Sidnei Nehme: choque de realidade no mercado, retrazendo à baila a grave crise do coronavírus
A percepção mais recente do comportamento do mercado financeiro global é de que a retomada das atividades da economia já superaram os problemas da grave crise da pandemia do coronavírus.
De repente, parece que, após este lapso de distração, ocorre uma mudança e as atenções retomam visão à dura realidade de que nada está resolvido em relação à superação efetiva dos efeitos da grave crise, que tem sinais de forte resistência e reinício de novo ciclo em algumas das principais economias globais.
Esta visão mais cética impacta no comportamento dos inúmeros segmentos do mercado financeiro e provoca, em alguns momentos, intensa volatilidade e em outros momentos forte comportamento defensivo, que desta forma valoriza o dólar como “porto seguro” e acentua a percepção de risco, em especial em relação aos países emergentes, depreciando suas moedas e impactando negativamente no segmento acionário.
Então ocorre a volatilidade no câmbio que tem revelado intensificação quando confrontada com cenários antecedentes, e isto é natural dada a insegurança e o grau de incertezas, donde se conclui ser necessário intervenção mais “cirúrgica” dos Bancos Centrais, mais incisivas e precisas e menos previsíveis com anúncios prévios.
Toda disfuncionalidade percebida deve sofrer a intervenção do Banco Central do Brasil, no dia no ato, provocando a percepção dos players do mercado de que a autoridade está atenta e presente, suprimindo o hábito inadequado para o mercado de câmbio de pré-avisar qual será a ação ou de emitir sinalizações tipo alerta.
A previsibilidade não é adequada para o mercado de câmbio de parte da autoridade monetária.
Em câmbio, se faz e depois se explica, e nos parece a forma mais correta de mitigar a intensidade da volatilidade, em especial a partir do mercado futuro que no Brasil é o efetivo formador da taxa cambial, refletida na irônica definição predominante de que no mercado de câmbio brasileiro “o rabo é que balança o cachorro”.
É relevante que ocorra a retomada da percepção de que a crise da pandemia do coronavírus está presente, sem nunca ter arrefecido a intensidade no Brasil e que em grandes centros e grandes economias está presente e redinamizando sua impetuosidade, sendo mesmo uma renovada ameaça à retomada das atividades.
No Brasil a ansiedade é grandiosa e a dicotomia economia e saúde quase insuperável e sem convergência nas ações que tendem a ocorrer de forma desarmoniosa e até inconsequente, visto que a grave crise está em evolução tendo superado os drástico número de 50 mil mortes, havendo previsões de 100 mil até julho e de 166 mil até outubro, com uma visão de que há pelo menos o triplo de infectados em relação aos números divulgados.
Numa visão mais cética é difícil imaginar-se superação ainda no segundo semestre e iniciativa sustentável de retomada.
O governo brasileiro não detém recursos para atender suplementarmente às demandas da população carente de renda, e que poderá se tornar também mais carente de emprego na sequência.
Muito se fala em recuperação da economia em V, mas não estamos simplesmente num “stop and go”, onde tudo será retomado pós pandemia ao nível do que estava, o Brasil será, certamente, um país com população mais carente do que antes, sem renda e sem poupança e haverá, sem dúvida, um novo cenário estrutural para demanda da mão de obra, então, o desemprego tende a ser maior.
O Brasil, lato sensu, continua sem atratividade para grandes fluxos de recursos externos, há grande morosidade nas reformas e no programa de privatizações, mas por outro lado terá menor volume de saída de recursos estrangeiros.
O RIT divulgado pelo governo ao revisar o déficit em transações correntes de US$ 40,0 Bi para US$ 13,0 Bi sancionou esta percepção, mas por outro lado não interessa ao governo que o câmbio seja desvalorizado, pois é o único fator restante para suportar as exportações do agronegócio e alguma atração não expressiva para investimentos em conta capital no país e proteger a indústria nacional com o encarecimento do importador.
Não verificamos a tendência de movimentos estressantes para a moeda americana no nosso mercado, por isso estimamos o comportamento do seu preço entre R$ 5,00 a R$ 5,50, sofrendo reflexos do desempenho da moeda americana no mercado global.
Na nossa visão prospectiva consideramos que o ambiente na questão cambial será mais adverso, com influência da pandemia do coronavírus, face à que entendemos que deva se situar no entorno de R$ 5,50, contudo sem risco de avançar novamente até R$ 6,00.