Rússia x Ucrânia: Sanções econômicas são forma de evitar guerra nuclear, dizem economistas
Conflito. Guerra. Invasão. Sanções. São essas as quatro palavras que mais marcaram o mundo nas últimas semanas, culminando na chegada do primeiro mês de invasão russa na Ucrânia nesta quinta-feira (24).
O conflito, que já dura mais de 30 dias, deixou mortos e feridos, se tornou uma crise humanitária e foi o culpado por sanções “fora de série” realizadas pelo ocidente.
O principal exemplo são os Estados Unidos, que embargaram o petróleo russo, entre outros bloqueios feitos como uma tentativa de frear o avanço do presidente da Rússia, Vladimir Putin, em território ucraniano.
Outra sanção que afetou duramente a economia russa foi a retirada do país do Swift — que processa as operações financeiras de 11 mil bancos em todo o mundo e é um dos pilares da economia mundial.
Segundo o economista e professor da Faculdade de Economia da Universidade Presbiteriana Mackenzie, Josilmar Cordenonssi, as sanções econômicas acontecem como uma forma de evitar que a situação se torne ainda mais grave.
“As sanções são uma forma de punir a Rússia pela invasão da Ucrânia, como os países da Otan não podem entrar na guerra, por temer uma possível escalada para uma guerra nuclear que pode acabar com o planeta, eles estão evitando o bélico e optaram por um conflito econômico”, afirma.
A Rússia é o país com o maior arsenal nuclear no mundo, segundo a ICAN (Campanha Internacional para a Abolição de Armas Nucleares).
O maior país europeu possui aproximadamente 6,2 mil armas nucleares, que podem ser lançadas de mísseis, submarinos e aeronaves. Em 2020, a Rússia gastou cerca de US$ 8 bilhões para construir e manter suas forças nucleares.
A preocupação, então, não é infundada.
Além disso, para Cordenonssi, antes da guerra na Ucrânia, “nunca se pensou que as sanções econômicas podiam ir tão longe”.
“A Rússia esperava que o ocidente não ia ter uma reação tão forte quando foi em 2014 quando eles anexaram a Crimeia. O Putin fez um cálculo errado nessa ação”, diz. “Na Europa ninguém se sente seguro e chegaram a conclusão de que foi um erro passar a mão na cabeça do Putin depois do que ele fez na Ucrânia. Essa é a arma que eles escolheram [as sanções], e, ao mesmo tempo, oferecer mais armas de verdade para a Ucrânia se defender.”
Qual o impacto disso no mundo?
O primeiro impacto a ser sentido mundialmente, segundo os economistas ouvidos pelo Money Times, está no preço da energia, principalmente na Europa — continente quase que totalmente dependente de energia russa.
“O preço da energia, em geral, subiu. Muitas pessoas na Europa estão pedindo para que o país corte o consumo de gás, mas isso, politicamente, está sendo evitado porque no inverno, principalmente, podem ficar sem aquecimento, e isso é um tema muito sensível”, continua Cordenonssi.
Em seguida, estão as exportações de alimentos, como trigo e milho. Para Cordenonssi, isso pode fragilizar ainda mais economias emergentes e países mais pobres.
“O alimento muito caro coloca em risco muitos regimes e pode fazer com que a população mundial mais vulnerável passe fome”, diz.
O mesmo é apontado por William Eid Junior, professor da Fundação Getúlio Vargas — FGV.
“Final da história: inflação para todo mundo. E ela vem em um momento que estávamos recuperando a economia mundial. Quem é rico, fica mais rico. O pobre sai às compras e a cada dia fica tudo mais caro. E em países como Brasil, Argentina e Egito, o sofrimento é maior ainda”, diz.
Ainda existem os impactos a longo prazo, segundo o economista. Para Cordenonssi, “pela globalização, se pensou que não aconteceriam guerras entre grandes países”.
“Com a atitude de Putin, você começa a ver questionamentos sobre se realmente vale a pena integrar ditaduras e países não-democráticos a um ambiente de comércio livre. Esse é um questionamento até sobre a China”, afirma. “Até que ponto você deveria colocar a China à margem de um sistema livre de comércio?.”
Segundo ele, “o ocidente está vendo que a Rússia deixou de ser confiável” e “mesmo se acabar a guerra, as sanções não vão acabar”.
“E, mesmo se acabarem, muitas pessoas terão receio de investir em países não alinhados ao ocidente. E isso pode afetar a China. A China se beneficia muito do comércio internacional, e ela não pode perder o acesso a isso. E, para continuar no jogo, vão ter que seguir as regras impostas pelo ocidente que, na minha visão, está mais forte do que nunca”, diz.
Inflação, taxas de juros e dólar no Brasil
Mas, para Mauro Rochlin, professor da FGV, os impactos das sanções à Rússia variam de país para país.
“As realidades para os países são diferentes. Feita essa diferenciação, o que a gente está vendo é que os países que exportam matérias-primas, pela alta forte nas commodities, estão tendo um certo ganho por conta das exportações, estão experimentando uma entrada forte de moedas e valorização das moedas locais, é o caso do Brasil — e isso pode ajudar os países que precisam de uma força para combater a inflação”, diz.
Rochlin ainda afirma que, se o dólar continuar em baixa até o final do ano, isso pode ajudar a reduzir as perspectivas para a inflação.
“Esse pode não ser o cenário provável devido às eleições, mas, se de fato o clima ajudar, a gente pode ser beneficiado pelos dois lados, pelo lado da inflação dos alimentos e pelo lado da energia elétrica. Esse movimento de queda forte do dólar está relacionado à Selic. Isso é decisivo para entender a valorização cambial”, afirma.