Coluna do Cadu Guerra

Renda fixa em alta pode explicar demissões em massa em startups; entenda a correlação

23 jun 2022, 12:15 - atualizado em 23 jun 2022, 12:15
Startups
Crescente valorização da renda fixa pode explicar porque startup estão demitindo em massa. Leia a coluna do Cadu Guerra, CEO do Allugator. (Imagem: Unsplash/Mario Gogh)

Nos últimos meses vimos algumas notícias de startups fazendo demissões em massa, mas o que eu não vi quase ninguém fazendo é explicando o que aconteceu de fato no cenário mundial que gerou essa movimentação no mercado. Teria a renda fixa em alta haver com isso?

Antes de explicar o contexto, vamos recapitular o cenário do mercado de venture capital no Brasil.

Nos últimos dois anos, vimos um mercado alegre e recordes de aportes mês a mês, todo dia que você abria os sites de notícia via startups levantando 100, 200, 500, milhões de reais em seu novo Series A, B ou até rodadas mais avançadas.

Os aportes viravam notícias todos os dias naturalmente, mas porque todo dia tínhamos um recorde novo?

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Imprimindo dinheiro adoidado

Um dos fatores foi com certeza a pandemia da Covid-19, que fez com que os governos mundo afora (não só o brasileiro), emitissem moeda para fornecer auxílio para a população e não quebrar a economia com as medidas de fechamento das cidades.

Para você ter noção, que essa não foi uma movimentação apenas do governo brasileiro, 80% de todo o dólar do mundo foi emitido nos últimos 30 meses, onde passamos de US$ 4 trilhões para US$ 20 trilhões hoje.

Veja a curva nos últimos anos (Imagem: Reprodução/TechStartups)

Com a injeção de moeda no mercado, naturalmente temos uma oferta maior de dinheiro no mundo, e consequentemente no mercado de venture capital.

Afinal, com a redução da taxa de juros (vimos no Brasil a Selic chegar a 2%), os investidores que buscam rentabilizar seu capital precisam correr mais riscos para conseguir fazer seu dinheiro render mais que as opções de renda fixa tradicionais que na época pagavam seus 4% ao ano.

Trocando o risco pela renda fixa

Como os investidores devem correr mais riscos, opções de investimento como o mercado de capitais, público ou privado, ganharam as atenções e dinheiro, não atoa a bolsa brasileira também bateu recordes históricos.

O dinheiro moveu para um mercado que é mais atrelado a risco e imprevisibilidade, e chegou o momento em que para rentabilizar o dinheiro, os fundos de venture capital tiveram que escolher as empresas para alocar os recursos, mas como a oferta de dinheiro causada pela chuva de liquidez que observamos, quem estava em posição de barganhar eram as startups.

Mas como assim as startups estavam em posição de barganhar? Isso mesmo. Chegou em um momento em que tinha mais dinheiro precisando ser alocado do que empresas boas para os investidores alocarem seu capital.

Isso fez com que os fundos de venture capital tivessem que pagar mais para uma empresa que eles quisessem alocar o seu dinheiro, assim supervalorizando os valuations dessas empresas.

Startups no modo sobrevivência

O que algumas pessoas não perceberam é que, muitas startups utilizam do capital de risco para consolidar sua operação e futuramente buscar lucro, estratégia que empresas como a Amazon (AMZN; AMZO34) utilizam no começo da sua operação.

O que isso significa é que algumas startups precisam de mais rodadas de investimento para sobreviverem enquanto não geram caixa sozinhos com sua operação, o que não é necessariamente errado, e sim uma estratégia.

Com a movimentação do mercado para responder à emissão desenfreada de moeda dos últimos anos, chegou a inflação, em níveis que muitos europeus e americanos nunca viram antes.

Para conter a inflação, os bancos centrais aumentaram as taxas de juros, com a Selic batendo 13,25%, crescimento de mais de 10 pontos percentuais em menos de 1 ano.

Ganhando 15% ao ano sem risco

O aumento da Selic faz com que os títulos de renda fixa que tinham se tornados pouco atrativos nos últimos anos, crescessem de maneira muito forte a sua atratividade, porque antes o título “livre de risco” pagava cerca de 4%, agora paga quase 15% ao ano.

Este movimento faz com as pessoas, que antes tinham que arriscar seu patrimônio, se movessem para a renda fixa.

Isso explica a queda muito forte do investimento em venture capital, criptomoedas, bolsa de valores. O dinheiro que precisava correr risco para ser rentabilizado, agora pode estar alocado em títulos muito mais seguros.

Agora, lembra o que eu disse sobre as empresas precisarem de fazer novas rodadas para se manterem vivas até se tornarem lucrativas? Na hora de fazer estas novas rodadas, o poder de barganha mudou.

Como o capital está escasso, os fundos de venture capital agora têm menos dinheiro para alocar, e precisam alocar melhor, e com o cenário de alta da taxa de juros, outras opções de empréstimos para as empresas ficam mais caras.

A lição que fica

Como o valuation das empresas foi superdimensionado, agora, o novo contexto obriga as empresas, para captar dinheiro e conseguir sobreviver na operação reduzir o valuation para se tornarem mais atrativas para os investidores.

Uma das maneiras que as startups encontraram para cortar os custos e conseguir sobreviver sem o acesso a capital que tinham antes, demissões acontecem.

Mas a principal lição disso tudo é conseguir entender os impactos de ações que aconteceram lá atrás na economia de hoje.

Aproveite para conferir todas as colunas do Cadu Guerra aqui no Money Times.

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Disclaimer

Money Times publica matérias informativas, de caráter jornalístico. Essa publicação não constitui uma recomendação de investimento.

Minibiografia: Cadu Guerra é CEO do Allugator, maior plataforma de assinatura de aparelhos eletrônicos da América Latina.
cadu.guerra@moneytimes.com.br
Minibiografia: Cadu Guerra é CEO do Allugator, maior plataforma de assinatura de aparelhos eletrônicos da América Latina.