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Tramitação da MP das offshores: ‘Xepa’ dos fiagros não resolve problema

07 nov 2023, 12:50 - atualizado em 07 nov 2023, 12:50
fiagros agronegócio
Na visão de especialista, a limitação de cotistas mínimos dos fiagros afeta a cadeia do agronegócio brasileiro como um todo(Imagem: Divulgação)

Na semana passada, a Câmara dos Deputados aprovou em Plenário o Projeto de Lei – PL 4173/2023, ratificando a taxação adicional para os rendimentos dos cotistas dos Fiagros (Fundos de Investimento nas Cadeias Agroindustriais).

O texto do PL aprovado na Câmara já seguiu para apreciação pelo Senado Federal ainda no dia 30 de outubro e pode comprometer, como já alertamos, parte substancial do financiamento privado ao agronegócio brasileiro.

Mesmo já tendo falado dessa tema, é imperioso voltarmos a debater o assunto. 

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Governo Federal não ata e nem desata o nó do novo arcabouço fiscal 

Como o ajuste fiscal do Governo Federal vem sendo bombardeado, até pelo Presidente da República, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, parece estar sozinho tentando defender o cumprimento do novo arcabouço fiscal proposto pelo próprio governo federal para atingir a meta fiscal do ano. Nesse cenário desalentador, mais uma vez a sanha arrecadatória do governo federal mira o agronegócio brasileiro.

A situação piorou quando a Câmara dos Deputados costurou com o governo um “acordão” para que fosse aprovada a medida provisória da taxação dos fundos numa tentativa duvidosa de se fazer uma conta de chegada, como uma “liquidação de queima de estoques” dessas de verão, modificando a quantidade de cotistas para os rendimentos dos fiagros gozarem de isenção fiscal do Imposto de Renda (IR) sobre “dividendos” pagos pelo fundo aos cotistas.

Tudo isso se deu através da redução da exigência legal de uma quantidade de quinhentos para cem quotistas ativos no fiagros, para se justificar um suposto entendimento da importância do veículo introduzido pela Lei n. 14.130/21 para o financiamento do agronegócio brasileiro, mantendo-se a isenção do IR sobre os rendimentos (dividendos) periódicos para os fiagros com, no mínimo, cem quotistas.

Ocorre que derrogar a isenção do IR dos ganhos dos investidores – que, na prática, em relação à valorização das cotas, ficaria apenas diferida no tempo, ou seja, seria cobrado dos investidores nos saques dos fundos -, para fundos com menos de cem quotistas, não modificará a necessidade de o Tesouro Nacional e do agro brasileiro de contarem com os recursos disponíveis para investimento no mercado de capitais para cumprir o Plano Safra 2023/2024.

Ajuste fiscal ou Plano Safra?

Como já dissemos aqui nesse espaço, os fiagros já representam mais de R$ 10 bilhões em investimentos da população em geral no agronegócio brasileiro o que, a rigor, traz para o financiamento do setor recursos antes investidos em condomínios edilícios, fundos de shopping centers e outras atividades através de fundos imobiliários e outros veículos, para fechar a conta da oferta de financiamento privado do agronegócio.

É que para conseguir cumprir um Plano Safra arrojado, que aponta a necessidade de cerca de R$ 435 bilhões para financiar um setor que estima-se que produzirá cerca de R$ 2,65 trilhões de reais de renda no ano de 2023, segundo as projeções do Cepea/Esalq, abrindo mão de recursos privados ao se engendrar uma taxação antecipada dos cotistas, afugenta não só os recursos até então investidos, mas inibe a captação de novos recursos de investidores privados a serem carreados ao financiamento do setor por conta da insegurança dos investidores em relação à manutenção das regras do jogo, já que muitos desses investidores estão ainda aprendendo a investir em fiagros, que são de meados de 2021.

