Sob sombra de Lula, STF deve concluir julgamento de revisão sobre prisão em 2ª instância
O Supremo Tribunal Federal (STF) deve concluir na quinta-feira a revisão do atual entendimento que permite a execução da pena de prisão para condenados em segunda instância, na retomada de um dos julgamentos mais aguardados do ano.
Uma eventual mudança do posicionamento da corte poderá tirar da prisão potencialmente 4.895 pessoas no país, segundo levantamento do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), incluindo conhecidos alvos da operação Lava Jato, como o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
Os ministros do Supremo têm sido alvo de forte pressão diante da possibilidade de soltar Lula que está preso desde abril do ano passado – com a eventual mudança de posição adotada em 2016. Mas a corte tem buscado não personalizar o julgamento.
“Que fique bem claro que as presentes ações e o presente julgamento não se referem a nenhuma situação particular”, disse o presidente do STF, Dias Toffoli, logo na abertura da primeira das quatro sessões já realizadas de análise do caso.
O julgamento será retomado na quinta-feira com um placar de 4 votos a favor do atual posicionamento da corte e 3 contrários. Faltam 4 votos e a perspectiva é de uma mudança do entendimento do tribunal.
A avaliação, interna e fora do STF, é que o humor dentro da corte teria virado em desfavor da Lava Jato – grupo que mais comemorou a adoção da prisão após condenação em segunda instância – após revelações em reportagens desde o início de junho pelo site The Intercept Brasil e parceiros.
As matérias apontariam, citando trocas de supostas mensagens de procuradores do caso e o ex-juiz Sergio Moro, um eventual conluio para manipular ações da operação – o que as partes envolvidas negam categoricamente.
Veja os possíveis resultados do julgamento:
Mais Provável
A expectativa é que haja sim a mudança do atual entendimento do Supremo para determinar que a execução da prisão de um condenado possa ocorrer somente após esgotados todos os recursos cabíveis, o chamado trânsito em julgado.
Há a possibilidade de que ao menos três dos quatro ministros que faltam votar – Gilmar Mendes, Celso de Mello e o presidente do STF, Dias Toffoli – votem no sentido de que só se pode decretar prisões de condenados ao fim dos recursos.
Esse provável placar – de 6 votos a 5 em favor da mudança do entendimento – deve ser possível em razão do voto já dado pela ministra Rosa Weber. Ela vinha votando em julgamentos específicos em favor da execução antecipada da pena, em linha com o entendimento atual da corte.
Mas agora, na análise das três ações que tratam do tema do ponto de vista constitucional, a ministra votou pela prisão apenas ao fim dos recursos.
Nesse cenário, Lula poderá ser beneficiado com a soltura, uma vez que foi preso em razão de o Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4) ter confirmado a condenação dele no processo do tríplex do Guarujá (SP) pelo então juiz Sergio Moro.
Uma questão a ser discutida é a soltura dos presos beneficiados.
O relator do caso, ministro Marco Aurélio Mello, já defendeu no julgamento que, após uma eventual decisão a favor do trânsito em julgado, sejam expedidos alvarás de solturas de todos os condenados beneficiados.
Contudo, o tribunal deve decidir se uma soltura desses presos é automática ou, por exemplo, precisa ser requerida pela defesa de cada um dos condenados beneficiados pela medida.
Posição Intermediária
Outra possibilidade é que prevaleça uma proposta alternativa e intermediária, a de que a execução da prisão ocorra apenas após o caso ser apreciado pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ), uma espécie de terceira instância.
Essa proposta já foi defendida em momento anterior pelo presidente do Supremo, Dias Toffoli. Ele ainda não votou e não se sabe se apresentará novamente essa linha de votação.
Se apresentar, é possível que Toffoli fique isolado – com um único voto por essa tese – ou, numa hipótese mais remota, consiga a adesão de outros ministros para tentar formar uma maioria.
Esse segundo cenário pode ou não beneficiar Lula. Isso porque o ex-presidente já teve um recurso que contesta a condenação julgado pelo STJ.
Nessa hipótese, o petista não seria beneficiado. Agora, se o entendimento dos ministros do Supremo for o de que é preciso esperar a apreciação de todos os recursos cabíveis no STJ – como os embargos de declaração, que contestam pontos supostamente obscuros de uma decisão anterior –, Lula poderia ser beneficiado. O STJ ainda não julgou os embargos de declaração da defesa do petista.
Numa tentativa de amenizar um eventual impacto para a posição intermediária ou o trânsito em julgado, o presidente do Supremo enviou aos presidentes da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), e do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), uma sugestão para alterar a legislação para acabar com a possibilidade de prescrição em caso de recursos a cortes superiores.
A prescrição é um determinado prazo a partir do qual as pessoas não podem mais ser punidas por crimes que tenham cometido.
Na prática, a proposta de Toffoli – se for aprovada pelo Congresso – interrompe a contagem do prazo prescricional nos processos que subam para análise das cortes superiores como STJ e STF.
Manutenção
O terceiro cenário para o julgamento é o de que se mantenha o atual entendimento, favorável à execução da pena de prisão após uma pessoa ser condenada em segunda instância.
Para que isso ocorra, é preciso que ao menos dois dos quatro votos faltantes sejam pela tese. Manifestações da força-tarefa da operação Lava Jato, do presidente Jair Bolsonaro e de outros integrantes do governo, como do ministro da Justiça, Sergio Moro, têm defendido essa linha e pressionado a corte a manter o atual entendimento.
Para esse cenário se configurar, a maior possibilidade seria de Toffoli, ao perceber que não conseguiria construir uma maioria intermediária, resolver votar para impedir a mudança no entendimento da corte.