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Sidnei Nehme: decisão do Federal Reserve sinaliza que crise pode ser maior ainda

04 mar 2020, 9:49 - atualizado em 04 mar 2020, 9:49
Federal Reserve
O grau de incerteza ainda é crescente na economia mundial e Fed tem uma visão negativa, observa o colunista (Imagem: Facebook/Board of Governors of the Federal Reserve System)

Assim sendo todo o comportamento dos ativos do mercado financeiro nacional e estrangeiro apontam números para o momento presente, sem que seja possível vislumbrarem-se tendências efetivas em perspectiva, mas denotando percepções díspares, assimétricas em relação ao “status quo”.

O grau de incerteza ainda é crescente na economia mundial, o Federal Reserve (FED), seguramente, tem uma percepção negativa e de preocupação maior do que vem sendo expressada, visto que sua ação foi pontual e expressiva.

Há movimentos defensivos e corretivos para atenuar os impactos da crise que assola a economia global, agora por conta do vírus coronavírus que interfere nas decisões e mutila perspectivas retardando decisões mais contundentes e todos se preparam para enfrentar o imponderável.

O mais relevante é preservar o “status quo” e buscar preservar ao máximo as projeções realizadas para a atividade econômica. Desta forma, economias que “estavam andando” buscam continuar a evolução provavelmente em ritmo menor, mas mantendo-os e para tanto tomam medidas de suporte, e isto foi feito pelo FED.

Deve-se entender que nesta decisão está contida uma advertência de que a crise poderá ser maior do que se está imaginando ou percebendo, esta nos parece a leitura correta e em linha com a reação do mercado financeiro americano.

Com esta medida o FED busca fragilizar ou conter a valorização do dólar frente às moedas fortes tornando o produto americano mais competitivo no comércio exterior e mantendo o ritmo interno da sua atividade econômica dinâmico e proporcionando recursos financeiros com custos mais favoráveis na economia e, em tese, visa ter repercussão no mercado americano focando preservar emprego, consumo e renda.

Com esta medida o FED busca fragilizar ou conter a valorização do dólar frente às moedas fortes (Imagem: Reuters/Shannon Stapleton)

O Brasil tem buscado praticar algo semelhante a esta lição, contudo o país “está parado”, e o contexto é absolutamente outro, e preservar o “status quo” é preservar a estagnação.

Até parece que o receituário americano seja o que o Brasil está querendo praticar, mas há uma expressiva diferença sobre a que estado da economia se aplica, e o Brasil primeiro precisa fazer uma longa lição de casa para chegar numa situação que o permita “andar” para então ter atitudes alinhadas a esta estratégia.

O que acontece por aqui é que se tenta “na marra” dar condições com juro baixo e câmbio alto estímulo para uma economia absolutamente inapetente e carente de quase tudo estruturalmente e onde depois do otimismo exacerbado cresce a predominância da falta de confiança e insegurança em torno desta estratégia,

Brasil primeiro precisa fazer uma longa lição de casa para chegar numa situação que o permita “andar” (Imagem: Pixabay)

São roupagens similares, mas manequins extremamente diferentes.

Os países emergentes são economicamente os que mais sofrem no quadro atual, pois sem ter um horizonte convincente em perspectiva a partir do “status quo” de economias fragilizadas, acabam não atraindo capitais estrangeiros.

Os movimentos centrados na visão de curto prazo promovem hilários movimentos, como as bolsas americanas caírem com um corte expressivo do juro americano de 0,50% quando seria razoável repercutirem com alta, mas, e este é um ponto relevante, denotam a percepção de que a crise com o coronavírus deve ser maior do que a percepção imediata que emana da intempestiva decisão do FED.

Na contra ponta, sem fundamentos, a nossa Bovespa com a economia brasileira aos frangalhos reage de forma irracional recuperando-se como se o benefício favorecesse o Brasil de imediato. Naturalmente, foi uma reação oportunista sem fundamentos, por isso insustentável.

O dólar que se esperava se valorizasse frente às moedas fortes acaba sustentando discreta desvalorização, provavelmente com a percepção de que a crise seja maior do que percebida face à decisão do FED, e então cai discretamente e o preço no Brasil deu uma oscilada para baixo mais pelo vício quando o FED corta juro e logo retomou a realidade e voltou a depreciar o real, quando percebeu que nem nos Estados Unidos ocorreu a valorização do dólar.

Por aqui já se clama por novo corte na SELIC, e é bem possível que ocorra, mas não acreditamos que nem o câmbio alto e nem o juro baixo criarão perspectivas factíveis e motivadoras, pois a visão é absolutamente centrada no curto, curtíssimo prazo.

Já se clama um novo corte da Selic (Imagem: Flickr/Banco Central)

Até quando? Esta é a resposta impossível neste momento, e já há organismos internacionais revisando a projeção do nosso PIB para 2020 para 1,5%!