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‘SAF é questão de sobrevivência’: conheça o biocombustível que pode mudar o setor aéreo

29 fev 2024, 17:14 - atualizado em 29 fev 2024, 17:14
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SAF pode ser oportunidade para protagonismo brasileiro, mas dificuldades na produção ainda impedem o combustível de decolar (Imagem: Pixabay)

O combustível sustentável de aviação (SAF, na sigla em inglês) é uma das medidas para que o setor aéreo, responsável por 2% das emissões globais de gases de efeito estufa, consiga alcançar suas metas de descarbonização.

O desafio para o Brasil não é desprezível. O país é signatário da Carbon Offsetting and Reduction Scheme for International Aviation (CORSIA), uma iniciativa da International Civil Aviation Organization (ICAO), agência das Nações Unidas que congrega 193 países e visa à cooperação internacional no setor aéreo.

Alinhado com os objetivos da CORSIA, o Brasil assumiu o compromisso de zerar as emissões líquidas de carbono do setor aéreo até 2050. Ou seja, alcançar o estágio de “net zero”.

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Mas outra data se aproxima: 2027. Até lá, as companhias aéreas devem reduzir as emissões de dióxido de carbono (CO2) em 1% em seus voos domésticos. O objetivo é que em 2037 haja um corte de 10% nas emissões, com aumentos percentuais na redução durante os 10 anos.

A resposta para esse desafio é o SAF, que deve ser misturado ao querosene fóssil para reduzir as emissões de carbono.

SAF é oportunidade de protagonismo brasileiro?

Os combustíveis sustentáveis são a escolha principal para substituir a querosene de aviação (QAV), o combustível fóssil que atualmente é usado pelas aviações brasileira e internacional.

O SAF é uma fonte renovável e pode ser produzido a partir de diferentes matérias-primas, como óleos vegetais, etanol, biomassa, gorduras animais, óleo de cozinha usado e resíduos agrícolas. Dessa forma, a pegada de carbono do produto final é 80% menor que o de derivados do petróleo.

Carlos Eduardo Hammershmidt, vice-presidente do Grupo Potencial e vice-presidente de Relações Institucionais da União Brasileira do Biodiesel e Bioquerosene (Ubrabio), afirma que o Brasil tem “o DNA para a produção de biocombustíveis“, citando a soja e o etanol, matérias-primas para o SAF em abundância no país, como os principais destaques.

“O Brasil vai ser um exportador de SAF, na minha opinião, porque temos todas as matérias-primas em abundância no nosso mercado”, afirma.

Atualmente, o principal problema dos combustíveis sustentáveis são os custos. Em média, o SAF custa quatro vezes mais que o QAV e, para as empresas, esse não é um detalhe: os custos com combustível representam 40% dos gastos das operações do setor aéreo.

Isso acontece principalmente pelo fato de o combustível ainda estar em fase de testes, com uma produção suficiente para atender apenas 0,2% da indústria global, de acordo com a Iata (Associação Internacional de Transporte Aéreo).

Mas algumas iniciativas já existem para elevar a produção. Em agosto de 2023, a Raízen (RAIZ4) certificou seu etanol para participar da produção do combustível sustentável.

Além dela, a Petrobras (PETR4) possui uma meta de produção de 6 mil barris por dia de diesel renovável e o mesmo número para bioQAV, e o Grupo BBF (Brasil BioFuels), fundado em 2008, também possui planos relacionados à sustentabilidade dos combustíveis, com a expectativa de construir uma biorrefinaria na Zona Franca de Manaus.

Para Hammershmidt, da Ubrabio, é possível que o combustível para a aviação se torne mais barato, conforme a produção é estimulada no país, atingindo os patamares do biodiesel atualmente, não pesando para o bolso do consumidor.

Como o governo pode ajudar o setor aéreo a zerar as emissões?

Para além das iniciativas do setor aéreo, diversas instâncias do governo tentam fomentar a indústria de combustíveis verdes.

