Selic a 10,50%: Por que o Banco Central pisou no freio dos juros?
Assim como esperado por parte do mercado, o Comitê de Política Monetária (Copom) pisou no freio. O Banco Central reduziu a Selic em 0,25 ponto percentual, levando a taxa básica de juros para o patamar de 10,50% ao ano.
O corte mais cauteloso vem depois de seis reajustes de 0,50 pp e o comunicado da autoridade monetária deixa bem claro o motivo: o cenário econômico brasileiro e global mudou.
A preocupação é tanta que o Copom ignorou as projeções da reunião passada, quando foi sinalizado que teria, pelo menos, mais um corte de 0,50 pp.
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“Considerando a evolução do processo de desinflação, os cenários avaliados, o balanço de riscos e o amplo conjunto de informações disponíveis, o Copom decidiu reduzir a taxa básica de juros em 0,25 ponto percentual, para 10,50% a.a., e entende que essa decisão é compatível com a estratégia de convergência da inflação para o redor da meta ao longo do horizonte relevante, que inclui o ano de 2025”, diz o comunicado.
O Banco Central também aproveitou para destacar que a conjuntura atual é caracterizada por um estágio do processo desinflacionário que tende a ser mais lento. Além disso, as expectativas de inflação estão desancoradas e o cenário global é desafiador. Com isso, a condução da política monetária demanda serenidade e moderação.
“A política monetária deve se manter contracionista até que se consolide não apenas o processo de desinflação como também a ancoragem das expectativas em torno de suas metas. O Comitê também reforça, com especial ênfase, que a extensão e a adequação de ajustes futuros na taxa de juros serão ditadas pelo firme compromisso de convergência da inflação à meta”, completa.
Ou seja, cortes mais robustos de 0,50 pp para cima estão fora do radar do Copom.
Selic a 10,50%: Entenda o comunicado do Copom
Cenário internacional pesando
Segundo o comunicado, ambiente externo se mostra mais adverso, em função da incerteza elevada e persistente referente ao início da flexibilização de política monetária nos Estados Unidos.
Vale lembrar que na semana passada, o Federal Reserve manteve a taxa de juros entre 5,25% e 5,50% pela sexta reunião consecutiva. Trata-se do maior nível em 22 anos.
“Os bancos centrais das principais economias permanecem determinados em promover a convergência das taxas de inflação para suas metas em um ambiente marcado por pressões nos mercados de trabalho”, diz o texto.
Além disso, também há dúvidas sobre a velocidade com que se observará a queda da inflação de forma sustentada em diversos países. Com isso, o Copom avalia que o cenário segue exigindo cautela por parte de países emergentes.
Economia brasileira resiliente
Em relação ao cenário doméstico, o Copom destaca que o conjunto dos indicadores de atividade econômica e do mercado de trabalho tem apresentado maior dinamismo do que o esperado.
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Outro ponto é a inflação. Por mais que o indicador cheio esteja mantendo a trajetória de queda, as medidas de inflação subjacente se situam acima da meta.
As expectativas de inflação para 2024 e 2025 apuradas pelo Relatório Focus estão torno de 3,7% e 3,6%, respectivamente. Nas projeções do Banco Central, a inflação está em 3,8% em 2024 e 3,3% em 2025.
Entre os fatores riscos de alta para o cenário inflacionário e as expectativas de inflação estão:
- uma maior persistência das pressões inflacionárias globais;
- uma maior resiliência na inflação de serviços do que a projetada em função de um hiato do produto mais apertado.
Já entre os riscos de baixa, ressaltam-se:
- uma desaceleração da atividade econômica global mais acentuada do que a projetada;
- os impactos do aperto monetário sincronizado sobre a desinflação global se mostrarem mais fortes do que o esperado.
Risco fiscal volta a preocupar
Também está no radar a política fiscal e seus impactos sobre a política monetária.
Vale lembrar que, em abril, o ministro Fernando Haddad confirmou mudanças na meta fiscal de ano que vem. O projeto da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) de 2025, encaminhado ao Congresso, prevê déficit primário zero.
No entanto, as regras do arcabouço fiscal, aprovado no ano passado, determinavam um superávit de 0,5% do Produto Interno Bruto (PIB) em 2025, com intervalo de tolerância de 0,25 ponto percentual do PIB para cima ou para baixo. Além disso, a meta de 2026 foi alterada de superávit de 1% para 0,25% do PIB.
“O Comitê reafirma que uma política fiscal crível e comprometida com a sustentabilidade da dívida contribui para a ancoragem das expectativas de inflação e para a redução dos prêmios de risco dos ativos financeiros, consequentemente impactando a política monetária”, diz o comunicado.
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Racha no Banco Central
A decisão do reajuste não foi unânime. Votaram por uma redução de 0,25 pp os seguintes membros do Comitê:
- Roberto de Oliveira Campos Neto (presidente)
- Carolina de Assis Barros
- Diogo Abry Guillen
- Otávio Ribeiro Damaso
- Renato Dias de Brito Gomes
Por outro lado, votaram por uma redução de 0,50 pp os seguintes membros:
- Ailton de Aquino Santos
- Gabriel Muricca Galípolo
- Paulo Picchetti
- Rodrigo Alves Teixeira
Essa divisão não é aleatória. Votaram pelo corte maior justamente os diretores indicados pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o que indica que o mercado pode começar a se preparar para um Banco Central menos contracionista a partir do ano que vem.
O atual presidente e voto de minerva da reunião, Roberto Campos Neto, deixa o cargo em dezembro. Ele e Lula não têm uma relação muito boa, sendo que o governo enxerga que o BC poderia reduzir a Selic mais rápido.