Suspensão de testes da CoronaVac era única medida a ser tomada, diz presidente da Anvisa
A decisão da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) de suspender os testes com a vacina CoronaVac, da chinesa Sinovac, foi tomada de forma técnica após a ocorrência de um evento adverso grave não esperado com um voluntário, e o órgão regulador rechaça qualquer alegação de interferência política, afirmaram dirigentes da autarquia nesta terça-feira.
A interrupção do ensaio clínico da vacina que está sendo testada no Brasil pelo Instituto Butantan foi comemorada pelo presidente Jair Bolsonaro, que trava uma disputa com o governador paulista, João Doria, na corrida por uma vacina para o enfrentamento ao novo coronavírus. O Butantan é ligado ao governo estadual paulista.
“O que o cidadão não precisa hoje é uma Anvisa contaminada por guerra política. Ela existe, claro que existe, está aí, mas ela tem que ficar do muro para fora”, disse o diretor-presidente da Anvisa, Antonio Barra Torres, em entrevista coletiva.
Barra Torres, que foi nomeado para o cargo por Bolsonaro, destacou que as informações recebidas pela Anvisa até o momento sobre o evento adverso grave levaram a área técnica a interromper temporariamente os testes com o imunizante de forma imediata.
Por ora, não foi dado prazo para a retomada dos testes com a vacina CoronaVac. A Anvisa ressaltou que a interrupção refere-se apenas à possibilidade de se realizar vacinação, mas outros trabalhos da pesquisa podem continuar a ser desenvolvidos, como compilação de dados, por exemplo.
O presidente do Butantan, Dimas Covas, disse que a decisão da Anvisa causou indignação no Butantan e afirmou que o evento adverso não tinha relação com a vacina. A Secretaria de Segurança Pública de SP disse que a Polícia Civil está investigando a morte de um voluntário nos testes como um suicídio.
Segundo o diretor-presidente da Anvisa, as informações que foram recebidas pela agência até o momento foram incompletas e insuficientes para que fosse possível continuar o desenvolvimento da vacina. “Quando temos um evento adverso não esperado, a sequência de eventos é uma só, a interrupção do estudo”, disse. “Foi o que aconteceu”.
O chefe da Anvisa disse ainda que, se não fosse interrompida a fase de testes, a responsabilidade seria da agência, acrescentando que dúvidas precisam ser esclarecidas e, para isso, é preciso que o órgão regulador receba documentos claros e completos, o que ainda não ocorreu. “Que mal há em aguardar documentos para tomarmos uma decisão com a tranquilidade que essa responsabilidade demanda?”, questionou ele, ao salientar que a Anvisa não é parceira de nenhuma desenvolvedor, laboratório ou instituto.
“Trabalho Respeitado”
Essa foi a terceira suspensão pela agência de ensaios clínicos de candidatas a vacina contra a Covid-19. Em setembro, a Anvisa suspendeu por menos de uma semana os testes do imunizante desenvolvido pela AstraZeneca e Universidade de Oxford após um evento adverso grave relatado pelo órgão regulatório britânico e pelo Comitê Independente de Segurança.
A vacina da AstraZeneca é a principal aposta do governo Bolsonaro para a imunização massiva contra o novo coronavírus no país.
Posteriormente, no mês passado, a Anvisa suspendeu temporariamente os testes com a vacina da farmacêutica Janssen-Cilag, unidade da Johnson & Johnson, após o relato de um efeito adverso com um voluntário no exterior.
No mês passado, um voluntário da vacina de Oxford no Rio de Janeiro morreu, mas o ensaio clínico não foi interrompido uma vez que, segundo fontes, ele havia recebido o placebo e não a vacina. Segundo a Anvisa, naquela ocasião foram enviadas todas as informações necessárias à agência para assegurar o prosseguimento dos testes.
Segundo gerente-geral de Medicamentos da Anvisa, Gustavo Mendes, a decisão da diretoria colegiada de interromper o teste com a CoronaVac foi unânime.
Ele disse que houve uma reunião nesta manhã com o grupo técnico do Instituto Butantan, mas, ainda assim, foi mantida a suspensão porque ainda não se tem evidências e dados de que o estudo pode continuar.
O gerente reclamou do que chamou de situação de politização que põe em xeque o trabalho da agência. “Pedimos que nosso trabalho seja respeitado”, disse.
Antonio Barra rejeitou a possibilidade de a Anvisa reverter a decisão somente com base na informação, veiculada pela imprensa, de que o voluntário que morreu teria cometido suicídio.
Os dirigentes da Anvisa ressaltaram que a comunicação das informações tem de ser repassada pelos canais oficiais e ainda ser submetidas a um comitê independente.