Mercados

Sidnei Nehme: No câmbio nem tudo que parece sempre o é

29 nov 2018, 12:13 - atualizado em 29 nov 2018, 12:13

Por Sidnei Moura Nehme, economista e diretor executivo da NGO

A crença na hipótese de que houve um surto inesperado de demanda no mercado a vista de câmbio na segunda feira, dia 26 último, serviu como fundamento crível de que este fato determinou a apreciação da moeda americana em torno de 2,5% frente ao real.

Será?

O fluxo cambial até 0 dia 23 último revela-se negativo líquido em US$ 3,720 Bi e no dia 21 pontualmente houve saídas financeiras líquidas de US$ 6,593 Bi e o saldo do dia foi negativo em US$ 4,077 Bi e o dólar teve neste dia Ptax de R$ 3,7872 e no dia 22 R$ 3,8103, então a questão é por que não houve exacerbação mais relevante como no dia 26 último?

Nesta data os bancos já estavam com posição vendida consolidada em torno de US$ 8,2 Bi e fechou a semana em 23 com um montante de US$ 9,4 Bi, ancorada em tão somente US$ 1,250 Bi de linhas de financiamento em moeda estrangeira com recompra fornecida pelo BC.

Evidente que este cenário de posição vendida consolidada dos bancos que vem sendo evidenciada desde setembro já recomendava ação da autoridade monetária interferindo com oferta de leilões de linhas aos bancos autorizados a operar em câmbio, salvo se os bancos estivessem obtendo linhas externas junto aos seus banqueiros.

Então o que ocorreu em 26/11, houve efetivamente demanda acentuada impondo posições vendidas muito acima dos US$ 9,4 Bi e os bancos liberaram a alta para dar um sinal ao BC que já esse fazia tardia a sua intervenção ou ocorreu um surto especulativo por parte dos “comprados” no mercado futuro ancorados no conjunto de fatores presentes internos em torno da crise fiscal não resolvida e do estresse em torno da cessão onerosa, agregando até fatores não confirmados ou não tão consideráveis de natureza externa?

Embora tardiamente, o BC realizou oferta de linhas de US$ 2,0 Bi no dia 27, US$ 1,0 Bi no dia 28 e hoje realiza novo de US$ 1,250 Bi sendo que este se destina à rolagem da posição vincenda de igual valor no dia 4/12.

Suficiente? Não, a autoridade monetária sabe que nesta fase se acentuam as saídas de recursos financeiros do país, então, “profilaticamente”, deveria realizar de forma mais incisiva leilões de linhas de financiamento em moeda estrangeira com recompra, deixando o mercado à vista bastante confortável. Afinal, considerando os dados até 23 último e os leilões a exposição dos bancos ainda perdura em torno de posições vendidas não ancoradas em linhas do BC de US$ 5,0 Bi, sendo possível que esteja acima deste montante na atualidade.

Temos um contexto em que os “comprados” no mercado futuro de dólar estão em posição de desconforto com o insucesso havido com a especulação sobre o preço do dólar ocorrida e que perdeu sustentabilidade, mas estão atentos a qualquer vacilo, pois nutrem expectativa de que dificuldades em torno da crise fiscal e agora também da cessão onerosa possam ser estressantes a ponto de abrir brecha para retomada de movimento de apreciação do preço do dólar.

A situação absolutamente tranquila das contas externas brasileiras não sanciona a oportunidade de movimentos especulativos, mas se houver descuidos, como parece que houve, é natural a busca do agravamento do prêmio de risco agregado ao preço da moeda americana.

Importante observar que há resistência à apreciação do real desde a alta de 2,50%, havendo cedido um pouco nos dias subsequentes, mas ainda evidenciando certa volatilidade, já que os “comprados” esperam chegar até amanhã, dia da Ptax de final do mês e referencial para os contratos, com o preço “o mais alto possível” dentro das circunstâncias para atenuar seus prejuízos.

Com os bons sinais apontados e aguardados na Ata da reunião do FED, poderia ser esperado um movimento mais animado da Bovespa na sua abertura e o preço do dólar acentuando o viés de baixa, porém isto não ocorre, pois a questão da cessão onerosa e indefinição sobre a crise fiscal são fatores neutralizantes, e naturalmente os “comprados” encontram nestes pontos fonte de resistência.

Não há fatores relevantes que possam dar sustentação ao preço do dólar fora do entorno de R$ 3,75 com possibilidade de chegar a R$ 3,70 ao final do ano, mas sempre que forem dadas brechas naturalmente ocorrerão movimentos pontuais decorrentes do mercado futuro de dólar, provocando volatilidade e comportamentos atípicos nem sempre transparentes de imediato, até porque o BC não informa o movimento diário, fazendo-o tardiamente na próxima semana.

O BC precisará ser mais contundente em suas ofertas em leilões para prover o mercado à vista com liquidez confortável, isto parece evidente e alguns fatores que estão agregando peso no prêmio de risco da moeda americana precisam ser considerados com as suas efetivas dimensões, evitando-se as exacerbações, olhando sempre para a situação de conforto das contas externas brasileiras.

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