Sidnei Nehme: Contraditórios, carência de fundamentos sólidos e política podem afetar 2018
Por Sidnei Moura Nehme, economista e diretor executivo da NGO
Há muito otimismo nas análises sobre as perspectivas para o ano de 2018, principalmente quando emanadas de setores ligados ao mercado financeiro, mas é preciso ter um grau maior de acuidade e sensatez.
O ano de 2017 pode ser daqueles que, a exemplo do já ocorrido no passado, deixa a sensação de que não acabou tamanho o enorme volume de incertezas que está deixando para 2018, e que, nem sempre são devidamente pontuados nas análises.
Devemos considerar que a inflação brasileira real e efetiva está muito distante da apurada pelo mercado financeiro e expressada via Boletim FOCUS do BC, algo como 2,78%, absolutamente descaracterizada frente a realidade com a qual convive a população brasileira.
Da mesma forma, o preço do dólar no Brasil está desalinhado com a realidade de um país detentor da magnitude do déficit fiscal atual e ainda sem perspectivas de solução confiável.
Destaca-se muito o desempenho da balança comercial no ano no entorno de US$ 65,0 Bi sem avaliar que com a economia fragilizada o volume de importações como insumo ou como investimento ficou abaixo do normal, porém saiu do país no quesito financeiro US$ 40,382 Bi e o saldo atual da conta movimento de câmbio expressa saldo de tão somente US$ US$ 7,196 Bi, havendo a ser consumado acréscimo de mais US$ 11,923 Bi, diferença entre exportações e importações com câmbio a ser contratado, o que eleva a perspectiva para próximos US$ 19,0 Bi, devendo ainda considerar-se o volume financeiro que for registrado na quinzena final deste mês de dezembro.
Importante observar que o país detinha em dezembro/2016 reservas cambiais de US$ 374,9 Bi e até a 1ª quinzena de dezembro/2017 registra US$ 380,8 Bi, o que deixa claro e atenua a empolgação com o saldo da balança comercial.
Ademais, os bancos vêm operando com posições vendidas explícitas, data base 15/12, de US$ 13,9 Bi, salvo o volume que, além disto, está sendo financiado com operações de venda e compra casadas pelo BC e a oferta de swaps.
Há uma relevante intervenção do BC na formação da taxa cambial do mercado, e se considerarmos o montante exposto de posições vendidas dos bancos da ordem de US$ 13,9 Bi frente a um saldo líquido possível da conta movimento de câmbio de US$ 19,0 Bi, o saldo agregado pelo país em 2017 é bastante discreto.
Portanto, não se pode ficar focado somente no saldo da balança comercial, deve ser observado o todo considerando que no próximo ano os indicativos sugerem uma safra 9,5% menor, e, por outro lado, como salienta o WSJ (The Wall Street Journal), o dólar deve ter forte alta no mercado internacional a com repatriação de capitais aos Estados Unidos com o programa de repatriação de fundos das empresas americanas, que coloca como possível o montante de US$ 400,0 Bi que as companhias americanas têm fora dos Estados Unidos.
A matéria do WSJ analisa o impacto que a decisão do governo Donald Trump de fixar uma taxa de 8% a 15,5% sobre os capitais de empresas americanas que queiram repatriá-los pode ter sobre o valor do dólar em relação a outras moedas, e, naturalmente os impactos serão maiores sobre as moedas dos países emergentes.
Importante destacar de que já há rumores de que a Rússia avalia medida semelhante o que poderá tornar o impacto no mercado internacional ainda mais intenso.
Além disto, a economia americana dá sinais de retomada mais intensa o que poderá catalisar os investimentos internacionais, também em detrimento dos mercados emergentes.
Estes aspectos não têm sido bem considerados nas análises prospectivas que vem sendo disponibilizadas.
Afora isto, se propaga muito que o consumo das famílias deve puxar a economia, como aconteceu em 2017, mas o Índice de Confiança do Consumidor apurado pela FGV apontando ligeira queda em dezembro pode ser um indicativo relevante que as famílias podem estar mais cautelosas, visto que o nível de endividamento ainda é relevante, o que pode ser um fator limitativo ao consumo.
A questão do desemprego ainda é altamente preocupante no país, não sendo correto admitir-se que a reforma trabalhista seja um impulsionador, como tem sido enfatizado pelo governo, pois o ponto de alavancagem é o crescimento da economia, sem o que a demanda por mão de obra não reage adequadamente.
O governo precisa da reforma da previdência, justa porque em sua ênfase maior combate os privilégios, mas a postergação para fevereiro representou uma expressiva derrota, e, a perda de apoio pode se intensificar com o lançamento prematuro de candidaturas de integrantes do governo como o Ministro Meirelles e até as insinuações do próprio Presidente Temer que pudesse se colocar como candidato. Atitudes como estas fora do tempo e do contexto solapam os apoios políticos, pois a política passa a prevalecer e contaminar o debate.
As medidas provisórias fundamentais, também, para o equilíbrio fiscal não lograram sucesso no seu tempo e deixaram a sensação de que serão altamente prejudicadas em seus propósitos pelo clima político, sendo difícil a retomada do debate.
A política tende a ser o centro das discussões e debates ao longo do ano, em detrimento dos interesses econômicos e o acirramento da disputa prematura pode tornar 2018 um ano bem diferente dos prognósticos.
Haverá o julgamento do ex-Presidente Lula logo no 1º mês de ano, e as pesquisas indicam que a aderência a sua candidatura vem crescendo e a rejeição diminuindo, o que pode ser bem desestabilizador por acirrar ânimos de forma intensa.
Embora posturas visionárias projetem cenários excelentes, na realidade desejáveis, não há fundamentos sólidos na economia brasileira para dar suporte a tudo que se propaga de forma tão otimista, o país está repleto de incertezas e vulnerabilidades, podendo inclusive sofrer um “downgrade” das agências de rating, o que seria lamentável.
Portanto, no nosso entender há absoluta necessidade de prudência e sensatez, pois há riscos relevantes na trajetória do país em 2018 e os impactos poderão ser relevantes afetando amplamente as projeções vigentes.
Bovespa, câmbio e juros poderão reverter as expectativas presentes, sendo necessário que se monitore muito o cotidiano de 2018, projeções naturalmente devem ser considerados anseios neste momento.