Selic em queda provoca ‘guerra fria’ entre Banco Central e Lula; o que será essa crise?
“Tudo que é bom dura pouco”. A tão falada taxa Selic segue no olho do furacão. Sendo assim, gosto de começar meus textos com essas frases clichês, e essa é a frase perfeita nesta reta final de março.
Podemos dizer que a Super Quarta, dia em que temos definição dos juros tanto nos Estados Unidos quanto no Brasil, se comportou mais como uma sexta-feira 13 para o relacionamento entre Banco Central e governo federal. Culpa da da taxa Selic.
Nos EUA, como era esperado depois da crise do setor bancário, o Federal Reserve (Fed) reduziu o ritmo na alta dos juros.
Se antes Jerome Powell falava em acelerar a taxa americana para conter a inflação, que continua alta com a força do mercado de trabalho americano, a falência de dois bancos e o socorro a um terceiro mudaram, pelo menos por enquanto, a posição do BC americano.
A alta na última quarta-feira foi de 0,25 ponto percentual, levando a taxa para o intervalo entre 4,75% e 5% ao ano. Powell também afirmou que deve haver pelo menos mais um aumento dos juros em 2023. Mas será isso o suficiente para brecar o avanço da inflação em solo americano?
Não lembro de ter visto na história econômica alguma nação que tenha conseguido sair de uma situação de inflação alta sem enfrentar algum tipo de recessão.
E quando colocamos na balança o que está acontecendo EUA, que inundou durante anos sua economia com dinheiro a juros baixíssimos, fica difícil acreditar numa recuperação tranquila, no tão esperado pouso suave.
Jerome Powell sabe disso e agora se encontra numa encruzilhada: reduz de vez o ritmo dos juros e torce por uma melhora espontânea nos indicadores de inflação, ou continua aumentando a taxa, forçando uma possível recessão.
Não é uma situação simples, e dificilmente a maior economia do mundo vai conseguir controlar a desvalorização do dólar sem entrar num cenário recessivo.
Isso foi o suficiente para agitar os mercados mundiais.
E aí voltamos para o Brasil…
Por aqui, o Copom manteve a taxa Selic em 13,75%, o que voltou a estremecer as relações entre Banco Central e governo federal. O presidente Lula voltou a fazer reclamações contundentes contra Roberto Campos Neto, presidente do BC.
Até parte do mercado achou que o Copom poderia baixar pelo menos 0,25 ponto percentual para manter a bandeira branca estendida entre os poderes. Mas, a meu ver, nada é tão simples assim.
Eu até acreditava numa queda da Selic no começo da semana. Mas quando o governo adiou a divulgação de seu novo arcabouçou fiscal para depois da viagem de Lula à China, ficou claro para mim e grande parte do mercado que o BC não iria mexer na taxa.
E, no meu ponto de vista, por mais que a taxa brasileira esteja muito alta, o Copom agiu de maneira coerente.
Enquanto não ficar claro como o governo pretende manter o equilíbrio nas contas públicas, dificilmente o Banco Central vai tomar alguma atitude em relação à Selic. E não tenham dúvidas que a equipe econômica chefiada pelo Ministro da Fazenda Fernando Haddad sabe disso.
Vejo nessa discussão toda mais uma manobra na tentativa de enfraquecimento de Campos Neto, a quem Lula visivelmente não nutre nenhuma simpatia. Além do mais, ele já deixou claro que não gosta da ideia do Banco Central independente.
Selic elevada, turbulência na bolsa
Fato é que essa celeuma trouxe mais turbulência para o já agitado mercado brasileiro, com a bolsa brasileira engatando sua 5ª semana consecutiva de queda, caindo 3,09% no período, e fechando abaixo dos 99 mil pontos.
Os próximos dias devem continuar quentes, já que o comunicado do Copom foi duro, mostrando preocupação com a inflação nos prazos mais longos e não descartando, inclusive, a retomada do ciclo de alta da Selic.
O próprio ministro Haddad disse ser preocupante o tom do comunicado, afirmando que a postura do BC pode comprometer o resultado fiscal do país.
Este é o cenário perfeito para a retomada da “guerra fria” entre BC e Governo Federal, sem deixar uma expectativa de acordo entre as partes. O que é péssimo para o mercado financeiro brasileiro como um todo.
Resta agora ao investidor continuar protegendo sua carteira com investimentos mais conservadores e defensivos, já que está difícil de se posicionar na ala mais agressiva da renda variável com um cenário tão incerto pela frente.
Se a bolsa já é um desafio para iniciantes mesmo em momentos mais favoráveis da economia, imagine então num cenário de possível recessão global e rachas entre os pilares de sustentação da economia do país? Pois é.
Enfim, vamos esperar a volta do presidente Lula da China para sabermos se o novo plano para controlar a situação fiscal do país vai trazer algum alívio para o mercado e, principalmente para a população. Caso contrário, o ano deverá provavelmente será bem mais complexo do que está até agora.
Boa sorte a todos.