – soja e milho, que estão sendo semeados nos Pampas. Chuvas recentes restauraram a umidade do solo, permitindo a semeadura. Mas as preocupações para os próximos meses, quando as plantas crescerem, permanecem.
Sánchez, que plantou milho, diz que Frapal enfrenta um dos cinco anos mais secos desde que os dados começaram a ser monitorados em 1967. “Ainda é muito, muito cedo, mas teremos que ficar de olho na previsão de chuvas na Argentina”, disse Jacob Christy, trader da Andersons, em vídeo publicado on-line.
Não é apenas o trigo que está sendo negociado agora para evitar um provável aumento nos impostos de exportação. Sánchez se uniu a uma multidão de agricultores que venderam milho recém-plantado em contratos futuros e que precificaram estoques de grãos da última temporada.
Como resultado, 14,7 milhões de toneladas de milho que ainda não foram colhidas já estão listadas no registro de exportações da Argentina, mais do que o triplo no mesmo estágio no ano passado. Cerca de 75% da colheita passada também está listada, em comparação com apenas 58% um ano atrás.
Olhando para o futuro, agricultores alertam que, se Fernández se empenhar demais nos impostos sobre exportações para aumentar as receitas fiscais, seu plano de elevar as exportações virá por água abaixo.
“Não mate a galinha dos ovos de ouro”, disse Ignacio Philipp, agricultor de Bahía Blanca, província de Buenos Aires. “É preciso alimentá-la.”