Rússia x Ucrânia: Entenda a invasão russa e o que se sabe até agora
A madrugada desta quinta-feira (24) começou em alta temperatura, com a Rússia anunciando uma invasão militar à Ucrânia – que, até o momento, já deixou cerca de 60 mortos.
O que se sabe sobre a invasão é que ela começou às 5h da manhã no horário de Kiev, capital ucraniana, e que as tropas russas estão entrando no país por vias áreas, marítimas e terrestres.
Em vídeos divulgados nas redes sociais, é possível ver o uso de mísseis e bombas para os ataques.
O motivo para a invasão ainda é incerto.
Ela pode ser o início de uma guerra na Europa devido às exigências do presidente russo, Vladimir Putin, pelo fim da expansão da Otan para o leste.
Críticos ao governo de Putin, no entanto, também afirmam que a invasão aconteceu por conta de uma necessidade da Rússia em expandir seu território.
Nesta semana, o presidente russo reconheceu os territórios separatistas ucranianos, dando início à especulação de uma provável escalada no conflito, que já dura meses.
Como o conflito começou?
O conflito entre russos e ucranianos não é nada novo em termos históricos.
Até 1991, a Ucrânia fazia parte da União Soviética, quando teve sua independência declarada. Com o colapso da URSS, a união do país foi algo difícil de ser feito, principalmente entre as regiões leste e oeste.
A Ucrânia, então, era o terceiro país com maior poderio de armas atômicas no mundo.
Os EUA e a Rússia trabalharam em conjunto com o país para desnuclearizá-lo, e os ucranianos deram suas armas nucleares para a Rússia em troca de um acordo que prometia a segurança de seus territórios de futuros ataques e invasões russos.
A transição para o capitalismo e para a democracia foi caótica, em especial no leste – o que pode ajudar a explicar a existência de territórios separatistas como os reconhecidos por Putin.
Em 2014, a Crimeia foi ocupada e anexada pela Rússia, logo após uma onda de separatismo que marcou as regiões ao leste da Ucrânia. Com a morte do presidente ucraniano que, à época, era favorável aos russos, houve uma invasão. E a relação entre os dois países nunca mais foi a mesma.
A crise deste ano, no entanto, começou com a possível entrada da Ucrânia na Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan), que inclui países como Bélgica, França, Reino Unido, Alemanha e Estados Unidos.
Para Putin, a Ucrânia não deve se tornar membro da aliança militar, permanecendo como “um Estado-tampão e neutro”. Entre uma série de exigências, o presidente russo pediu que a Otan interrompesse sua expansão para o leste, retrocedendo o envio de tropas em países que se juntaram após o ano de 1997.
Os países-membros da Organização, então, negaram as exigências de Putin e, apesar de os EUA (e a Rússia) saberem que a Ucrânia não vai entrar tão cedo para a aliança, para Putin a menção de uma provável entrada é uma ameaça à segurança de seu país.
O que os EUA têm a ver?
Os Estados Unidos, como membro da Otan e uma das potências com a maior quantidade de armas nucleares, têm interesses bastante diretos na defesa da Ucrânia.
A preocupação norte-americana se dá, principalmente, pela crença de que, se a invasão da Rússia for bem-sucedida, é possível que a China se sinta encorajada a invadir territórios vizinhos, como Taiwan, o que pode ameaçar o poder dos EUA nas economias mundiais.
Quais foram as sanções feitas à Rússia?
Antes mesmo da invasão acontecer, os Estados Unidos e a União Europeia já haviam anunciado uma série de sanções econômicas contra a Rússia.
Entre as penalidades financeiras impostas pelo governo de Joe Biden estão bloqueios às principais instituições russas e cinco membros do círculo íntimo de Putin que, segundo Biden, “compartilham os jogos corruptos das políticas do Kremlin e devem compartilhar a dor também”.
Os bloqueios foram feitos ao VEB e ao Promsvyazbank, ou PSB, de propriedade estatal, assim como outras 42 subsidiárias. Foi feita também uma sanção “abrangente” à dívida soberana russa, com intenção de cortar o país das relações ocidentais.
Já a UE concordou a fazer um primeiro pacote de sanções com foco em bancos, pessoas físicas e a capacidade do governo russo de acessar o capital e as finanças do bloco econômico.
