Renan briga com senadores que defenderam prisão após segunda instância
Em discurso nesta quarta-feira (4), o senador Renan Calheiros (PMDB-AL) criticou o grupo de 20 senadores que entregou carta aberta à presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministra Cármen Lúcia, defendendo a manutenção do entendimento do próprio tribunal de que prisões podem se dar após a condenação em segunda instância judicial. Para Renan, a Constituição Federal é clara ao dizer que a pessoa só pode ser considerada culpada após trânsito em julgado, ou seja, quando não houver mais possibilidade de recurso.
Renan começou seu pronunciamento citando o ex-presidente da Câmara dos Deputados Ulisses Guimarães (1916-1992): “A Constituição certamente não é perfeita; ela própria o confessa ao admitir a sua reforma. Quanto a ela, discordar, sim; divergir, sim; descumprir, jamais; afrontá-la, nunca!”. Renan afirmou que o Brasil está passando por momento dramático e sombrio.
Enquanto Renan discursava, ministros do STF davam continuidade ao julgamento do habeas corpus do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que poderia mudar o entendimento atual sobre as prisões após condenação em segunda instância.
Renan acusou os senadores que entregaram a carta ao Supremo de abrirem mão de prerrogativas do Parlamento, única instância na qual a Constituição pode ser alterada. Renan acrescentou que, durante seus quatro mandatos à frente da presidência do Senado, promulgou 37 emendas constitucionais aprovadas pelo Congresso Nacional.
Renan citou os nomes de quase todos os senadores que assinaram a carta entregue à Cármen Lúcia: Lasier Martins (PSD-RS), Simone Tebet (PMDB-MS), Tasso Jereissati (PSDB-CE), Flexa Ribeiro (PSDB-PA), Airton Sandoval (PMDB-SP), Ana Amélia (PP-RS), Cristovam Buarque (PPS-DF), Raimundo Lira (sem partido-PB), Ronaldo Caiado (DEM-GO), Ricardo Ferraço (PSDB-ES), Lúcia Vânia (PSB-GO), Randolfe Rodrigues (Rede-AP), Magno Malta (PR-ES), Romário (Pode-RJ), Reguffe (sem partido-DF), Ataídes Oliveira (PSDB-TO), Waldemir Moka (PMDB-MS), José Medeiros (Pode-MT).
O ex-presidente do Senado chamou seus colegas de “vivandeiras alvoroçadas”, lembrando frase do marechal Castello Branco (1897-1967) sobre grupos civis que pediam o golpe militar contra o então presidente João Goulart (1919-1976). Renan criticou os colegas por irem ao STF “entregar um documento e pedir que não se cumpra a Constituição, traindo a Constituição”. Disse que os colegas pediram que o tribunal “rasgue a Constituição e não garanta a presunção de inocência”, o que colocaria em segundo plano o Poder Legislativo.
Respostas
A maioria dos senadores citados por Renan reagiu e rechaçou suas acusações. Lasier Martins afirmou que os 20 senadores que assinaram a carta “têm ficha limpa” e não estão implicados na Operação Lava Jato. Para ele, após a confirmação da condenação em segunda instância, já está comprovada a materialidade do delito ou crime.
— É estranhável o pronunciamento do senador Renan. E eu só atribuo, com todo respeito, porque sempre aprendi a respeitá-lo: vossa excelência está preocupado com sua reeleição — disse Lasier.
Ana Amélia se disse surpresa por Renan cobrar coerência e respeito à Constituição. Para ela, Renan “ardilosamente violentou” a Constituição quando, ao final do processo de impeachment contra Dilma, foi encontrada uma “interpretação casuística” para que a presidente deposta mantivesse seus direitos políticos. A mesma argumentação foi utilizada na resposta dada por Ataídes.
Airton Sandoval afirmou que Renan desrespeitou os colegas. Moka afirmou que Renan agiu como se tivesse mais autoridade que os demais senadores e acrescentou que o senador por Alagoas “não tem a menor condição de censurar a ninguém”.
— Tenho 35 anos de mandatos consecutivos e não tenho nenhum processo nem medo de ser preso na segunda instância. Sempre tive respeito pelos colegas, mas esse tipo de censura não vou permitir. Incoerência muito grande — afirmou Moka.
Serenidade
Como os ânimos estavam exaltados, o presidente do Senado, Eunício Oliveira, chamou os senadores ao bom senso.
— Aqui é a Casa da serenidade, não do bate-boca — disse Eunício.
Cristovam Buarque afirmou que a interpretação atual do STF é de que pode haver prisão após condenação em segunda instância. Segundo ele, esse entendimento é comum na maioria dos países.
— O que nós pedimos é que não mude essa interpretação — disse Cristovam.
Flexa Ribeiro afirmou que o ex-presidente Lula é “o maior corrupto que já se viu na história do Brasil” e disse que a população espera que ele seja preso.
— Vossa excelência não tem autoridade para fazer juízo de valor a meu respeito, assinei a lista e assinaria de novo — disse Flexa.
Reguffe, por sua vez, afirmou que defende a prisão após a segunda instância “desde sempre”.
— Alguns podem mudar de acordo com os ventos, eu não — disse Reguffe.