Dólar

Sidnei Nehme: Mudança da retórica preditiva do BC é altamente positiva

02 jul 2018, 8:44 - atualizado em 02 jul 2018, 8:44

Por Sidnei Moura Nehme, economista e diretor executivo da NGO

A notória alteração da postura do BC nas suas ações sobre intervenção no câmbio, agora sabidas amplas com os instrumentos possíveis, mas efetivamente discricionárias e a não sinalização comprometedora das futuras decisões sobre a SELIC, são extremamente positivas.

O BC não deve ser indutor prévio de posicionamentos e certezas do mercado, mas deve ser discricionário e obrigar que todos os agentes que interagem nos segmentos a atuarem com extrema acuidade e, isto sim, a partir dos movimentos sinalizados e agregados aos movimentos imponderáveis, adotar sua dinâmica de intervenção e ou decisões.

O BC não deve ser o protagonista da dinâmica do mercado, mas sim a autoridade que responde às demandas fundamentadas que identificar no conjunto de impactos que observe presente, que envolva esta dinâmica e os fatores de influência internos e externos.

O mercado e seus agentes mal habituados estranham esta mudança, mas principalmente em tempos de fartas incertezas e dúvidas presentes e mutantes com grande dinamismo, é absolutamente relevante que altere sua conduta, como sinaliza que está assumindo, dada a ausência de segurança nas previsibilidades.

O importante é que o mercado e seus agentes saibam que o BC está observando e pode atuar no câmbio com todo o seu potencial para conter exacerbações, principalmente as desprovidas de fundamentos e ser realista quando entender que não tem alcance com medidas aos fatores imponderáveis sobre os quais a resultante seria a ineficácia.

Há a clara convicção que ocorre um forte desapontamento com a atividade econômica brasileira e seus vários vetores, incluindo a questão fiscal, e há também a firme percepção de que o humor do mercado global tende a piora, mesmo que ocorram lampejos de melhora que não são críveis de sustentabilidade.

Projeções num ambiente em que prevalecem incertezas relevantes de forte impacto se revelam frágeis, as convicções desaparecem e é absolutamente necessária a acuidade e postura defensiva.

É necessário que os mercados sinalizem para o BC e este processe bem os indícios para fundamentar suas decisões de forma correta, sinalizações estas não com palavras, mas evidenciadas em números que são mais confiáveis.

O Brasil, como temos salientado, convive com um contraditório importante, tem atividade econômica decadente com situação fiscal caótica, insegurança jurídica e um pleito sucessório presidencial absolutamente nebuloso, mas em contraposição, tem uma situação na área cambial confortável quanto ao risco de uma crise, embora não tenha capacidade total de mitigar a pressão sobre a formação de preço da sua moeda quando ancorada em fundamentos.

Tecnicamente dispõe de instrumentos operacionais que o permite proverem a liquidez das demandas cambiais, seja por proteção, seja por saída efetiva de recursos do país.

O contexto Brasil que se vivencia ao findar o 1º semestre e as expectativas prospectivas difere em muito das projeções havidas ao início do ano, e não é razoável ainda se manter projeções ancoradas na visão passada, como ainda se verifica como relutância. Atualmente, a sustentação da inflação dentro da meta está em risco, há pressão sobre os preços relativos da economia decorrentes dos efeitos secundários da elevação do preço do dólar em torno de 20% , mas não só por isto e sim pelo conjunto de fatores negativos com que convive o país.

O preço do dólar no Brasil subiu em torno de 20% desde o início do ano, o dobro da média da desvalorização das moedas emergentes, e isto deixa evidente que afora o impacto dos fatores externos, normalmente postos como causa, a outra metade decorreu dos fatores internos negativos, oportunamente atribuídos pelo governo a greve dos caminhoneiros quando se sabe que era notória a perspectiva de atividade econômica declinante, e que logo conspirava contra a projeção de crescimento do PIB vista inicialmente como em torno de 3% ou mais e agora revista para algo como 1,6% mas com viés acentuado de ser somente 1%.

A greve dos caminhoneiros causou impactos negativos, não tão relevantes quanto se atribui, mas teve um impacto significativo trazendo “a valor presente” o caos que estava sendo “desconsiderado” de forma ágil pelo governo e mercado financeiro.

A atuação do BC no câmbio agora ajustada com a utilização, embora tardia, dos instrumentos corretos para suprir demanda por proteção e demanda a vista, está perfeita e dentro do possível e já que não há como alterar os impactos nefastos na formação do preço que sejam imponderáveis e fundamentados.

Da mesma forma, a postura não preditiva da decisão futura sobre a SELIC é extremamente previdente num ambiente em que não se consegue prever o momento nem da semana seguinte por razões internas e externas.

A ausência de intervenção no câmbio ao final deste semestre foi absolutamente previdente, visto que ao final do mês e do semestre é de bom alvitre não ocorrer nenhuma ação por parte da autoridade monetária, deixando absolutamente à mercê do mercado a formação dos preços dos seus ativos, visto que há repercussões nos balanços semestrais das instituições financeiras.

No câmbio o BC deverá continuar com sua dinâmica de atuar irrigando liquidez tanto na demanda por proteção, em níveis baixos, e na disponibilidade a vista, com maior intensidade.

Este é o seu papel e o seu possível sem buscar confrontar com os impactos dos fatores imponderáveis, pois criaria elevada volatilidade sem obter sucesso, somente coibindo focos especulativos.

O aumento do volume de saídas de recursos do país neste mês oriundos da Bovespa e do mercado de renda fixa deve revelar viés acentuadamente crescente, e isto é no contexto atual inevitável.

sidnei.nehme@moneytimes.com.br
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