Toda crise tem prazo de validade e apostar na recuperação é a melhor estratégia; entenda
Por Fabrício Gonçalvez*
A história mostra que as crises são passageiras, apesar de todos os desafios durante o período em vigência. Isso porque a economia é cíclica e, ao longo do tempo, haverá inúmeros momentos de expansão e contração.
Investir em períodos de declínio do mercado acionário é uma tarefa desafiadora para os indivíduos. Afinal, o ser humano é avesso às perdas e, principalmente, em sentir o impacto na renda como consequência da crise.
Ainda assim, os mercados têm se mostrado resilientes e capazes de recuperar-se após períodos de turbulência. De volta à história, em 6 de maio de 1932, quando o índice Dow Jones acumulava forte desvalorização de 85% em relação ao topo de 1929, Dean Witter escreveu a seguinte mensagem aos seus clientes:
“Existem apenas duas promessas sustentáveis quanto ao futuro: ou teremos o caos ou teremos uma recuperação. A primeira teoria é insensata. Se houver caos, nada manterá seu valor; nem os títulos, nem as ações, nem os depósitos bancários, nem o ouro terão valia. Os imóveis serão um ativo sem valor porque os direitos de propriedade serão inseguros. Nenhum plano de ação pode se fundamentar nessa eventualidade impossível. Por esse motivo, esse plano deve ser previsto com base na teoria de recuperação. O presente não é a primeira depressão; pode ser a pior. Entretanto, com a mesma certeza de que as condições se endireitaram no passado e gradualmente voltaram ao normal, isso ocorrerá novamente. A única incerteza é quando isso ocorrerá. Gostaria de dizer enfaticamente que em alguns anos os preços atuais parecerão tão absurdamente baixos quanto os valores de 29 pareceram fantasticamente altos”.
O empresário e investidor foi assertivo ao acreditar na recuperação. Porém, dois meses depois ocorreu o fundo do mercado de ações. A maioria das empresas blue chips sofreram quedas de 95% ou mais quando o mercado atingiu o ponto mais baixo, em julho de 1932. O DJIA registrou uma perda impressionante de 89,2% do pico até o fundo. Como consequência, o colapso de 1929 foi seguido pela pior depressão da história dos Estados Unidos.
Jeremy Siegel relata em “investindo em ações no longo prazo” que os Estados Unidos passaram por 47 recessões entre 1802 e 2012, as quais tiveram tempo médio de duração de 19 meses. Ele aponta que desde a Segunda Guerra Mundial a duração média caiu para 11,1 meses, nas 11 recessões do período. Além disso, em praticamente todas o mercado acionário entrou em queda antes das recessões e a ascensão antecedeu as recuperações econômicas.
Moral da história
Há uma avaliação sensata e bons ensinamentos no trecho do Witter, ainda mais tendo sido exposto em um cenário de medo extremo por parte dos investidores. Mas o ponto principal é que o planejamento de longo prazo deve ser pautado vislumbrando a recuperação.
Ou seja, investir pressupõe acreditar que o futuro será melhor que o presente. O mercado reflete a evolução da sociedade, que tende a progredir, embora eventos caóticos e inesperados surjam durante o caminho.
É verdade que as grandes desvalorizações são parte da dinâmica do mercado, pois as emoções dos investidores muitas vezes ditam as regras, pelo menos no curto prazo. Por trás das negociações, existem pessoas cujos sentimentos exercem forte influência na tomada de decisão.
Assim como a economia, os mercados também são cíclicos. Todo sistema complexo se desenvolve em consonância com a volatilidade, a aleatoriedade e os agentes estressores.
Nassim Taleb descreve que “os sistemas complexos se enfraquecem e até mesmo morrem quando são privados de agentes estressores”. Por isso, é necessário que o investidor tenha em mente algumas questões fundamentais.
As lições
Em primeiro lugar, possuir colchão de liquidez, pois as adversidades da vida acontecem. A reserva de emergência deve ser adaptada à situação de cada indivíduo, mas precisa abarcar alguns meses ou anos de custeio de gastos pessoais, ou familiares. A reserva tem de estar em ativos de alta liquidez e segurança. É importante ter a reserva de emergência antes de iniciar os investimentos
Outro ponto: a exposição à renda variável deve ser considerada em objetivos de longo prazo. Portanto, acima de 10 anos. Caso contrário, o propósito pode ser comprometido pelas flutuações de preço.
Vale lembrar que o risco envolvido decresce de acordo com o tempo em que o investimento pode ser mantido. Portanto, a escolha das ações deve ser criteriosa. O recomendado é investir de forma ampla e global. Assim, os riscos específicos, setoriais e geográficos são diluídos.
Comprar ações nas quedas aumenta a expectativa de retorno, visto que as empresas são negociadas por múltiplos menores. O passado demonstra que os investidores que entraram em momentos de grandes declínios colheram os benefícios da volatilidade do mercado. As desvalorizações são saudáveis para corrigir os preços das ações e os seus excessos.
Por isso, o portfólio precisa ser condizente com o perfil do investidor, com exposição bem distribuída entre a renda fixa e a variável. A avaliação correta da capacidade de suportar risco, que depende principalmente da idade e da capacidade de geração de renda, garantirá maior controle emocional em momentos conturbados. Além disso, a redução da volatilidade total da carteira é possível por meio de instrumentos adequados de renda fixa.
Por fim, após as crises mais recentes de maior escala, como a pandemia de 2020, a crise financeira de 2008 e a recessão econômica de 2001, os mercados se recuperaram e cravaram novas máximas. O futuro sempre será incerto.
Por isso, é preciso se manter por tempo suficientemente longo para colher os frutos dos juros compostos. Investir exige disciplina para conseguir lidar com as oscilações de preços durante o processo.