Países como a Alemanha e o Reino Unido também impuseram algumas sanções à Rússia, como um bloqueio aos bancos Rossiya, Black Sea Bank, Genbank, IS Bank e Promsvyazbank e aos três bilionários do país que, segundo o governo britânico, terão seus ativos no país congelados e não poderão realizar viagens até lá.
Mas as sanções devem ficar ainda mais pesadas após o conflito desta quinta. Biden, por exemplo, anunciou nesta manhã que planeja anunciar “bloqueios econômicos severos” em resposta à decisão de Putin.
A lista também deve ser engrossada ao longo dos próximos dias.
Segundo o New York Times, a Coreia do Sul já afirmou que irá se juntar aos demais países que anunciaram sanções econômicas contra a Rússia.
Mas, como explica a Reuters, “os Estados Unidos e seus aliados nunca antes tentaram cortar uma economia de US$ 1,5 trilhão do comércio global, e não está claro quanta pressão mesmo as sanções ocidentais unificadas podem exercer sobre Moscou”.
Em relatório divulgado no dia 18 de fevereiro, o UBS afirmou que “em caso de conflito, sanções mais rígidas por parte do Ocidente prejudicariam seriamente as perspectivas de crescimento de longo prazo da Rússia, e o sentimento doméstico pode azedar rapidamente, como os protestos na Bielorrússia em 2020, na Rússia no início de 2021 e Cazaquistão este ano ilustram”.
Por que a Rússia decidiu invadir agora?
A resposta para essa pergunta é complicada.
Segundo um artigo do Center for American Progress, uma organização de pesquisa e defesa de políticas públicas, isso pode ter acontecido pelo fato de que a Rússia, ao contrário de 2014, com a situação da Crimeia, está mais preparada para lidar com um bloqueio econômico mais robusto.
“Por exemplo, os Estados Unidos e a União Europeia provavelmente imporiam sanções e depois mudariam seu foco para outros lugares, como fizeram após a invasão da Ucrânia em 2014. O impacto das sanções desapareceria e o Ocidente acabaria se reengajando com a Rússia”, afirma o artigo.
“No entanto, ao contrário de 2014, a Rússia passou anos se preparando para uma invasão e a resposta ocidental. A Rússia está atualmente bem preparada economicamente para enfrentar o que espera ser uma tempestade breve, mas intensa”, continua o artigo.
O que a Rússia exporta? Para onde?
A Rússia é uma grande potência quando o assunto são exportações. No ano passado, quando comparado a 2020, as exportações cresceram 60%, chegando a US$ 57,38 bilhões, segundo o Banco Central da Rússia.
A receita das exportações russas vem, principalmente, das vendas de petróleo bruto, produtos petrolíferos e gás natural, o que, juntos, representam metade do orçamento federal do país.
Segundo o site Trading Economics, as principais exportações da Rússia são: combustíveis e produtos energéticos (63% do total de embarques, dos quais petróleo bruto e gás natural representaram 26% e 12%, respectivamente); metais (10%); máquinas e equipamentos (7,4%); produtos químicos (7,4%) e alimentos e produtos agrícolas (5%).
Os principais parceiros de exportação em 2021 foram: China (12%), Alemanha (9%), Holanda (8,4%), Itália (5,8%), Bielorrússia (4,7%), Turquia (4,4%) e Japão (4,1%).
Em 2020, segundo dados do Banco Mundial, a Rússia representou 1,9% do comércio global.
Por que a China pode se beneficiar com o conflito?
Além de a invasão russa poder indicar para a China uma provável “bandeira branca” para que o país entre em Taiwan, também pode servir como uma rota de mudança de exportações da Rússia para o país asiático.
Com as sanções feitas à Rússia, a China se torna a opção mais provável para as exportações — e quem diz isso são fatos históricos.
Segundo a Reuters, uma análise dos dados comerciais do Banco Mundial e das Nações Unidas “mostra que, desde que sanções menores foram impostas em 2014, depois que a Rússia anexou a Crimeia da Ucrânia, a China emergiu como seu maior destino de exportação”.
