Dólar

Sidnei Nehme: “Random walk” predomina no preço do câmbio. Ação do BC tem pouco ou nenhum alcance

04 jul 2018, 11:18 - atualizado em 04 jul 2018, 11:18

Por Sidnei Moura Nehme, economista e diretor executivo da NGO

Muitos analistas internacionais utilizam-se da indicação da teoria do “random walk” para fundamentar comportamentos de preços de ativos, ou seja, o preço de hoje será igual o de ontem acrescido das expectativas de hoje.

Este parece ser o estado atual da formação do preço da taxa de câmbio no mercado brasileiro, de vez que mantém potencial latente de viés de alta face à inúmeros vetores de influência, mas que se revelam e se alteram com uma dinâmica muito intensa e que acabam por provocar mutações constantes, mas nem sempre tendências, por serem extremamente pontuais.

E, totalmente imune aos efeitos de possíveis intervenções no mercado de câmbio por parte do BC, razão pela qual expusemos ontem que o momento sugere que a autoridade monetária deve “assistir e não intervir”, por ser absolutamente inócua sua ação, salvo se observar movimentos especulativos e/ou demanda efetiva que requeira liquidez para proteção de risco cambial ou liquidez no mercado à vista para viabilizar saída de recursos do país.

Por isto, entendemos claramente a ausência de intervenções do BC no mercado com ofertas suplementares de contratos de swaps cambiais e/ou leilões de linha de financiamento em moeda estrangeira com recompra, mas, ainda assim, entendemos que devesse continuar ofertando linhas de financiamento simplesmente como atitude para influenciar a formação do preço do câmbio, já que a operação fixa a taxa cambial nas duas pontas e entre elas há o juro que também interessa a autoridade o monitoramento.

No Brasil, os fatores internos abrangendo a decrépita situação da atividade econômica, severa crise fiscal, insegurança jurídica e um conturbado cenário em torno da sucessão, que acabou por agregar impactos de uma greve de efeitos deletérios dos caminhoneiros, acabaram por provocar, ao coincidir com a concomitância da ocorrência dos impactos negativos de fatores externos a partir da evolução positiva da economia americana e suas repercussões impulsionando entre tantas coisas a elevação das taxas de juros no mercado americano, afora questões de acirramentos geopolíticos e de confrontos comerciais promovidos por iniciativa do governo americano, sob a influência direta do Presidente Trump, conduziram o preço da moeda americana a uma desvalorização em torno de 20% desde o início do ano.

Há razões e fundamentos para justificar esta desvalorização do real, a taxa anterior em torno de R$ 3,30 parecia em descompasso com a fragilidade da atividade econômica já perceptível mas com abordagem muito restrita e a grave situação fiscal do país.

Ao que tudo indica o preço de R$ 3,75/3,85 é o novo patamar básico para a moeda americana no nosso mercado, mas há o que cognominamos como fatores imponderáveis, aqueles que estão à margem da influência e alcance das intervenções no mercado por parte da autoridade monetária.

Então, a cada dia temos fatos novos que se prolongam e se somam a outros ou se exaurem e este é o fator determinante das mutações do preço, que com base puramente nas expectativas prevalecentes no momento ainda têm um latente viés de alta, mas que poderá ser atenuado principalmente se houver algum vislumbre de melhora no cenário sucessório eleitoral.

Serão inevitáveis impactos inflacionários criando até perspectivas de que o centro da meta seja atingido ou até superada, visto que os impactos secundários da expressiva alta do dólar tendem a se disseminar por todos os preços relativos da economia.

A despeito da apologia do BC de que não existe relação mecânica entre juro e câmbio esta tese tende a sucumbir por insustentável e contrariar toda teoria pertinente. O COPOM precisará elevar a taxa SELIC inevitavelmente.

Os preços administrados demonstram uma volúpia altista surpreendente, sendo que São Paulo a partir de hoje terá um reajuste de mais de 15% na energia elétrica.

Os preços dos combustíveis no Brasil tem enorme impacto visto que 74% do modal de transportes é rodoviário. O petróleo fechou ontem em leve alta depois de alcançar a máxima desde 2014.

Há um absoluto descompasso entre os inúmeros indicadores inflacionários, a despeito das metodologias por vezes diferentes, e a inflação expressada pelo IPCA, o que coloca o indicador em descrença.

O país deverá sofrer expressiva saída de recursos de investidores estrangeiros, seja em renda variável seja em renda fixa. Uma boa parcela dos recursos retirados da Bovespa ainda permanece no nosso mercado em aplicações de renda fixa, mas a tendência é de ganhe intensidade o movimento de saída, e o BC ao detectar este movimento deverá intensificar a oferta de linhas de financiamento em moeda estrangeira com recompra.

Dados disponibilizados ao mercado indicam que neste ano de 2018 foram retirados R$ 9,9 Bi da B3 (Bovespa) no 1º semestre, pior resultado desde 2008, algo em torno de US$ 2,7 Bi, o que não é pouco, mas é muito provável que esta tendência se acentue fortemente, embora se observe que há um grande esforço em torno da Bovespa para que não rompa para baixo os 70 mil pontos.

Há neste momento inúmeros estudos em torno das perspectivas para o dólar, todos muito técnicos e ancorados em determinados fatores, porém como temos salientado há os fatores imponderáveis e estes objetivamente tem maior impacto imediato na formação do preço do que os exercícios teóricos apoiados em premissas.

Ontem e hoje, principalmente hoje, devido ao feriado da Independência americana e com o fechamento de Wall Street fará com que o mercado global tenha indicativos nem sempre fidedignos, sendo que a quinta feira deverá ser muito importante para uma visão mais efetiva em torno das questões polêmicas como guerra comercial Estados Unidos/China e desvalorização do yuan.

sidnei.nehme@moneytimes.com.br
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