Colunistas

Sidnei Nehme: Exacerbações momentâneas podem ir além da razoabilidade

12 jul 2019, 10:49 - atualizado em 12 jul 2019, 10:49
Dólar
(Imagem: Marcello Casal Jr/ Agência Brasil)

Por Sidnei Nehme, Economista e Diretor-Executivo da NGO Associados Corretora de Câmbio

O anseio provocando reação emocional, afastando o comportamento dos mercados brasileiros do racional, pode criar movimentos exacerbados imediatos que, no transcorrer acabem se revelando insustentáveis, pois carentes de fundamentos efetivos que concretizem as expectativas teóricas.

Evidentemente, a aprovação da Reforma da Previdência, assim que consolidada e admitida certa desidratação na sua finalização, se constitui num considerável passo por parte deste governo no avanço para que o país possa retomar dinâmica de sua atividade econômica, na medida em que atenua a severa e comprometedora crise fiscal presente.

Contudo, nem tudo ocorrerá, acreditamos, tão rapidamente quanto se anseia e deseja, havendo uma longa trajetória que envolverá necessariamente outras reformas, que não deverão ser aprovadas de forma cordata pelos políticos dada a existência de pontos conflitantes, e que certamente impactará no retardamento da grande mudança estrutural focada por este governo, tirando o país da forte estatização para um perfil liberal, através das privatizações.

O fato marcante que deve ser considerado é que com a Reforma o governo deixará de ter custos para os quais não havia suporte de receitas e não que vá proporcionar recursos para que possa estimular o investimento público.

Notoriamente o governo não terá ímpeto para com investimentos públicos induzir o investimento privado (crowding in), e este pode ter retardada a decisão por parte do empresariado em razão das projeções presentes desalentadoras para o 2º semestre deste ano e ao fato de que o setor produtivo ainda registra enorme capacidade ociosa.

Serão então necessárias outras reformas, dentre as quais a Tributária para buscar dar novo impulso à decisão de investir por parte da iniciativa privada, porém não se espera que a Reforma Tributária tenha trâmite mais sereno e curto do que a Reforma da Previdência, já que envolve interesses diversos nas questões estaduais no entorno do ICMS e municipais no entorno dos SERVIÇOS, podendo haver mais facilidade na aglutinação dos tributos federais, que se na sua praticidade tiver alguma semelhança com a antiga CPMF já surgirá com forte oposição pública.

A sensatez recomenda que se considere a Reforma da Previdência na sua adequada importância, na medida em que alivia o governo do risco de inadimplência, mas que pode não ter todo este impacto motivador e grandioso que vem sendo propagado para a retomada da atividade econômica, que pode ganhar foco porém com implementação gradualíssima.

Então, exacerbações fortes momentâneas podem ir além da razoabilidade e acarretar desapontamentos num ambiente que está absolutamente ansioso para que o país retome a dinâmica do crescimento e desenvolvimento.

A atividade econômica é que dá força motriz a atratividade pela Bovespa de forma consistente, exceto para os produtores de produtos exportáveis com ênfase às commodities, e o restante depende da retomada efetiva da demanda interna, que depende da geração de emprego, renda e consumo.

Por outro lado, a impulsão deste movimento, exaurida a capacidade ociosa existente, é que motivará novos investimentos por parte do empresariado nacional e investidores estrangeiros em conta capital.

Então, o fato do FED reduzir a taxa de juro americana que favorece os países emergentes pode não ser indutor de direcionamentos imediatos de investimentos para o Brasil, a despeito do excepcional CDS do país no entorno de 130 pontos, baixa inflação, mas em razão da ainda falta de tração para retomada da atividade econômica.

Por outro lado, é preciso ter especial atenção em relação ao preço do dólar no nosso mercado.

Nós temos projetado, resistindo à toda fase de especulação que conduziu o preço da moeda americana aos R$ 4,20, o preço para o final do ano em R$ 3,75, que entendemos compatível com o que projetamos de possível para o país este ano e considerando que as contas externas brasileiras estão defendidas com as soberbas reservas cambiais e controlado déficit em transações correntes.

Continuamos com esta projeção, mas no momento ao atingir este nível de taxa sentimos insegurança em afirmar que está sustentável neste nível, visto que o país enfrenta carência de fluxo cambial positivo, cenário bastante atípico em relação aos anos passados mais recentes, e este fato causa reflexos nos outros segmentos do mercado de câmbio, em especial no cupom cambial que em caso de demanda mais acentuada no mercado à vista pode exacerbar o seu custo e isto pode provocar a necessidade do Banco Central do Brasil vender moeda (dólar) efetiva ao mercado.

Se este fato vier a ocorrer, naturalmente pela “novidade” pode propagar ilações absolutamente incorretas, criando diversidade de interpretações desgastantes, muito além do razoável.

Este cenário, em tempos idos, quando a taxa SELIC era bem maior e permitia a montagem de operações de “carry trade” fomentando fluxo de recursos estrangeiros especulativos para o país sanava eventuais quedas de fluxos ou acentuava os mesmos, mas agora as margens entre juro interno e externo estão exíguas e ainda há o custo do cupom cambial, o que as torna quase inviáveis.

Desta forma, os investimentos estrangeiros passíveis de direcionamento para o país tendem a ter efetivo foco em situações concretas de nossa economia e não tanto especulativo, o que torna a questão do fluxo cambial negativo mais severa.

Enfim, no nosso ponto de vista é absolutamente necessário que, mantendo o otimismo, não se permita que excessos de expectativas imediatas provoquem o afastamento do bom senso necessário.