O projeto de lei (PL) do Combustível do Futuro é uma das ações implementadas para apoiar o segmento, trazendo propostas para a redução de emissões de carbono e instituindo o Programa Nacional de Combustível Sustentável de Aviação (ProBioQAV), que apresenta as metas de redução a partir de 2027.

Para Hammershmidt, da Ubrabio, a atuação do governo com o combustível sustentável de aviação passa pelo apoio à produção, fornecendo segurança aos empresários para facilitar a exportação do produto e fomentar sua distribuição.

“Com esse mercado, nós não podemos voltar atrás. Ou a gente firma uma política interna com resiliência para a produção de biocombustíveis, ou a gente não vira protagonista. Mas, se a gente não virar protagonista, estamos perdendo uma oportunidade grande”, explica.

Companhias aéreas já estão de olho

Apesar de ainda não ser produzido em larga escala, o setor aéreo já trabalha com formas para introduzir o SAF em suas aeronaves.

Em julho do ano passado, uma das aeronaves da Latam, um Airbus A320neo, partiu da França e chegou ao Ceará com um combustível contendo 30% de SAF, obtido por óleo de cozinha, misturado ao querosene.

O objetivo da companhia é que o combustível renovável esteja em 5% de sua frota até 2030. Para 2050, a se alinha à dos compromissos assumidos pelo Brasil na CORSIA: net zero.

A Embraer (EMBR3) também possui modelos em teste que utilizam um combustível 100% sustentável, a Phenom 300E e a Praetor 600.

Outro nome de peso que integra a busca pelas reduções na emissão de carbono é a Gol (GOLL4), que por meio de um sistema denominado book & claim adquire créditos de carbono gerados por outras empresas que utilizam o SAF.

A presidente da Associação Brasileira das Empresas Aéreas (ABEAR), Jurema Monteiro, explica que os investimentos na modernização da frota aérea brasileira fazem com que seja possível reduzir as emissões de carbono, pois motores mais recentes consomem menos combustível e reduzem o efeito das emissões.

“O combustível é o item que mais pesa no custo operacional das empresas, então naturalmente a gente consegue ganhar com custos mais competitivos, e o passageiro pode sentir isso, com uma malha mais eficiente e empresas mais fortalecidas também”, afirma ela.

“O país acaba se beneficiando uma vez que a gente consegue uma melhoria na estrutura e na eficiência operacional do setor como um todo, muito importante para o desenvolvimento econômico do país”, complementa.

Sobre as mudanças para as empresas aéreas, Hammershmidt, da Ubrabio, diz que “elas terão que se adaptar. Não é uma questão de querer, é uma questão de sobrevivência”.

Créditos de carbono também estão no radar

Outra forma de alcançar os objetivos sustentáveis é a partir do mercado de créditos de carbono.

A cada tonelada de CO2 não emitida à atmosfera, um crédito de carbono é gerado e pode ser comprado por um agente que não tenha alcançado suas metas de descarbonização.

A Agência Nacional de Aviação Civil (ANAC) possui uma consulta pública em andamento que exige a compensação do CO2 emitido por empresas aéreas em voos internacionais, prevendo uma multa de R$ 50 por tonelada de emissão não compensada.

Rafael Guazelli, especialista em Direito Empresarial e do Agronegócio, afirma que o principal entrave na questão é a falta de uma regulação do mercado de créditos de carbono, com a necessidade de aprovação da legislação que regula o setor.

Para ele, um projeto de lei que regule o mercado faria com que os empresários recebessem incentivos fiscais para investir no setor, já que as empresas podem ter vantagens financeiras ao realizar projetos no Mecanismo de Desenvolvimento Limpo (MDL).

Monteiro, da Abear, explica que esse é um processo previsto a médio prazo, à medida que ocorre a regulamentação do uso do mercado de carbono.

Para o curto prazo, os investimentos em tecnologia e renovação de frota para que ocorra a descarbonização são as metas, enquanto a longo prazo fica o desenvolvimento de uma política do SAF no Brasil e investimentos em biorrefinarias.

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