“O problema com as sanções, especialmente envolvendo um produtor de petróleo, que é o que a Rússia é, será o vazamento no sistema”, disse Harry Broadman, ex-negociador comercial dos EUA e funcionário do Banco Mundial com experiência na China e na Rússia à Reuters. “A China pode dizer: ‘Vamos comprar petróleo no mercado aberto e se for petróleo russo, que assim seja’.”
Nos últimos anos, as máquinas e equipamentos de transporte representaram quase metade do total das exportações chinesas, segundo o Trading Economics, com destaque para máquinas, aparelhos e aparelhos elétricos (14%), telecomunicações e aparelhos e equipamentos de gravação e reprodução de som (12%), máquinas de escritório e máquinas de processamento de dados (8%) e máquinas e equipamentos industriais em geral e peças de máquinas (5%).
Outras grandes categorias de exportação foram: artigos manufaturados diversos (23%), bens manufaturados classificados principalmente por material (16%), como fios têxteis, tecidos, artigos confeccionados (5%), manufaturados de metais (4%) e ferro e aço (2 por cento); produtos químicos e afins (6%); e alimentos e animais vivos (3 por cento).
A UE e os EUA foram os maiores destinos dos embarques da China, respondendo por mais de 15%, seguidos por Hong Kong, Japão, Coreia do Sul, Vietnã, Alemanha, Índia e Holanda (3%).
E por que a China e a Rússia são parceiras?
Além disso, a China é o principal parceiro econômico da Rússia – o que explica a recusa do país em conder as ações de Putin desta quinta.
Uma porta-voz do ministério chinês nesta quinta-feira (24), se recusou a condenar o ataque da Rússia à Ucrânia, afirmando que “o pano de fundo do conflito é muito complicado”.
Segundo o New York Times, Hua Chunying, não descreveu o ataque como uma “invasão”, dizendo ainda que o termo é uma “formulação preconcebida”.
Também mais cedo, a agência alfandegária chinesa anunciou que “abriu caminho para a importação de trigo de todas as regiões russas, em vez de apenas algumas áreas designadas”.
Ainda de acordo com o The New York Times, “a medida faz parte de uma série de acordos assinados pelo presidente Vladimir Putin durante sua recente viagem a Pequim”.
Na visita, China e Rússia afirmaram que “a parceria não tinha limites”.
Em tempos de sanções à Rússia, a China se oferece como um aliado importante.
O que dizem as autoridades brasileiras e mundiais sobre a situação?
O presidente ucraniano, Volodymyr Zelensky, fez um apelo para a população do país mais cedo, pedindo para que os cidadãos “não entrem em pânico”.
“Somos fortes, estamos prontos para tudo”, disse ele em vídeo publicado pela CBS News.
Em seu perfil no Twitter, Zelensky afirmou que “a Rússia atacou traiçoeiramente nosso estado pela manhã, como a Alemanha nazista fez na Segunda Guerra Mundial”.
“A partir de hoje, nossos países estão em lados diferentes da história mundial. A Rússia embarcou em um caminho do mal, mas a Ucrânia está se defendendo e não desistirá de sua liberdade, não importa o que Moscou pense”, continuou a postagem.
Já Biden afirmou por meio de um comunicado que o ataque foi “não provocado e injustificado”, dizendo ainda que a Rússia “escolheu uma guerra que trará uma perda catastrófica de vidas e sofrimento humano”.
“Somente a Rússia é responsável pela morte e destruição que este ataque trará, e os Estados Unidos e seus aliados e parceiros responderão de maneira unida e decisiva”, disse Biden.
Ursula von der Leyen, presidente da União Europeia, seguiu a mesma linha de Biden para falar sobre a invasão em seu perfil no Twitter.
“Condenamos veementemente o ataque injustificado da Rússia à Ucrânia. Nestas horas sombrias, nossos pensamentos estão com a Ucrânia e as mulheres, homens e crianças inocentes que enfrentam esse ataque não provocado e temem por suas vidas. Vamos responsabilizar o Kremlin”, afirmou.
Em nota, o Itamaraty afirmou que “o Governo brasileiro acompanha com grave preocupação a deflagração de operações militares pela Federação da Rússia contra alvos no território da Ucrânia”.