Política

Relação sensível de Lula com militares é testada após ataques

13 jan 2023, 8:53 - atualizado em 13 jan 2023, 8:53
Lula
O presidente acusou as Forças Armadas de “nada fazer contra aqueles que exigiam um golpe em frente aos quartéis militares” depois que grupos pró-Bolsonaro invadiram prédios públicos, causando graves danos (Imagem: Ueslei Marcelino/Reuters)

Ao conter ataques golpistas poucos dias após sua posse, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva saiu fortalecido contra adversários políticos. Agora, no entanto, ele corre o risco de tensionar um relacionamento já delicado com as Forças Armadas.

Militares da ativa e da reserva, bem como pessoas próximas a Lula e seu antecessor Jair Bolsonaro, disseram em entrevistas que a estratégia do presidente para restaurar o controle político após os ataques de 8 de janeiro em Brasília poderia minar seus próprios esforços para melhorar a relação com os generais. Todos pediram anonimato para discutir questões delicadas.

Embora nenhuma da dúzia de pessoas com as quais a Bloomberg falou tema um golpe, a principal preocupação é que Lula, depois de nomear um ministro da Defesa com capacidade de reconstruir pontes com militares, agora poderia estar desperdiçando a oportunidade ao intensificar a retórica contra os comandantes das tropas.

O presidente acusou as Forças Armadas de “nada fazer contra aqueles que exigiam um golpe em frente aos quartéis militares” depois que grupos pró-Bolsonaro invadiram prédios públicos, causando graves danos. Ele também disse que familiares dos generais foram vistos nesses campos, sugerindo que as autoridades simpatizavam com o movimento radical, contra as regras da instituição.

“As Forças Armadas não são o poder moderador que pensam que são”, disse Lula a repórteres na quinta-feira. “As Forças Armadas têm um papel definido na Constituição que é a defesa do povo brasileiro e a defesa da nossa soberania contra conflitos externos. É isso que eu quero que eles façam bem feito”.

Tais críticas podem alienar os moderados e dar voz a membros mais engajados politicamente das forças, disseram as pessoas. Isso teria potencial de encorajar manifestações antigovernamentais que, se continuarem, poderiam paralisar o país, comprometendo o complicado equilíbrio político de Lula em meio a uma economia já frágil.

Um porta-voz de Lula não respondeu a um pedido de comentário. No início desta semana, o ministro da Justiça, Flávio Dino, se pronunciou a favor das Forças Armadas, dizendo que “até agora elas permaneceram fiéis à legalidade democrática”. A assessoria de imprensa do comando militar de Brasília não respondeu imediatamente a um pedido de comentário.

Aliados de Lula também disseram esperar que o presidente consiga afinar sua mensagem.

Desconfiança mútua

Mesmo antes dos tumultos, a abordagem do novo governo em relação aos militares era uma questão em aberto. Enquanto o próprio Lula governou dois mandatos entre 2003 e 2011 sem grandes confrontos com generais, muitos dos membros de seu partido eram vistos com desconfiança em alguns círculos militares por seu papel na resistência à ditadura que governou o Brasil entre 1964 e 1985.

Os laços de Bolsonaro com as Forças Armadas representaram outro desafio. Ele próprio um ex-capitão do Exército, conseguiu cooptar parte de uma instituição que foi concebida para ser apolítica ao dar a militares mais de 6.000 empregos em sua administração, incluindo vários cargos ministeriais. Ele também defendeu a ditadura e afirmou incorporar valores de ordem, família e religião que ressoam com esse grupo.

Em meio a esse cenário, os apoiadores de Bolsonaro que se recusaram a aceitar sua derrota no segundo turno presidencial de outubro tinham um objetivo claro ao invadir a capital do país no domingo: desencadear caos suficiente para forçar uma intervenção militar que, segundo eles, derrubaria Lula.

O plano, que nunca teve chance de muito sucesso, foi ainda menos convincente depois que saques aos prédios do governo, Congresso e do Supremo Tribunal Federal forçaram o alto comando das Forças Armadas a se distanciar ainda mais do líder conservador e de seus partidários radicais.

Com amplo apoio das autoridades locais e da comunidade internacional, Lula passou então a reafirmar sua autoridade.

A polícia prendeu cerca de 1.500 manifestantes no local e rapidamente dissolveu grupos de apoiadores de Bolsonaro que estavam acampados em frente a quartéis militares em todo o país. No entanto, isso está longe de ser o fim da história, de acordo com as pessoas, que incluem alguns que atuaram como ponte entre os governos anteriores de Lula e as forças.

Embora seja verdade que os comandantes do exército não se moveram contra os manifestantes acampados em suas portas, portanto fora do alcance das forças policiais regulares, um general aposentado argumentou que acalmar os manifestantes não é tarefa dos militares, mas dos políticos.

Além disso, como disse mais de um dos entrevistados, a alta polarização do Brasil e a insistência de Lula em falar principalmente para sua base poderiam afastar os brasileiros moderados que lhe deram uma vitória apertada em 30 de outubro, com apenas 50,9% dos votos válidos. A mesma polarização política contaminou os militares, especialmente oficiais de base e até alguns generais que Bolsonaro colocou em sua órbita de influência, disseram as pessoas.

Aproximação suave

Lula, em um primeiro movimento para restaurar as relações desgastadas com as Forças Armadas, nomeou José Múcio Monteiro como ministro da Defesa. Político experiente e com boas ligações entre os generais, Múcio também foi ministro de Assuntos Institucionais de Lula entre 2007 e 2009.

Com a benção do presidente, ele optou por uma estratégia diplomática em sua primeira semana como ministro, descrevendo como expressão de democracia os acampamentos lotados de apoiadores de Bolsonaro em frente a quartéis militares, e dizendo que até tinha familiares em alguns deles. Ele apostou que os acampamentos morreriam com o tempo, mesmo quando já estava claro que eles estavam sendo usados ​​por radicais para planejar ações contra o novo governo, incluindo uma ameaça de bomba perto do aeroporto de Brasília no final de dezembro.

Os mesmos acampamentos serviram de base para os desordeiros que invadiram Brasília no dia 8 de janeiro, episódio semelhante à invasão do Capitólio dos EUA há dois anos.

Múcio agora está sendo criticado por membros mais esquerdistas da coalizão de Lula, que pediram sua renúncia por negligência. O presidente na quinta-feira apoiou seu ministro, dizendo que continuará no cargo “porque confio nele”.

Mas os últimos comentários de Lula sugerem que a abordagem branda observada no início de seu governo pode estar com os dias contados.

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