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Renan Poli: A Velha Política e os Movimentos Sociais

18 jul 2019, 13:07 - atualizado em 11 set 2019, 16:44

Por Renan Poli – Advogado, engenheiro e biólogo. Escreve na coluna Direito, Política e Sustentabilidade do Money Times.

Movimentos sociais expressam a organização da sociedade civil, mas têm de tomar cuidado para não violar as prerrogativas dos partidos políticos“. (Imagem: Marcelo Camargo/Agência Brasil)

Ciro Gomes (PDT), em ressaca pós-votação acachapante a favor da PEC da Previdência no primeiro turno da Câmara, deferiu severas críticas ao terço de seu partido que corroborou para a vitória da reforma, defendendo inclusive sua expulsão. Além, passou a acusar integrantes de sua legenda, em especial Tábata Amaral, de agirem de modo obscuro, por meio de movimentos sociais dos quais fazem parte.

Suas palavras: “Todo mundo pode participar de qualquer movimento, mas se você tem um partido clandestino para burlar a legislação que proíbe financiamento empresarial, isso é uma coisa muito mais grave“. Completou: “Você pega um partido clandestino, que tem suas regras próprias, seu programa próprio, você se infiltra nos outros partidos e usa os outros partidos, fundo partidário, tempo de TV, coeficiente eleitoral para se eleger e fazer o serviço do outro partido? Aí é um problema de dupla militância, não tem nada a ver com a compreensão de reforma da Previdência que nós temos”.

Hoje, em matéria do Estadão, anuncia-se que o PDT pensa em recorrer ao TSE questionando a atuação dos movimentos.

Inúmeros movimentos sociais surgiram nos últimos anos, especialmente após as manifestações de 2013. Com sede de renovação, fruto da ampla insatisfação social, os movimentos muitas vezes funcionam de modo similar aos partidos políticos. Podem manifestar questionamentos políticos, recrutar pessoas, participar das políticas públicas, promover a integração social, além de mediar relações entre seus participantes, sociedade e poder público. Tratam-se de garantias constitucionais da sociedade que não são de prerrogativa dos partidos políticos, mas sim asseguradas pela livre manifestação do pensamento e capacidade de organização social.

Movimentos como Acredito, Livres, Agora, entre outros, foram concebidos como associações, com objetivos específicos, que orbitam o tema política, mas merecem distinções. Dentre os objetivos sociais do Movimento Acredito, por exemplo, estão “Fomentar debates e construir conteúdo de alto nível sobre questões de relevante interesse nacional, unindo evidência contexto e respeito às diversidades”; “Fomentar processos, projetos e ideias voltados à reapropriação da política pela sociedade”; “Promover a renovação política nacional por meio da organização de projetos de caráter suprapartidário”.

A RAPS – Rede de Ação Política Pela Sustentabilidade, entidade que oferece capacitação para novas lideranças políticas, por sua vez, tem entre suas finalidades “Identificar e apoiar lideranças políticas comprometidas com os princípios e valores da ética, integridade, cidadania, democracia, transparência, sustentabilidade e responsabilidade socioambiental, assim como aqueles expressamente consignados no Código de Ética RAPS”.

Merecem, portanto, grande distinção dos partidos políticos, pois deixam de disputar diretamente o poder, recolher votos ou gerir o Estado. Os movimentos sociais têm capacidade de pressionar, mas não pretendem atender, por suas organizações, os pleitos e reinvindicações sociais como governo.

Os nove deputados federais eleitos nas eleições de 2018 que obtiveram apoio do RenovaBR– outra entidade que fomenta a renovação de lideranças políticas, incluindo Tábata Amaral, não tiveram uma atuação coesa nas votações da Câmara“. (Imagem: Facebook oficial da deputada Tabata Amaral)

Corrobora com esta afirmação matéria também de hoje da BBC, que afirma que os nove deputados federais eleitos nas eleições de 2018 que obtiveram apoio do RenovaBR– outra entidade que fomenta a renovação de lideranças políticas, incluindo Tábata Amaral, não tiveram uma atuação coesa nas votações da Câmara. Isto é, seus apoiados são de diferentes ideologias e espectros partidários.

Movimentos sociais expressam a organização da sociedade civil, mas têm de tomar cuidado para não violar as prerrogativas dos partidos políticos. Nossa constituição reserva aos partidos políticos um tratamento distinto, pelo Direito Eleitoral. Têm de seguir princípios e regramentos específicos, em especial o Código Eleitoral, Lei Orgânica dos Partidos Políticos, Lei das Eleições e Resoluções do TSE. Tudo isso para que não se viole a expressão democrática prevista em nossa Constituição Federal.

Na esteira da Lava-jato, proibiu-se pela Lei Eleitoral o financiamento de campanhas eleitorais por empresas, uma vez constatado risco de grave distorção na representatividade social, com os receptores de caixa-dois comprometidos em dar retorno aos poderosos agentes financiadores de suas campanhas eleitorais, em ciclos viciosos. Resta agora saber se as jovens organizações sociais terão maturidade suficiente para fomentar a oxigenação das políticas públicas com suas novas lideranças de forma multipartidária, ou se cairão na tentação de se tornarem mecanismos mais flexíveis para se burlar o regramento de partidos, como suspeita a democracia trabalhista.

 

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