Sem máscara, um pouco de álcool gel e viagra: um entregador na São Paulo em quarentena
Poucas pessoas se aventuram pelas ruas de São Paulo nestes dias, mas Erik Thiago disse que só deixará de fazer entregas de bicicleta quando ficar doente ou as autoridades o forçarem a ficar em casa.
Enquanto outros da cidade de 12 milhões de habitantes permanecem em casa para frear o coronavírus, o entregador de 22 anos pedala uma hora da comunidade em que mora na periferia do sul da metrópole para levar mantimentos, remédios e tudo o que moradores de bairros de classe alta pedirem.
Sem máscara e só com um frasco pequeno de álcool em gel para usar entre as entregas, ele sabe que está especialmente exposto – mas quer continuar trabalhando para guardar um dinheirinho para “quando estiver realmente grave a coisa”.
A maior cidade do Brasil, que concentra a maioria das 92 mortes causadas pelo coronavírus no país, praticamente parou.
São pessoas como Thiago, normalmente jovens pobres, que permitem que o restante permaneça com as portas fechadas.
Thiago é uma das 200 mil pessoas da América Latina que fazem entregas para o aplicativo Rappi. A empresa não quis detalhar seus números para o Brasil.
Além de ser um aplicativo de entregas para refeições de restaurantes, o Rappi também dá aos entregadores listas de compras para que peguem itens nas prateleiras e um cartão de débito financiado pelos clientes para fazerem pagamentos.
Durante as restrições determinadas na cidade, as encomendas de Thiago mudaram de fast-food food para produtos não perecíveis. Um cliente pediu 70 latas de Coca-Cola.
Na quinta-feira, Thiago entregou alvejante, um pacote de linguiças e xampu antibactericida para animais de estimação, entre outras coisas.
Às vezes as encomendas são mais delicadas: ele comprou o remédio para disfunção erétil Viagra a um cliente particularmente agradecido.
O trabalho de Thiago é considerado pelo governo estadual como “essencial”, mas isso não ajuda muito sua renda – em um dia bom, ele volta para casa com 100 reais. Mas a demanda varia dramaticamente.
Ao longo das cinco horas em que a Reuters o acompanhou na quinta-feira, ele lucrou 31 reais, a maioria disso em gorjetas.
“Antes da epidemia ninguém dava gorjetas”, disse Thiago, que usava uma camiseta preta e shorts listrados. Entre as sobrancelhas se vê uma cicatriz de quando um carro o atingiu no ano passado.
Ele espera que o vírus traga algum reconhecimento para sua categoria de trabalho. “Neste momento eles olham para nós como para viciados de rua”, disse.