Sem OMC ativa, sem disposição política do Brasil e pouco impacto, subsídios dos EUA ao agro correm solto
Sob o cobertor da emergência da pandemia e sob a esfacelada Organização Mundial de Comércio (OMC), os produtores dos Estados Unidos estão recebendo ajuda bilionária e que caberia contestação por parte do Brasil em relação à soja e milho. Mas com dificuldades em termos técnicos e pela pouca probabilidade política, diante da total aproximação do governo Bolsonaro com a Casa Branca.
Do total de US$ 6,229 bilhões despejados pela Agência de Serviços Agrícolas (FSA, da sigla em inglês) desde 26 de maio – “completamente fora do normal”, como classifica o ex-negociador brasileiro e consultor Pedro de Camargo Neto -, soja, milho e algodão ficaram com US$ 1,642 bilhão.
“Os subsídios estão ilegais, porém seria preciso também mostrar que causam danos ao Brasil. O que não ocorre agora”, avalia ele, que defendeu o País na vitória na OMC contra o subsídio americano ao algodão, entre outras frentes enquanto secretário de Produção e Comercialização, do Mapa, ou atuando para entidades de classes.
As condições atípicas do fluxo de negócios com commodities este ano não desfavorecem o Brasil.
Se a China e os Estados Unidos estivessem gozando plenamente do acordo da fase 1, já negociada, portanto sem arestas que volta e meia entraram no ambiente, certamente os subsídios dados pelo governo Trump seriam prejudiciais na soja. Mas a China entrou comprando no mercado do país há pouco tempo, praticamente quando o disponível brasileiro já havia escasseado, completa Camargo Neto, até recentemente ex-presidente e vice da Sociedade Rural Brasileira (SRB).
No caso do milho, o impacto poderia ser mais sentido no âmbito do etanol importado dos Estados Unidos. Com milho mais subsidiado chegando às destilarias e as cotas favoráveis, sem impostos, liberadas pelo Brasil, a entrada concorreria com o etanol nacional. Só que a crise da pandemia deslocou o mercado de consumo nacional, tanto quanto o dos Estados Unidos, além da queda nos preços.
Além do balanço de oferta e demanda não apresentar danos imediatos ao Brasil, Pedro de Camargo Neto lembra que os compromissos multilaterais da OMC foram escanteados, especialmente desde o início das disputas comerciais entre os dois gigantes, que ainda agora continuam também recheadas de geopolítica. O ex-diretor-geral, o diplomata brasileiro Roberto Azevêdo, deixou o cargo recentemente inclusive alegando estas razões.
A ajuda da FSA, órgão do Departamento de Agricultura (USDA), chega também aos produtores de não commodities (hortifrutigranjeiros e outros), R$ 186 milhões; de bovinos, suínos e ovinos, US$ 3,15 bilhões; e de lácteos, US$ 1,25 bilhão.
No total, foram 442 mil pedidos atendidos, de um total de 568 mil produtores fazendo a solicitação até o final da semana passada.