Opinião

Sidnei Nehme: Fluxo cambial ruim, risco de disfuncionalidade, BC venderá dólares das reservas!

19 ago 2019, 13:28 - atualizado em 19 ago 2019, 13:28
Colunista faz análise da câmbio com foco no questão da venda de dólares pelo BC

Sem muitas firulas, simples assim!

O país tem problemas conjunturais e estruturais que lhe tiraram a atratividade ao capital estrangeiro, e, para que se tenha ideia a diferença de fluxo cambial líquido a menor em 2019 em relação a 2018 é da ordem de US$ 30,0 Bi.

Em nossas abordagens antecedentes havíamos aventado a imperatividade desta ocorrência inevitável (BC vender dólares efetivos) já como decorrência da combinação do estreitamento das taxas de juros interna e externa e seus efeitos no custo do cupom cambial, nem sempre salientado nas abordagens sobre o mercado de câmbio, como consequência de movimentos de aversão ao risco que também reduz o acesso ao financiamento externo e que acaba por provocar a disfuncionalidade do comportamento do mercado.

A baixa liquidez no mercado à vista agravando o custo do cupom cambial provoca a elevação da taxa à vista acima da praticada no mercado futuro, criando a disfuncionalidade, visto que no Brasil a formação efetiva da taxa cambial se dá a partir do mercado futuro.

Então o BC anunciou 2 medidas no mercado de câmbio.

Uma objetiva pela venda de dólares das reservas cambiais que como indica envolve moeda efetiva, redução das reservas e suprirá a deficiência presente do fluxo cambial, e que naturalmente, provocará redução da Dívida Pública como consequência, revertendo no tempo o que provocou de elevação, já que as reservas cambiais brasileiras não foram construídas com superávits fiscais e sim com aumento da Dívida Pública.

Outra indireta com efeito direto na formação da taxa cambial derivativa no mercado futuro de dólares, que envolve os swaps cambiais instrumento financeiro referenciado em dólares para “hedge” (proteção variação cambial x juros), mas que não envolve movimento de dólares efetivos das reservas cambiais brasileiras, já que não são casados com as mesmas, e são transações liquidáveis em reais e por diferença.

As reservas cambiais somente respaldam a credibilidade do governo para emissão dos swaps cambiais e honra do compromisso envolvido na transação, mas sem envolver entrega de moeda efetiva. Então não há porque se confundir que gastamos dólares da reserva numa ponta e reduzimos gastos de dólares na outra ponta.

Procedendo ao enxugamento da posição de swaps cambiais postos no mercado o BC utiliza os swaps cambiais reversos e com isto dá um “input” de sustentação do preço no mercado futuro, procurando evitar – combinado com a oferta de dólares efetivos no mercado à vista – que ocorra a disfuncionalidade.

Perfeito! Só que deveria ter iniciado de imediato, pois como dizia Delfim Neto, em câmbio primeiro se faz e a explicação vem depois, pois até o dia 21 os fatores adicionais de pressão continuarão a prevalecer.

O fato é que a aversão ao risco tende a se acentuar face ao conflito USA-China e mais a deterioração que se verifica no mercado global, onde pontifica o protecionismo/popularismo que coloca em risco os fundamentos da globalização, e que determina postura defensiva dos países ou regiões levando à prioridade a segurança em detrimento da rentabilidade, e tornando inócua a reação com redução de juros para contrapor-se às mutações paritárias das moedas que são fortes elementos nas concorrências comerciais e afetadas também pela busca por proteção.

Ambiente complexo e adverso a quase todos, mas principalmente aos países emergentes e que encontra o Brasil num estágio amplamente vulnerável para formação do preço do câmbio, a despeito de não evidenciar risco cambial já que dispõe de considerável montante de reservas cambiais, mas está carente de atratividade e isto se reflete no fluxo cambial e a partir daí há o desencadeamento de todas as repercussões que o BC, previdentemente, busca evitar que venham a ocorrer.

O dólar continua tendente a valorização no mercado externo frente às moedas emergentes em especial, embora os Estados Unidos esteja com inúmeros pontos controversos e até alguns indicativos que possa vir a ter uma recessão, sinalizada pela inversão da curva de juros do Tesouro norte-americano, mas ainda é o refúgio mais imediato de defesa, porém o seu ambiente está cercado de eventos ao longo desta semana, como ata do FOMC, reunião das autoridades do FED em Jackson Hole, Wyoming, USA, quando se poderá ter percepção de novos alinhamentos e pronunciamento do Presidente do FED Jerome Powell na sexta-feira.

O ouro, mercado mais sofisticado, tem ganhado destaque e ampla valorização neste clima generalizado de insegurança, havendo também demanda por yen e sw.fr.

O mercado externo deverá continuar sinalizando incertezas e tensões.

No Brasil a correta decisão do BC na forma posta e esclarecida, para evitar equívocos, não deverá impactar de forma forte apreciando o real, mas manterá firme o viés de alta do dólar, mas eliminando o fator adicional de pressão decorrente de eventual disfuncionalidade.

Portanto, queremos crer que o preço deverá rondando o preço de R$ 4,00, após o início da intervenção do BC, mas sem fundamentos para ir muito além disto apresentando até movimentos de volatilidade ocasionais e moderados.

Este imbróglio mundial tende a ser mais duradouro devido a deterioração das economias e a ineficácia das reduções de juro para incrementar o desenvolvimento e retomada do dinamismo da atividade econômica, por isso tudo leva a crer que o fluxo cambial para o Brasil perdurará fragilizado e a atratividade baixa, o que não sugere que a Bovespa galgue grande desempenho, prevalecendo a predominância de operações de day trade, que pode determinar “espasmos”, mas não tendência.

O Boletim FOCUS continua apontando o IPCA comportado agora em torno de 3,70% e até uma discreta melhora do PIB para 0,83%. Normal.

Acreditamos que a projeção para o dólar em R$ 3,78, a nossa era de R$ 3,75, passou a ser bastante insegura tendo em vista o ambiente externo conturbado e com previsão de média /longa duração, da mesma forma que entendemos que a redução da SELIC como vem sendo ambicionada até 5% precisaria ser reavaliada considerando a sua ineficácia atual como motivadora para investimentos, mas com grande potencial para provocar a disfuncionalidade no mercado de câmbio dado o estreitamento do juro interno com o externo, com impactos relevantes na formação do preço do câmbio.

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