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Sidnei Nehme: Dúvidas, incertezas e riscos do Brasil estão muito além da problemática “Lula”

29 jan 2018, 11:38 - atualizado em 29 jan 2018, 11:38

Por Sidnei Moura Nehme, economista e diretor executivo da NGO

O resultado do julgamento do ex-Presidente Lula era previsto com pequenas ressalvas, não tendo havido grande mudança sobre as perspectivas, mas o mercado financeiro “festejou” como se o grande problema brasileiro estivesse amplamente resolvido.

Expressou números recordes no desempenho de alta da BOVESPA e na valorização do real, transparecendo que tudo o mais que envolve o país fosse secundário.

Pois bem, a candidatura do ex-Presidente Lula parece inexequível, definitivamente inviabilizada, salvo se nosso STF retirar uma solução mágica da “cartola”, mas ainda assim é muito improvável. O que restará é a reação sistêmica de seus aliados propagando a sua vitimização e provocando baderna, e as repercussões sempre danosas conceitualmente sobre o país, tanto interna quanto externamente, serão maiores ou menores na medida em que a mídia dê espaço às fanfarrices e aos arroubos costumeiros.

Especialistas na matéria eleitoral sancionam que com a exclusão do candidato de esquerda fica fragilizado o candidato de direita, favorecendo candidatos de centro. Contudo, não se vê candidatos potenciais de centro, havendo postulantes que são lideres regionais sem grande capacidade de alcançar abrangência nacional e alguns nomes isolados, porém não carismáticos.

O Brasil precisará forjar um candidato que consiga efetivamente criar perspectivas de que o país poderá trilhar uma rota sustentável de recuperação.

É absolutamente necessário que o foco, à margem de surgimento de um candidato efetivamente viável e dos ruídos inconsequentes em torno da inviabilização da candidatura do ex-Presidente Lula, o país desperte focando seus efetivos e relevantes problemas latentes que vem sendo mitigados e criam cenários bastante descompassados com a sua realidade.

Entre os discursos e a realidade existe uma distância substancial.

A crise fiscal é altamente relevante e pode deixar o país numa situação que provoque reversão forte e imediata das expectativas, com risco de ter novos “downgrade” nas suas notas de crédito pelas agências de rating, e mudança radical do apetite dos investidores estrangeiros pelo país, a despeito da ainda amplamente satisfatória liquidez no mercado internacional.

A reforma da Previdência, sujeita pelos sinais mais recentes a novos ajustes, aparentemente, a despeito do empenho pessoal do Presidente Temer, ainda não conquistou o apoio numérico de votos parlamentares necessários para aprovação.

Há outras reformas imprescindíveis na mesma rota de colisão e que não evidenciam facilidade de aprovação e que já foram inviabilizadas na tentativa inicial.

Se não lograr sucesso, o Brasil deve enfrentar um quadro bastante conturbado com o risco de reversão das expectativas atuais, que destaque-se, neste momento, são mais emocionais e anseios do que suportadas por fundamentos criveis.

O fato de ser um ano eleitoral dificulta sobremaneira o quadro de negociações entre o Executivo e o Legislativo, e ainda ocorre interferência do Judiciário.

O governo realiza um esforço mercadológico intenso buscando criar um ambiente de sucesso.

Enaltece o emprego falando em geração de 1,4 milhão de vagas, mas o resultado real final do ano foi de perda de 21 mil vagas, e isto é o que vale efetivamente, foi melhor do que dos anos de 2015 e 2016 que perderam algo em torno de 3,0 milhões, mas o que aconteceu foi um incremento das perdas e nenhuma recuperação, somente uma sinalização de que isto poderá ocorrer ao longo de 2018.

Desta forma, é temerária a perspectiva de crescimento do PIB de 3% em 2018 com base no aumento de consumo da família.

Cenário político indefinido por ausência de candidatos viáveis, convivendo com os ruídos reacionários dos adeptos do ex-Presidente Lula, e um contexto econômico relativamente ameaçado pela crise fiscal que pode imobilizar o governo, são perspectivas que sugerem moderação e equilíbrio em torno das projeções para o desempenho do Brasil.

A questão “Lula” confirmou as perspectivas existentes, agora deve ganhar foco os consideráveis problemas que assolam o país e com incógnitas em torno das evoluções para o bem ou para o mal.

Falta consistência efetiva, discursos são enfatizados propagando conquistas ainda não consolidadas e com enormes fatores opositores, e isto torna amplamente vulnerável as reações imediatas ao fator “Lula”, que não resolvem os problemas efetivos do país e, mesmo criando uma perspectiva melhor para candidatos de centro, carece de nomes viáveis.

Por outro lado, não se deve perder foco sobre as mudanças externas, havendo muita expectativa sobre os efeitos das mudanças tributárias ocorridas nos Estados Unidos, que poderão impactar nos países emergentes.

A alta extraordinária da BOVESPA pode não se sustentar, pois é consequente, principalmente, do apetite dos investidores externos, que podem mudar de conduta se os riscos em torno do Brasil vierem a se acentuar, e o dólar tende a buscar preço mais equânime com o contexto econômico-político, com ênfase a crise fiscal.

As perspectivas ainda estão muito afetadas por dúvidas e incertezas.

Sensatez é postura previdente.