Taurus: “Bolsonaro lembrou brasileiros do direito à legítima defesa”, diz CEO sobre acesso a armas
A Taurus (TASA4) passou por um intenso processo de reestruturação nos últimos seis anos, quando foi comprada pela Companhia Brasileira de Cartuchos. Agora, a empresa gaúcha, fundada em 1939, começa a colher os frutos das mudanças promovidas pela nova gestão, que assumiu o comando em 2018.
Desde então, a Taurus investiu em tecnologia, com o Centro Integrado de Tecnologia e Engenharia Brasil/EUA (CITE), e continuou o seu processo de internacionalização, vencendo importantes licitações públicas, como nas Filipinas. Recentemente, a fabricante informou que estuda abrir uma subsidiária na Arábia Saudita.
Aqui no Brasil, o mercado de armas segue aquecido: as vendas saltaram 27% no terceiro trimestre de 2021 ante mesmo período do ano passado. Apesar disso, a parcela ainda é pequena perto do gigantesco mercado dos EUA, maior fonte de receitas da fabricante – e a empresa espera que isso mude nos próximos anos.
Segundo o CEO da Taurus, Salesio Nuhs, que conversou com o Money Times, o comportamento do brasileiro em relação às armas mudou, sobretudo com a eleição de Jair Bolsonaro, que chegou ao Planalto prometendo flexibilizar o porte e a posse de armas.
“Quando você muda o comportamento do consumidor, você tem um consumidor ávido a comprar, a consumir. Mesmo mudando o governo, vai ficar. Não é uma questão de política e sim uma questão de comportamento”, diz.
Volta dos lucros
Nos nove primeiros meses de 2021, a Taurus lucrou R$ 428 milhões, revertendo o prejuízo de R$ 15 milhões do mesmo período de 2020. A receita saltou 51,3%, enquanto a produção de armas subiu 53%, para 1,7 milhão, recorde histórico.
Com o resultado, o CEO já declarou que a empresa está pronta para pagar dividendos, algo que ainda precisa do aval do conselho de administração. Dessa forma, a empresa espera atrair a atenção de novos investidores e de corretoras e bancos. Atualmente, a Taurus recebe cobertura de apenas duas casas de análises, Eleven e SaraInvest.
“Estamos nos estabelecendo como uma empresa de fortes resultados. Nossos resultados são consistentes. Mudamos os fundamentos da companhia nos últimos anos”, completa.
Veja a seguir os principais pontos da entrevista concedida ao Money Times.
Money Times: Os números mostram que a Taurus teve um ótimo ano, com elevação de receita, lucro e número de armas fabricadas. Como vocês esperam manter esse ritmo em 2022?
Salesio Nuhs: Isso tudo é fruto de um projeto que começou em 2015, quando a empresa foi adquirida. Aí se consolidou, a partir de 2018, com a nova diretoria. É o planejamento estratégico de longo prazo que sustenta as nossas diretrizes.
As diretrizes nossas são claras. Focamos em tecnologia. Criamos um centro integrado de tecnologia e engenharia Brasil/EUA. Esse centro nos garante que o nosso portfólio esteja sempre atualizado, que lancemos produtos assertivamente, haja vista que nossos produtos são bem premiados.
Além de produtos, ele também desenvolve tecnologia. A Taurus tem 46 patentes depositadas no Brasil e fora do Brasil. O exemplo disso é que vamos lançar no 1º trimestre uma arma com grafeno na composição de seus componentes. É a primeira empresa de armas do mundo a utilizar grafeno.
Segundo ponto: somos focados em volume. Isso é uma característica da Taurus. A nossa média de produção de novembro foi de 10,5 mil armas contra a média do terceiro trimestre, que era 9,6 mil armas.
Terceiro ponto: distribuição global. A companhia, apesar de ter um mercado cativo nos Estados Unidos, está presente no mundo inteiro. Exportamos para mais de 100 países. Estamos atentos a todas as licitações internacionais.
É nesse tripé que garantimos o futuro. Isso transformou a Taurus em uma empresa com forte geração de caixa, que permitiu ter um indicador de dívida líquida versus Ebitda de 0,5% no terceiro trimestre do ano passado. E com tendência de melhorar.
MT: Há espaço para crescimento do mercado de armas?
Nuhs: Estamos considerando o mercado americano nesse ano de 2022 sem nenhum crescimento. Historicamente, o mercado americano cresce 7% ao ano na média dos 20 anos.
Mesmo assim, não estamos considerando crescimento nos EUA e sim uma conquista de novos segmentos por conta desse centro integrado de tecnologia e engenharia. Estamos lançando novos produtos para novos nichos de mercado.
