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Senado: especialistas, empresas e governo debatem Lei Geral das Teles

08 maio 2018, 20:27 - atualizado em 08 maio 2018, 20:27

Especialistas, gestores do governo, empresas e entidades da sociedade civil apresentaram opiniões divergentes sobre a proposta de reforma da Lei Geral de Telecomunicações (LGT, nº 9417/1997), em tramitação no Senado Federal. O debate ocorreu hoje (8) em audiência pública da Comissão de Ciência e Tecnologia convocada para discutir a matéria, o Projeto de Lei da Câmara (PLC) 79, de 2017. O texto havia sido aprovado nas comissões da Casa sem passar pelo plenário (sistema chamado de “caráter terminativo”) no ano passado, mas uma decisão do Supremo Tribunal Federal determinou o retorno do projeto ao Senado para análise e votação pelo conjunto dos parlamentares.

Representantes de empresas defenderam a necessidade de aprovação da medida como forma de reduzir obrigações e facilitar investimentos no setor, abrindo espaço para ampliar o alcance das redes e, consequentemente, o acesso à internet. Já organizações de defesa do consumidor e da sociedade civil apontaram problemas que consideram graves na matéria, como a entrega de mais de R$ 70 bilhões em infraestrutura que pertence ao Estado e a retirada da legislação de obrigações consideradas importantes para serviços essenciais de telecomunicações, e que poderiam ser aplicadas à banda larga.

Mudanças

O PLC 79/2017 traz diversas mudanças na Lei Geral de Telecomunicações (LGT). Hoje, a legislação prevê que serviços considerados essenciais devem estar submetidos a determinadas obrigações, como universalização (chegar a todos), continuidade (não haver interrupção) e preços acessíveis. A essas exigências dá-se o nome de regime público, sistema que foi aplicado somente à telefonia fixa. Em razão da privatização do Sistema Telebrás nos anos 1990, o regime público incluiu também a obrigação das concessionárias (empresas que pagaram pelo direito de explorar a redes por 25 anos) retornarem a infraestrutura ao governo no final do contrato, que passou a ser chamada de “bens reversíveis”.

Conforme o PLC, esses bens não voltariam para o Estado, mas seriam entregues às concessionárias (Telefônica, Oi e Embratel) em troca de metas de investimento em redes de banda larga. A proposta também permite que serviços essenciais não precisem mais ser prestados em regime público, possibilitando na prática que eles não sejam submetidos a obrigações de universalização e continuidade. Além disso, a proposta abre possibilidade de que empresas com autorização para exploração de radiofrequências (faixas usadas em serviços como telefonia e banda larga móveis) possam comercializar este espaço. Atualmente, isso não é permitido.

Redução de obrigações

Na avaliação do governo federal o projeto faz uma revisão eficaz do marco regulatório ao trazer a legislação para os tempos de hoje. Segundo o secretário de Telecomunicações do Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações, André Muller, a retirada das obrigações e a transação das redes seria mais adequada porque não haveria interesse no mercado em novas concessões de telefonia fixa. “A inviabilidade de uma nova concessão dá-se pelo fato de que muitas já têm autorização para isso, não haveria interesse comercial, haja vista o número de obrigações. Já hoje metade dos acessos de telefonia fixa são das empresas não concessionárias”, disse.

A advogada Flávia Lefévre, do Instituto Proteste e da Coalizão Direitos na Rede, criticou a eliminação do regime público para serviços essenciais e a consequente retirada das obrigações decorrentes dele. Segundo ela, essas mudanças desrespeitam a legislação brasileira. “A Constituição Federal coloca na responsabilidade do Estado a garantia dos serviços de Telecomunicações. O Marco Civil da Internet [Lei No 12965/2014] tornou o serviço de acesso à Internet essencial e universal. A infraestrutura de telecomunicações que serve de suporte se tornou, portanto, de caráter essencial, ainda que isto não esteja expresso na Lei Geral de Telecomunicações”, destacou.

Valores

Uma das polêmicas relacionadas ao projeto é o valor dos chamados bens reversíveis (a infraestrutura sob controle das operadoras sob a forma de concessão). Segundo informações das empresas repassadas à Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) mencionadas na audiência, o patrimônio chegaria a R$ 105 bilhões. No entanto, não houve auditoria nem da Anatel nem do Tribunal de Contas da União (TCU) sobre esses ativos.

O representante do TCU Ivan Pacheco afirmou que “hoje ninguém tem estes números”. “A Anatel ainda tem uma série de deficiência sobre o controle dos bens reversíveis. Então há uma dificuldade grande em chegar a este valor”. Pacheco apontou que há falta de dados, acompanhamento deficiente do desempenho econômico das concessionárias, informações incompletas sobre os bens reversíveis e problemas na fiscalização da Anatel.

Ele citou como exemplo o caso da Oi, principal concessionária de telefonia fixa, com atuação em 26 unidades da Federação (a exceção é São Paulo, onde a responsável é a Telefônica). O representante do TCU questionou se a empresa teria condições de fazer a migração indenizando os bens reversíveis em investimentos neste momento, em que se encontra em recuperação judicial, com bilhões em dívidas.

O senador Otto Alencar (PSD-BA) defendeu uma nova avaliação, após um levantamento dos valores, antes de aprovar o projeto. “O número dado à época era de R$ 20 bilhões. Mas já que estamos com oportunidade de levantar isso, o mais importante é chegar ao número real do patrimônio que está em discussão neste momento”, comentou Alencar.

Já o presidente da Anatel, Juarez Quadros, defendeu que a apuração do valor deveria se dar posteriormente à votação. “Depois da aprovação da Lei, teremos decretos, um plano estrutural de redes e serão definidas as metodologias. Os preços serão levantados por consultorias independentes. Aí se chega ao valor econômico, mas para isso precisaríamos da Lei”, pontuou.

Continuidade

Em razão da ordem do dia no plenário do Senado, a audiência foi interrompida. Representantes de entidades empresariais e de organizações em defesa de direitos dos usuários vão falar na segunda etapa, marcada para a próxima semana.

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