Sidnei Nehme: Há muitos efeitos colaterais em torno de eventual redução do juro, nem sempre bons
Usando um velho chavão em torno da Liberdade, pela qual quase todo o mundo se empenha e ao conquistar pergunta: E agora o que faremos? O mesmo pode ser guardada as proporções, o ambiente que cerca a próxima reunião do COPOM e o clamor pela redução mais drástica da taxa de juro, e a pergunta se repetirá se efetivada: E agora, o que faremos?
Todos desejam a redução da taxa SELIC na próxima reunião do COPOM do dia 31, por entender que a atividade econômica está fragilizada e precisa ser estimulada com a redução do juro. Teoricamente, isto é plausível.
Contudo, neste momento temos alguns contextos pontuais que podem conspirar contra esta ideia imediata.
Como temos salientado, há alguns fatores relevantes que constrangem a expectativa de retomada da atividade econômica imediata, normal reação causa-efeito esperada, e o mais perceptível é a expressiva capacidade ociosa existente e a baixa propensão ao investimento.
O NUCI ( Nível de Utilização da Capacidade Instalada), embora tenha subido 0,5% entre junho e julho, atingindo patamar de 75,5% idêntico ao de outubro de 2018, evidencia que há elevada capacidade ociosa. Os demais índices não revelam nenhuma expectativa alvissareira, sendo que a parcela de empresas que classifica a situação como boa caiu de 19,6% para 11,9% enquanto a fatia que considera a situação ruim cresceu de 21,1% para 22,7%.
Os indicadores de produção e emprego para os próximos 3 meses recuaram 1,4 ponto e 0,3 ponto, respectivamente.
O velho e bom índice de venda de papelão ondulado para aferição da atividade da indústria caiu 14,9% em junho na comparação com o mesmo mês de 2018, e 9,74% se comparado em relação a maio deste ano.
O Índice de incerteza do FMI, embora tenha caído em relação a 2018, está acima da média histórica para o Brasil.
Evidente que há índices com discretíssimas melhoras, mas distantes de serem motivadores à retomada dos investimentos antes de exaurir relevante parte da capacidade ociosa e isto demandará tempo.
Todos têm perfeita noção de que este 2º semestre deverá configurar atividade econômica estagnada e a previsão de PIB com crescimento de 0,8% tem se consolidado, da mesma forma que há convicção de que o governo continuará carente de recursos para investimentos estruturais mesmo com a aprovação da Reforma da Previdência e mesmo com a Reforma Tributária.
O governo está dependente do programa de Privatizações e seu sucesso, e esta perspectiva é de médio prazo.
A economia precisa de consumo, mas a liberação programada do FGTS é vista como paliativa, já que além de ser pontual expressiva parcela da população está inadimplente e tende a quitar seus passivos e não a consumir.
A agenda de reformas do governo é positiva para perspectivas econômicas do país, mas tem um fator imponderável que é o tempo, serão necessários este ano e boa parte do ano que vem, se tudo transcorrer positivamente, para que a economia recupere tração e confirme as perspectivas.
Então, o que fazer com o juro baixo neste quadro sugestivo dada a queda da inflação?
Provavelmente intensificar a troca de dívida externa por dívida interna aproveitando o juro baixo e a liquidez.
E isto, provoca saída de dólares do país sem recíproca na novação de empréstimos.
O estreitamento do juro externo com o juro interno afasta eventual fluxo de capitais especulativos do Brasil, diferentemente de momentos anteriores, e mais interfere fortemente no mercado de cupom cambial, que com o fluxo cambial negativo para o país, pode pressionar a taxa de câmbio do mercado à vista elevando-a, exigindo ação mais contundente por parte do BC.
Eventual manutenção de taxa cambial mais elevada pode impactar na formação do preço dos combustíveis, fato relevante para um país que tem o seu modal de transportes 70% rodoviário, e os fretes impactam em grande parte dos preços dos produtos.
Afora as inúmeras repercussões e até desapontamentos em torno de eventual redução da SELIC, nosso foco de preocupação é o impacto na formação do preço do câmbio do dólar, do estreitamento das taxas de juros externa e interna, num momento de sustentável fluxo cambial negativo para o país, que poderá levar o BC a utilizar operacionalmente, como contumaz, as reservas cambiais brasileiras, até de forma não trivial como vender moeda efetiva, o que não tem feito parte das estratégias praticadas.