Isso tudo pode representar um retrocesso no financiamento do agro, além de ser um duro golpe no Tesouro Nacional já que, na falta de recursos privados para financiamento do agronegócio, o governo terá de aportar recursos públicos já escassos e de custo financeiro altíssimo ao ter de “desviar” para o financiamento da produção agropecuária recursos que poderiam ser investidos em saúde, educação e outros setores, ao invés de lançar mão de mais e mais recursos privados para o cumprimento desse plano safra.

Somente essa questão pode resultar num “tiro pela culatra” e redundar em significativo déficit de recursos públicos orçamentários ao invés do equilíbrio almejado, já que o veículo tem representado o maior crescimento entre as estruturas financeiras de investimento privado no agronegócio brasileiro em termos percentuais e pode com folga vir a desafogar muito o caixa do governo gerando impacto positivo de alocação de recursos e de tributação na cadeia como um todo.

A “Xepa dos fiagros” não resolve

A “cereja do bolo” dessa confusão toda entre público e privado que se desenvolve na retórica peculiar do populismo econômico, típica dos momentos de “pires na mão” que precedem os anos eleitorais, é a “xepa” na discussão do assunto na Câmara dos Deputados.

Isso, porque a Medida Provisória trouxe o limite de 500 cotistas para a isenção e o relator na Câmara, o deputado Pedro Paulo, em entrevista aos órgãos de imprensa disse que o número de 200 cotistas poderia justificar uma suposta isenção ou favor fiscal existente – bem ao gosto do jogo de “acomodação” do dinheiro alheio.

Porém, no final das contas, o projeto foi aprovado com a indicação na suposta norma isentiva do total de cem quotistas para fazer valer a tal da isenção do IR nos rendimentos periódicos dos fundos que, na prática, já estava posta na lei desde abril de 2021.

Parece até conversa de elevador de tão aleatória e cheia de “achismos”, não?

“Será que vai chover hoje? Eu acho que para fazer o ajuste fiscal do governo, precisamos de no mínimo de 100 cotistas, senão, é benefício fiscal e eu vou taxar! E vocês, o que acham? 200 seriam suficientes? Quem dá mais?”

Nada mais desprovido de fundamento. Cem, duzentos, quinhentos ou mil cotistas. Não é a matemática do achismo que está em jogo, e sim, o alimento de qualidade na mesa do brasileiro e o fechamento dos saldos positivos da nossa balança comercial.

É a energia limpa, as fibras sustentáveis, o meio ambiente saudável e a sustentabilidade nos negócios e na vida de mais de 1 bilhão de pessoas ao redor do mundo que está em jogo, bilhão de pessoas que são impactadas diretamente pelo sucesso e pela abundância produzida pelo agronegócio brasileiro todos os anos, sem contar os benefícios difusos ao meio-ambiente global.

Nesse contexto, abrir mão da segurança jurídica, que traz previsibilidade para o mercado conseguir ter um horizonte de investimento a longo prazo – muitas culturas e criações demoram anos para ficarem prontas para serem vendidas no mercado nacional e internacional -, para fazer vicejar um ambiente de negócios saudável e sustentável para o financiamento do setor que impulsiona a economia brasileira e gera equilíbrio monetário e fiscal necessário para a manutenção das políticas do Estado brasileiro funcionarem é muito mais importante e relevante do que se pensar na próxima eleição.

Aliás, o mínimo que a sociedade brasileira espera e que os agentes de mercado almejam é que este debate seja deslocado de um ambiente de conveniências de ordem do dia para um debate com um mínimo de racionalidade, onde a lógica jurídica, econômica e fiscal sejam os vetores da definição das regras e dos marcos regulatórios que fazem funcionar as estruturas de negócios no setor.

A Câmara dos Deputados perdeu a oportunidade de fazê-lo. Essa agora é a tarefa do Senado Federal para voltarmos aos debates dentro da devida racionalidade e do trato de Estado da questão em detrimento das conveniências de momento e do caixa do governo federal que tem mais a ganhar do que a perder com o incentivo ao financiamento privado do agronegócio brasileiro sob todas as óticas e pontos de vista sobre os quais se assentam a questão.

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