Tchau, commodities: Mercado volta a olhar para ações domésticas; o que gestores estão comprando?
A reversão de tendência na Bolsa vai tomando forma conforme investidores adaptam suas carteiras para as novas perspectivas do mercado, que voltou a abraçar o cenário de proximidade de queda da Selic, a taxa básica de juros do Brasil.
Maio deu um gostinho do que deve ser a dinâmica da Bolsa nos próximos meses: enquanto as ações expostas a commodities (principalmente metálicas) apresentaram desempenho mais fraco, papéis voltados à economia local foram os verdadeiros campeões do mês.
Dentro do Ibovespa, a Yduqs (YDUQ3) superou com folga outras ações e se consolidou como a maior alta do índice em maio, após saltar mais de 70%. Já a Vale (VALE3) integrou o top 5 maiores quedas do mês ao acumular perdas de quase 12%.
Na expectativa de que os juros comecem a cair em breve, ativos cíclicos locais vão entrando no radar do mercado. Gestores e analistas já estão preparando seus portfólios para receber a mudança de humor que permeia o mercado de ações.
É o caso da Tenax Capital, que tem procurado elevar exposição a segmentos de cíclicos domésticos – varejo, por exemplo -, cujos valuations estavam bastante amassados.
O gestor de renda variável Rodrigo Mello acha que, em algum momento, o mercado vai começar a deixar as revisões de curto prazo de lado e adotar um perfil de visão mais alongada.
“Acredito que o mercado vai parar de olhar os resultados de curto prazo e acreditar que o cenário pode começar a melhorar à frente”, diz.
Isabel Lemos, gestora de renda variável da Fator Administração de Recursos, explica que, à medida que o mercado precifica a queda de juros, o sentimento de aversão a risco a setores locais vai sendo reduzido. Hoje, o potencial de queda dessas ações parece menor, comenta.
O que gestores estão comprando
Um movimento que vem ganhando força na Bolsa é a preferência por ações de empresas de menor capitalização. A Tenax chegou a comprar muitas small caps, conta Mello.
Mello lembra que o Índice de Small Caps (SMLL) tem mostrado uma performance significativamente abaixo do Ibovespa. Em maio, o cenário mudou, tendo o SMLL disparado mais de 10%, ante a valorização de aproximadamente 4% do índice de referência da Bolsa brasileira.
Lemos, da Fator, defende uma exposição voltada a grupo de ações selecionadas, direcionado a empresas de qualidade, que saíram das últimas crises (pandemia do coronavírus, ciclo de alta de juros, crise de crédito) mais fortalecidas.
A gestora reconhece que os ativos cíclicos locais estão atrativos. Dentro do fundo Fator Ações, há posição em consumo (Grupo Soma [SOMA3] e Lojas Renner [LREN3]) e do setor imobiliário (Direcional [DIRR3] e Eztec [EZTC3]), por exemplo. Lemos entende que essas empresas são as que tem mais a se beneficiar com a melhora dos resultados e a perspectiva de juros em queda.
Também do time dos otimistas quando o assunto é small cap, a Fator vê Randon (RAPT4) como outro papel que está com um valuation atrativo.
Já a Nero Capital optou por um posicionamento mais conservador do ponto de vista de ações, colocando a tese de afrouxamento monetário nos juros, e não na Bolsa.
“Recentemente, optamos por alocar mais recursos na estratégia de pré-fixados, porque a gente entende que o movimento macro vai favorecer mais essa classe de ativos do que a Bolsa”, explica Bruno Di Giacomo, CIO da gestora.
Segundo ele, há um fechamento da curva de juros vindo tanto dos desdobramentos do arcabouço fiscal quanto da redução na expectativa de inflação longa, vinda de um cenário mais benigno nos próximos meses.
“Então, você tem um duplo efeito de variáveis vindo nos pré-fixados, enquanto a Bolsa provavelmente terá um delay maior para que os efeitos se materializem nos resultados das empresas”, completa.
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Exposição a commodities
O CIO da Nero não classifica a queda de exposição a commodities como um reflexo do ceticismo do mercado. Para Giacomo, trata-se de uma escolha de estratégia de setores.
“Acho que as grandes campeãs não deixaram de ser cavalos amplamente considerados pelo mercado, mas a proporção de alocação nelas será menor”, avalia.
A Tenax não tem uma visão construtiva para os preços do petróleo. A gestora não tem posição em Petrobras (PETR4), embora isso esteja ligado mais a questões internas, como incertezas envolvendo a nova política de preços da estatal, seu capex (investimentos) e o futuro da política de dividendos.
Em relação à reabertura da China, que chegou a beneficiar em cheio as ações ligadas ao minério de ferro no início do ano, a gestora prefere aproveitar a tese por meio do ETF MSCI China Consumer Discretionary (CHIQ) do que pela Vale – também com posição zerada.
Apesar disso, a Tenax segue de olho em algumas empresas expostas a commodities. Em proteínas, a corretora tem alocação em Minerva (BEEF3); em papel e celulose, Suzano (SUZB3); em óleo e gás, Prio (PRIO3); e, em mineração e siderurgia, começou a estudar Usiminas (USIM5).
“É um papel que tem uma assimetria muito grande”, comenta Mello, sobre a última empresa. Na avaliação do gestor, a Usiminas é uma das que mais se beneficiam de “qualquer melhora” do setor automotivo. É também um ativo que ficou muito para trás nos últimos dois, três anos.
Enquanto isso, Lemos, da Fator, conta que a gestora tem praticamente zero exposição a ações ligadas a petróleo e minério de ferro.