Sidnei Nehme: dicotomia predomina entre economia e saúde, mas tensões geram outros desafios!
Por Sidnei Moura Nehme, economista e diretor executivo da NGO Associados Corretora de Câmbio
O momento é muito adverso para o Brasil, sendo praticamente impossível a definição, mesmo que tentativa, da visão prospectiva, visto que predomina a dicotomia entre economia e saúde, inexistindo convergência consensual nos “aparentes” avanços, que, contudo, ocorrem desordenadamente deixando “em aberto” a possibilidade de revisão na flexibilização já ocorrida, visto que o quadro da pandemia se revela contundente e ainda passível de forte agravamento.
Há absoluta insegurança e incertezas criando um ambiente perturbador e desalentador, e não bastasse isto, o país que já convive com a dicotomia saúde e economia, neste ambiente nebuloso está convivendo com forte estresse político e jurídico, que completam um quadro absolutamente nebuloso que torna imprevisível qualquer projeção e/ou tendência mais assertiva sobre o destino imediato do país.
O número de atingidos infectados e a mortalidade provocada pela pandemia são crescentes, mas por outro lado é crescente também a dura realidade em torno da atividade econômica, que dilapida a já exaurida capacidade da população de superação da combalida situação.
Neste ambiente complexo e sem que se tenha visão consistente das vertentes para melhor e/ou para pior, há notória fragilidade nas projeções em torno do futuro imediato do país e, portanto, se houver acuidade rigorosa nas avaliações naturalmente a conclusão será desanimadora.
A complexidade é enorme, então há pouca convicção nas análises que se possam gerar a partir de uma visão mais ampla e que se reproduzem nos ativos negociados pelo mercado financeiro brasileiro.
Objetivamente não há fundamentos, num país que dizimou grande parte do poder aquisitivo de sua população além do fato de não criar perspectiva de recuperação no curto prazo, as projeções contumazes em torno da visão prospectiva do comportamento da B3 (B3SA3) não pode ser otimista, assim como é muito improvável que o dólar tenha razões e motivos para recrudescer em seu preço frente ao real.
O “troféu” almejado pelo governo do “câmbio alto e juro baixo” foi conquistado, se bem que quando se observa o comportamento dos IGP´s há uma grande diferença em relação ao IPCA debilitado, mas uma grande parcela de relações econômicas ainda perdura vinculada aos IGP´s, mas oficialmente a inflação foi “a lona”, e o câmbio alto, estimulado em grande parte como política do governo, veio para ficar, da mesma forma que o juro baixo que é consequência da inércia da atividade econômica, mas que não consegue se transformar em realidade nos repasses de empréstimos à pequena/média empresa.
Sem devaneios, todo o contexto é complexo e não há diretrizes consistentes que possam sugerir saídas fáceis, muito provavelmente tendo que piorar para então emitir sinais de melhora.
Vivemos de pequenos “espasmos” na B3, seja pelas oportunidades de preços das ações baratas em reais e mais baratas em dólares que, contudo, não resistem a um fluxo cambial melhor direcionado que provoca o efeito pendular de ajustar os preços das ações ao deprimir o preço do dólar, mas que não têm sustentabilidade visto se tratar de movimento meramente pontual e que se exaure em poucos dias.
Por outro lado, o dólar que “por obra e arte” da estratégia do governo que não logrou o sucesso inicialmente almejado porque “atropelado” pela pandemia do coronavírus, e ainda pela inércia em desenvolver o programa de privatizações e a implementação das reformas imprescindíveis.
Em realidade, o preço do dólar não estaria neste preço não houvesse ocorrido a indução para o fato pelo BC, que naturalmente focou vender parte das reservas cambiais, como o fez, com o preço elevado da moeda americana, sustentada pela realização de oferta de dólares no mercado à vista, com sustentação da taxa com oferta de swaps cambiais reversos.
Desta forma, o dólar ganhou um novo patamar e cultivou muitas “estórias” no entorno do ocorrido, até mesmo com o sofisma de misturar posição de dólares efetivos (as reservas cambiais) com posição de derivativos em dólares (que não envolvem moedas e são liquidáveis por diferença entre variação cambial vs juros em moeda nacional) e criar uma definição de posição líquida em dólares. Enfim, conseguiu vender alguns bilhões de reservas cambiais sem criar alardes, mas de forma a não depreciar o preço do dólar como objetivo.
Enfim, o país inquestionavelmente não desperta atratividade aos investidores estrangeiros, a B3 está tendo sustentação pelo ímpeto dos investidores pessoas físicas nacionais “órfãos” do mercado de renda fixa, mas não há no horizonte papéis que garantam este ímpeto.
Por outro lado, o dólar não deve ter movimentos abruptos causados pela pressão de demanda e/ou oferta, devendo, em tese, manter o patamar atual, exceto quando afetado por estresse político interno por hábito, e, na margem pelo comportamento da moeda americana no mercado internacional, sendo oportuno observar-se sempre o comportamento na CME (Chicago) visto que o real é uma moeda de grande atração especulativa.