MT: Recentemente, a Taurus anunciou um estudo de uma subsidiária na Arábia Saudita. Há também os investimentos na Índia. Como está a internacionalização da Taurus?
Nuhs: A Taurus é uma empresa global. Apesar de termos um mercado importante nos Estados Unidos e no Brasil, somos atuantes em todos os países do mundo. Como a Taurus cresceu muito nos últimos anos, ganhamos uma exposição mundial grande.
Nesse momento, inclusive, estamos deixando de participar de licitações que não temos interesse estratégico por uma questão de estratégia de resultados. Estamos com uma demanda que nos dá, pelo menos, uns sete meses de produção. Então escolhemos onde daremos prioridade, onde fazemos melhores margens.
A exposição da Taurus faz com que empresas nos procurem em outros países para oferecer parcerias, como no caso da Índia. A Taurus cresceu 30% nos EUA, 32% no Brasil e 193% no resto do mundo nos últimos três meses.
Não atendemos 100% da demanda porque priorizamos a produção local e o mercado americano. O processo de internacionalização é proporcional ao nosso aumento da capacidade de produção.
MT: O presidente Jair Bolsonaro se elegeu prometendo facilitar o acesso de armas para a população. Passados três anos, houve alguma grande mudança no mercado nacional de armas?
Nuhs: Qual foi a grande mudança que o presidente trouxe para o Brasil? A conscientização do brasileiro. Ou seja, mudou o comportamento do brasileiro. Porque, na verdade, em 2005 houve aquele referendo que foi uma pesquisa popular perguntando se a população era contra ou favor o comércio de armas. A pergunta foi feita de forma dúbia exatamente para induzir o eleitor a errar na resposta.
A pergunta era: se você fosse a favor da legitima defesa, você tinha que votar não. Não a proibição do comércio. Apesar de ter ganho o referendo com mais de 75 milhões de votos, 75 milhões de brasileiros votaram a favor de ter o direito ao porte de arma, o brasileiro não conseguiu exercer esse direito.
Porque os governos anteriores eram totalmente contra, houve dificuldade, apesar de ser um direito, eles dificultavam por meio das autoridades que forneciam as autorizações necessárias.
Quando esse assunto veio à tona com a candidatura, com a eleição do Jair Bolsonaro, o comportamento do brasileiro mudou. Ele lembrou que tem esse direito de legítima defesa. E evidentemente houve um aquecimento do mercado: nos 9 primeiros meses do ano passado foram 38% de vendas a mais no mercado brasileiro.
Mas ainda assim, o mercado brasileiro é muito pequeno comparado aos EUA. Está em crescimento, vai crescer. Mas de novo, a mudança foi no comportamento.
E quando você muda o comportamento do consumidor, você tem um consumidor ávido a comprar, a consumir. Mesmo mudando o governo, vai ficar. Não é uma questão de política e sim uma questão de comportamento do consumidor.
MT: Como está a política de dividendos da companhia?
Nuhs: Isso é uma coisa super positiva para o investidor. O estatuto da companhia prevê uma política de remuneração de no mínimo 35% do lucro ajustado. Isso é extremamente agressivo se considerarmos que a Lei das SAs cita 25%.
Isso é um grande atrativo para os investidores que buscam dividendos. Já estamos aptos a pagar o resultado do lucro líquido do terceiro trimestre. Depende dos conselheiros e dos acionistas. Isso sem prejudicar a política de investimentos, tecnologia e aumento de capacidade.
MT: A empresa teve algum problema com falta de suprimentos?
Nuhs: Sim, mas isso não afetou os resultados. Em março de 2020, quando começou a se falar de pandemia, criamos um comitê estratégico. Mudamos nossa política de suprimentos, criamos estoques reguladores da matéria-prima, aumentamos os nossos estoques.
Voltamos a fazer isso, por conta da nova variante [ômicron] da Covid, porque prevemos que haverá problemas não só de logística, como de produção.
MT: Apesar da Taurus ser uma empresa tradicional e líder em seu segmento, não recebe cobertura das grandes corretoras e bancos. A que se deve esse fator?
Nuhs: Somos uma empresa de armas. Existe um certo tabu. Ainda existem resistências em relação ao nosso negócio. Já nos Estados Unidos é o contrário. Arma nos Estados Unidos é um negócio importante na Bolsa, tem cobertura ampla.
Estamos preparando um estudo em relação ao ESG, que hoje é importante. Então a Taurus está se preocupando com essa questão do ESG. Também pagaremos dividendos, de acordo com a aprovação do conselho.
Muda o perfil dos nossos investidores. Estamos nos estabelecendo como uma empresa de fortes resultados. Nossos resultados são consistentes. Mudamos os fundamentos da companhia. A falta de cobertura de grandes bancos deve mudar já em 2022.