Títulos externos brasileiros parecem caros após ataques
Analistas de Wall Street intensificaram as recomendações de venda de títulos de dívida externa brasileiros após as cenas caóticas de manifestantes saqueando os principais prédios do governo em Brasília.
A violência de 8 de janeiro por partidários do ex-presidente Jair Bolsonaro foi a gota d’água para os investidores, já convencidos de que os títulos ficaram caros demais após um desempenho acima dos pares no ano passado. Preocupações de que as finanças do governo sofrerão sob o presidente Luiz Inácio Lula da Silva só aumentam as dúvidas de casas como Morgan Stanley e JPMorgan.
Os bônus e outros ativos brasileiros tiveram um desempenho ligeiramente inferior ao de pares desde a turbulência, mas os pessimistas argumentam que há espaço para mais perdas.
Os títulos de dívida, em particular, parecem vulneráveis depois que o Brasil se tornou um dos destinos favoritos de investidores que procuravam refúgio da guerra na Ucrânia e o efeito corrosivo da inflação global desenfreada ao longo do último ano.
Embora a dívida do país tenha sido atingida pela alta mundial de yields no ano passado, o prêmio médio de juros sobre os títulos do Tesouro americano encolheu mais de 50 pontos-base, ante um aumento de quase 90 pontos para os mercados emergentes.
“O Brasil tem fundamentos fiscais fracos e em deterioração. Então, para mim, parece que pode e deve haver algum alargamento adicional do spread”, disse Sarah Glendon, analista sênior da Columbia Threadneedle Investments em Nova York. “É um mistério por que os títulos não foram mais impactados.”
O Morgan Stanley esta semana recomendou aos clientes venderem títulos soberanos do Brasil com vencimento em 2031 e apostar nas notas da África do Sul com vencimento em 2032.
O banco citou a piora das perspectivas fiscais do país e valuations altos entre os motivos. Os analistas do banco também citaram preocupações com o lado da oferta, alertando que uma nova emissão de 10 anos poderia pressionar os preços das notas em circulação.
Antes dos tumultos, apostar em títulos externos do Brasil estava em voga entre investidores em mercados emergentes, segundo pesquisa do Citigroup divulgada na semana passada. Cerca de 44% dos entrevistados estavam sobre-expostos (overweight) à dívida do país no início do ano novo, o maior percentual depois do México, favorecido por 60% dos investidores sondados. Embora ainda alta, o indicador da popularidade do Brasil no mercado caiu 11 pontos percentuais em relação ao trimestre anterior, sinalizando algum ceticismo.
Os ativos do Brasil já estavam sob pressão em 2023. Fundos locais abandonaram ativos domésticos em meio a sinais de que o novo governo pode reverter as medidas favoráveis ao mercado adotadas nos últimos anos e prejudicar as contas fiscais com gastos excessivos.
Os estrangeiros aumentaram suas apostas contra o real em US$ 3 bilhões na primeira semana de 2023, tornando-o uma das moedas com pior desempenho nos mercados emergentes. As ações também estão ficando para trás dos pares.
O bônus externo brasileiro com vencimento em 2037, que está entre os mais líquidos, foi negociado a 106 centavos de dólar na quarta-feira, com yield de 6,4%, acima da mínima de 98 centavos atingida durante a eleição presidencial de outubro.
O JPMorgan também está underweight em dívida externa brasileira, e diz que as notas oferecem potencial de valorização limitado.
Marcelo Assalin, chefe de dívida de mercados emergentes da William Blair Investment Management, disse que a moeda brasileira parece subvalorizada, tornando os mercados locais uma aposta melhor do que a dívida externa.
Ele espera “alguma” derrapagem fiscal depois que Lula propôs aumentar o teto de gastos do país em um valor maior do que o esperado, embora o dano possa ser limitado por um ambiente político altamente polarizado e desafios econômicos de curto prazo.
“Não sabemos o que vai vir do Lula. Isso está prejudicando a confiança do investidor ou causando um pouco de paralisia, de forma que muitas pessoas não estão fazendo grandes apostas no Brasil agora”, disse Ayman Ahmed, gerente de recursos da Thornburg Investment Management. “Eles ganharam muito dinheiro no ano passado.”