Opinião

Sidnei Nehme: Descompasso político impacta no mercado financeiro, que perde seus fundamentos

28 mar 2019, 7:38 - atualizado em 28 mar 2019, 7:38

Por Sidnei Moura Nehme, economista e diretor executivo da NGO

Dentre as inúmeras “Leis de Murphy” existem duas pontuais: “se há possibilidade de várias coisas darem errado, todas darão” ou a que “tudo que começa mal, termina pior”.

Estariam elas presentes no quadro brasileiro no momento?

Após a expressão entusiasta de otimismo com os “novos tempos” com novo Governo e um Congresso bastante renovado esta parece tendente a sucumbir á algumas situações pontuadas pelas de Leis de Murphy, e esta percepção é crescente no dia a dia quando se torna evidente a absoluta perda de foco na discussão séria e profícua em torno da Reforma da Previdência, peça fundamental para que o país supere seu “status quo” crítico na questão fiscal e recupere capacidade de retomada desenvolvimentista, com a intensificação da atividade econômica, geração de emprego, renda, consumo e arrecadação, e mais, possa implementar planos efetivos de governo.

O país está num “corner” criado pelas dificuldades de articulação política entre Executivo e Legislativo, onde o principal se tornou secundário aniquilado que está sendo por embates desgastantes onde pontificam disputas de egos e um jogo confuso de criação de inviabilidades, deixando de lado os interesses maiores do país.

O mercado financeiro então entra em ebulição na formação descontrolada dos preços dos seus ativos, mixando realidades e especulações oportunas, perdendo senso e se afastando dos fundamentos que passam a ser severamente afetados.

O contexto que era considerado “binário”, mas com um viés de otimismo, de repente mantém a característica de “binário” absolutamente neutro, podendo efetivamente redundar em situação até então impensável.

A Bovespa “derrete”, afinal se as perspectivas para a reabilitação da economia recrudescem não há como sustentar viés de alta, já que, em última instância, o que interessa é a capacidade da atividade gerar lucros. É natural que seja assim, mas este é um segmento que acaba por contaminar o sentimento da população intensificando o desânimo e descrença.

O dólar passa a ser acentuadamente especulado, mesmo que o país não tenha problemas cambiais como é o caso. Muito pelo contrário, dispõem de confortável situação das contas externas, reservas cambiais substantivas, etc….mas, por tradição e não pela razão, sempre é o ativo mais imediato para especulação quando o ambiente fica confuso e incerto no país.

Não é o ativo que possa sustentar exacerbação especulativa, pois não havendo fundamento para tanto, acaba por perder ímpeto por si só.

O fluxo cambial não evidencia pressão de demanda no mercado à vista que possa justificar impacto e alarde, as pressões especulativas decorrem das “apostas” no mercado de dólar futuro, mas o Brasil tem números para evidenciar que apostar no dólar não será uma boa aposta.

No mês o fluxo cambial total está negativo até o dia 22 em US$ 4,497 Bi, sendo financeiro negativo em US$ 5,776 Bi e comercial positivo em US$ 1,279 Bi. Na semana finda em 15 o fluxo financeiro negativo estava em US$ 5,973 Bi, não tendo havido incremento na última semana. No ano o fluxo financeiro está negativo em US$ 7,191 Bi e comercial positivo em US$ 10,202 Bi e o fluxo total líquido está positivo em US$ 3,011 Bi.

Os bancos estão com o montante de posições vendidas no mercado à vista de US$ 20,450 Bi, ancoradas parcialmente em linhas de financiamento em moeda estrangeira com recompra concedidas pelo Banco Central do Brasil.

Ontem, claramente houve um equívoco por parte de vários setores, em especial da imprensa, que entenderam que o BC ao anunciar oferta de linhas de financiamento em moeda estrangeira com recompra da ordem de US$ 3,0 Bi, na próxima sexta feira, estaria intervindo no mercado face à alta do preço da moeda americana, mas, em realidade, a operação será somente uma rolagem de posição vincenda em abril, nada mais do que isto.

Não há evidências de pressão de saída de recursos do país e o BC, sabidamente, tem conhecimento que o movimento que aprecia o preço do dólar frente ao real é puramente especulativo, como também sabe que não há fundamentos para que isto ocorra, a não ser a oportunidade das tensões políticas, e não há sustentabilidade.

Contudo, é notório que perdura a retração dos investidores estrangeiros em se direcionar para o Brasil, mas não é improvável que possa vir a ser incrementado, com a predominância do ambiente político conflituoso no país, movimento de saída de investimentos estrangeiros do país, movimento inverso às expectativas.

Neste ambiente absolutamente nefasto e obscuro com o qual convive o embate político no país, afetando direta e negativamente as expectativas em torno da visão prospectiva do seu futuro imediato, é absolutamente impossível haver projeções ou previsões de comportamentos dos preços dos ativos no mercado financeiro.

A volatilidade nos preços e indicadores do mercado financeiro deverá continuar sendo uma constante até que haja arrefecimento do embate político e ocorra o ordenamento em torno do que é mais importante para o país.

É o “random walk”, o preço de ontem agregando as repercussões dos fatos novos de hoje.

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