Ronald Bozza: É preciso acabar com o abismo entre o discurso e a prática na diversidade de gênero
A diversidade se refere a uma representação equilibrada de gênero, etnia, idade, orientação sexual e outros fatores (por exemplo, pessoas com deficiência, veteranos, grupos religiosos) em todos os níveis de uma organização.
A pauta tem ganhado relevância dentro das organizações, com um número crescente de executivos defendendo a diversidade como uma das prioridades na agenda de suas empresas. Mas entre o discurso e a prática há um grande abismo.
A realidade atual é que as mulheres latinas ainda enfrentam muitos desafios para atingir a posição de C-Level e os exemplos daquelas que conquistam os cargos mais elevados são poucos.
Diversas pesquisas demonstram esse cenário. Um levantamento com 338 executivos (236 homens e 102 mulheres) na Argentina, Brasil, Chile, Colômbia, Uruguai, Equador, México e Peru, apontou que 26% dos entrevistados afirmaram que a diversidade de gênero era prioridade em 2021.
Para 2022 este percentual é de 35%. Dentro desse grupo, 88% dos executivos acreditam que os líderes de suas empresas estão totalmente ou muito comprometidos em atuar sobre o assunto.
A maioria dos executivos acredita que organizações com equipes de liderança diversificadas e que incluem um número significativo de mulheres geram retornos financeiros mais altos. E essa crença é mais forte no Brasil, onde a maior parte dos entrevistados observou que diversidade de gênero é uma das principais prioridades corporativas.
No entanto, as mulheres representam apenas 4% da gestão executiva das empresas no Brasil, em comparação com uma média regional de 9%, e apenas 25% das empresas brasileiras têm pelo menos uma mulher em suas equipes executivas, a menor participação nos oito países pesquisados.
Mas quais são os motivos que levam a tamanho abismo entre o discurso e a realidade? Existem, ao menos, três razões que explicam a falta de diversidade de gênero na alta administração.
Os resultados variam muito de acordo com o gênero, com as mulheres entrevistadas mais propensas a atribuir o desequilíbrio a menores taxas de promoção para as mulheres. A razão para os homens (43%) é a baixa representação feminina em sua empresa. Eles acreditam que seus setores são tradicionalmente menos atraentes para as mulheres.
O terceiro motivo é o atrito feminino em cargos de nível médio a sênior. Há uma percepção de que a mulher é mais preocupada com a família e, por isso, menos propensa a atuar em cargos que exijam mais tempo e dedicação ao trabalho.
Como não é de surpreender, os entrevistados do sexo masculino e feminino divergem em suas opiniões sobre os fatores que provocam as baixas taxas de promoção das mulheres.
Os homens citaram com mais frequência a concentração de funcionárias em departamentos com taxas de promoção comparativamente mais baixas e menos mobilidade ascendente.
Já as mulheres mencionaram com mais frequência a falta de patrocínio e a percepção dos líderes de que elas são menos ambiciosas.
O fato que não se pode ignorar é que existem barreiras para que a diversidade de gênero avance com mais rapidez. Segundo os executivos latino-americanos o problema está no equilíbrio entre a vida profissional e pessoal das mulheres e um modelo de desempenho que exige disponibilidade constante.
Dentre os participantes da pesquisa, 44% citaram o equilíbrio entre trabalho e responsabilidades domésticas como a maior barreira para aumentar a diversidade de gênero.
Já, 39% notaram a necessidade de disponibilidade constante e mobilidade geográfica. Outras barreiras citadas foram a falta de serviços públicos pró-família, ausência de modelos femininos e a tendência das mulheres a não se promoverem.
Dentre as entrevistadas, 70% disseram que a noção de que as mulheres devem cuidar da família é uma influência poderosa nas decisões de carreira das latino-americanas. E há ainda a barreira cultural, pois tradicionalmente a carreira dos homens acaba sendo priorizada.
A diversidade de gênero na alta administração é uma necessidade já identificada e que precisa ser priorizada pelas empresas, mas para que o discurso se torne realidade, é preciso criar um ambiente corporativo propício a tudo isso.
Os C-levels das empresas precisam estar atentos aos talentos em ascensão. Algumas medidas já estão no alcance das corporações, como a possibilidade de oferecer condições de trabalho flexíveis, como o home office e serviços de apoio para ajudar no equilíbrio entre vida profissional e pessoal.
As medidas como recrutar, reter, promover e desenvolver as mulheres não são tão complexas como se imagina nem tampouco onerosas quando pensamos nos benefícios que elas podem oferecer.
Ronald Bozza é sócio da BR Rating e da Bozza Soluções Estratégicas em Recursos Humanos, membro independente do Comitê de Pessoas e ESG e da Comissão de Pessoas do IBGC.