Opinião

Sidnei Nehme: Economia brasileira, dos anseios visionários à dura realidade, distância abismal

18 jul 2019, 10:12 - atualizado em 18 jul 2019, 10:12
Colunista traz reflexão entre expectativa e realidade para economia brasileira 

É frequente a leitura de colocações postas a partir preponderantemente do mercado financeiro projetando auspiciosas perspectivas para a Bovespa, acompanhada com redução drástica da Selic, queda expressiva do preço do dólar e do juro, etc…, enfim ilações as mais variadas e otimistas, que, contudo, se contrapõe à dura realidade das perspectivas baseadas em números e não em anseios, que sugerem que há um enorme distanciamento entre o anseio e a realidade.

Temos enfatizado de forma contumaz que a Reforma da Previdência não proverá ao governo recursos para os investimentos públicos estruturais, mas tão somente deverá promover um relativo alívio na crise fiscal brasileira que é crítica, permitindo que não ocorra o caos, e que seja possível ao governo dar sequência às reformas, com destaque para a Tributária, que permitam o reordenamento do país e o modernize com choques de desburocratização.

Em verdade se criaram muitas falsas expectativas em torno das resultantes da Reforma da Previdência em termos de retomada da atividade econômica, mas como salientamos prevaleceram os anseios e faltou percepção à realidade.

O governo não tem recursos para investimentos, como dissemos ontem, e o setor produtivo não tem motivação a realizar investimentos tendo em vista a enorme capacidade ociosa existente na atualidade.

Então, há um “nó” sério que trava e anula as expectativas mais otimistas que foram construídas mais no anseio emocional do que no racional.

Nem mesmo com a consideração de eventual aprovação da Reforma Tributária é possível vislumbrar impulsão à retomada da atividade econômica, a despeito de que poderá ser mais um fato positivo.

Consciente deste quadro nefasto em que são praticamente nulas as perspectivas de curto e médio prazo para a retomada da atividade econômica, com geração de emprego, renda e consumo, o governo sinaliza que pode vir a utilizar subterfúgios de oportunidade para elevar o poder aquisitivo da população via liberação parcial dos saldos dos empregados no FGTS, o que é algo sempre visto com ressalvas, pois é uma “permissão para sacar a poupança do empregado que foca o seu futuro quando aposentado”, parecendo mais um “lesa pátria” aos interesses dos mesmos, ou seja “benesses” com característica de maldade.

Uma decisão deste tipo poderá dar um “alento absolutamente por curto prazo”, longe de resolver e alavancar a retomada da atividade econômica e sem potencial para estimular retomada de investimentos pelo setor privado, pois poderá provocar tão somente um espasmo no consumo, mas não reativação do mercado de consumo.

O governo precisa “gerar recursos” e isto, ao que tudo indica, só será possível com a aceleração das privatizações, seguidamente mencionadas pelo Ministro da Economia, deixando evidente que tem perfeita noção do quadro atual do país.

Contudo, há o fator tempo e é possível antever os embates e protelações, tão ou mais acentuados do que os ocorridos em torno da Reforma da Previdência, ideológicos, corporativistas e nacionalistas, o que torna distante a perspectiva da efetiva retomada da atividade econômica, colocando-a como de médio à longo prazo.

E então?

Com este cenário não há como propagar-se entusiasmo de curto/médio prazo com a Bovespa, muito à mercê do investidor nacional neste momento e que deverá despertar baixa atratividade ao investidor estrangeiro.

Contudo, o que se lê e observa são projeções diversas apontando até 140 mil pontos para o final do ano.

No câmbio, nossa projeção desde o início do ano foi de preço de R$ 3,75 ao final do ano, tendo em vista que o país tem situação absolutamente tranquila nas contas externas e déficit em transações correntes controlado, portanto, bem defendida e sem pressões da crise fiscal dada a aprovação da Reforma da Previdência, e esta evidência está clara ao observarmos o CDS do país no entorno de 128 pontos.

No momento, o preço do dólar atingiu este patamar levado pelo emocional e não o racional, porém consideramos que sem sustentabilidade, pois ocorre fato novo imprevisto, ou seja o fluxo cambial negativo para o país, dada a perda de dinamismo das exportações, reduzindo o fluxo comercial e fluxo financeiro negativo acentuado evidenciando desinteresse do investidor estrangeiro além do previsto.

Com este quadro poderá haver pressão no mercado à vista e no custo do cupom cambial e isto coloca presente o risco de disfuncionalidades no comportamento do mercado, que pode até provocar outro fato novo, o Banco Central do Brasil ter que vender dólar moeda efetiva ao invés de ofertar contratos de swaps cambiais e financiamentos em moeda estrangeira com recompra.

O fluxo cambial negativo era algo imprevisto em nossa projeção desde o início do ano para apontarmos o preço de R$ 3,75, que agora está sob-risco de ser agravado com eventual apreciação do dólar frente ao real pelas circunstâncias presentes.

Evidente, há inúmeros fatores externos em ebulição como o conflito sino-americano, as questões no entorno da Comunidade Europeia, a tendência de perda de dinamismo do crescimento global, etc…, mas tudo isto, na realidade, tem poucos reflexos efetivos no Brasil no momento, embora seja trivial e costumeiro admitirmos que ocorram impactos locais, porém nada disto provoca ou é causa da falta de atratividade atual do país, que precisa encontrar soluções para seus problemas para então perfilar-se junto à comunidade global.

Nem mesmo a forte expectativa em torno da postura do FED americano e a dinâmica da economia americana, que poderá resultar na redução da taxa de juro americana e que, em tese, seria um ponto extremamente favorável para o Brasil poderá não ser estimulante ao direcionamento de recursos para os segmentos do nosso mercado, visto que a Bovespa precisa de tração efetiva oriunda da retomada da atividade econômica, improvável no curto prazo, e o juro tem atualmente margem muito estreita entre o interno e externo, ainda mais quando se projeta redução acentuada da taxa SELIC, face à queda acentuada da inflação brasileira.