Reforma tributária: Os setores da bolsa que podem se dar mal com a mudança
A reforma tributária deve ser votada na Câmara dos Deputados nos próximos dias, mas vem enfrentando obstáculos de alguns setores econômicos e governadores.
A proposta do secretário extraordinário da reforma tributária, Bernard Appy, é simplificar o sistema tributário unificando cinco impostos em um Imposto sobre Valor Agregado (IVA).
O novo imposto vai substituir o IPI, PIS/Pasep, Cofins, ICMS e ISS, sendo que a proposta é de um sistema dual. Ou seja, os impostos federais IPI, PIS/Pasep e Cofins serão substituídos por uma Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS), gerida pela União; já os impostos locais ICMS e ISS serão agrgados em um Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), gerido pelos estados e municípios.
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Além disso, o governo também quer reduzir o número de alíquotas e exceções. A ideia é instituir três alíquotas para o IBS:
- a alíquota padrão, que deve incidir sobre todos os bens e serviços da economia;
- a alíquota reduzida que será equivalente a 50% do padrão para alguns setores específicos (medicamentos; dispositivos médicos e serviços de saúde; transporte público coletivo; serviços de educação; produtos agropecuários, pesqueiros, florestais e extrativistas vegetais in natura artigos da cesta básica; e atividades turísticas e culturais nacionais);
- a alíquota zero para medicamentos, Prouni e produtor rural pessoa física.
O grupo de trabalho da reforma também estuda a criação de um Imposto Seletivo, incidindo sobre a produção, comercialização ou importação de bens e serviços prejudiciais à saúde ou ao meio ambiente.
Segundo Vitor Sousa, analista da Genial Investimentos, a aprovação da reforma tributária é vista com bons olhos pelo mercado, principalmente quando considerados os potenciais ganhos de médio/longo prazo para a economia. No entanto, ele destaca que ainda não está claro o impacto na arrecadação, lucros, dividendos e, evidentemente, nas avaliações/preço-alvo das empresas.
“Concluímos que setores de capital intensivo e razoavelmente maduros (energia elétrica, bancos) tenderiam a ser prejudicados devido o impacto do fim do Juros Sob Capital Próprio e taxação de dividendos versus cases de crescimento (varejo e tecnologia) devido à redução nas faixas de imposto de renda, aumentando os recursos disponíveis para investimentos”, afirma em relatório.
Veja quais setores da bolsa podem ser prejudicados com a reforma tributária
Petróleo & Gás
Impacto: Negativo
Atualmente, a indústria de petróleo não possui isenções específicas. Por isso, a forma como a proposta é estruturada em relação à cobrança de impostos pelo IVA pode ser vista como neutra, dependendo da alíquota que for adotada.
“É necessário compreender se a nova alíquota do IVA acabará sendo maior do que a carga tributária total atualmente aplicada pelos impostos regulares, conforme conhecemos hoje”, afirma Vitor.
No entanto, o analista destaca a possibilidade das empresas petrolíferas serem alvo de um eventual “imposto do pecado”, já que lidam com a comercialização de uma fonte não-renovável e poluente.
No caso dos combustíveis, deverá existir uma proposta tributária específica, com a aplicação de uma única alíquota e com possibilidade de crédito para os contribuintes do imposto.
Mineração e Siderurgia
Impacto: Negativo
Atualmente, o setor de Mineração & Siderurgia está sujeito ao pagamento de IRPJ, CSLL, ICMS, PIS, COFINS, com a siderurgia submetida ao IPI, e a mineração a Compensação Financeira pela Exploração de Recursos Minerais (CFEM).
A alteração do regime tributário não deve mexer diretamente nas taxas de CFEM e TFRM. No entanto, a reforma pode adicionar impostos seletivos na mineração, em caso do enquadramento da atividade como prejudicial ao meio ambiente – principalmente se relacionada com os acidentes já causados pelas barragens a montante, e a contaminação do solo e dos rios locais.
Transporte
Impacto: Negativo
Vitor destaca que, no setor de transportes, o cenário é misto por causa dos diferentes segmentos. O setor aéreo, por exemplo, é visto como estratégico em termos de redução de tributos, já o setor de locação pode acabar sendo penalizado.
Para as empresas aéreas, a incidência do imposto conjunto faria com que sua carga tributária possivelmente se elevasse, dado que as receitas de transporte de passageiros são isentas de ICMS, PIS e Cofins. Outro ponto é a possível criação de um imposto sobre aeronaves e embarcações.
Já para as empresas do setor de locação, a unificação de impostos por si só não preocupa, uma vez que as companhias do setor geram fortes quantidades de créditos tributários em seu processo de compra de veículos.
A maior preocupação é de que as empresas sejam afetadas pela introdução de uma tributação na venda de ativos imobilizados, independentemente da obtenção de ganho de capital. Essa medida teria um impacto significativo na divisão de seminovos, reduzindo substancialmente os níveis de rentabilidade dessas empresas.
Bebidas
Impacto: Negativo
A reforma tributária propõe a criação de um Imposto Seletivo, que deve incidir sobre a produção e comercialização de bens prejudiciais à saúde, como bebidas alcoólicas e refrigerantes.
Atualmente, a única companhia de capital aberto listada na B3 deste setor é a Ambev (ABEV3). O foco da companhia é na produção, distribuição e comercialização de bebidas alcoólicas, sendo que o segmento de não alcoólicas representa menos de 10% do seu faturamento.
Frigoríficos
Impacto: Negativo
Hoje, os frigoríficos se beneficiam da isenção de tributos federais em produtos da cesta básica. No entanto, a reforma propõe que, sobre esses itens incida uma alíquota reduzida, de 50% da alíquota geral aplicada a bens e serviços.
Resumindo: não é prevista uma isenção de tributos, o que pode levar a um encarecimento dos produtos e consequente redução do consumo, prejudicial aos frigoríficos com maior exposição ao mercado doméstico.
Agrícolas
Impacto: Neutro/Negativo
Atualmente, o sistema tributário do agronegócio apresenta muita complexidade, com uma alíquota estimada em torno de 5%. No entanto, a adoção de uma alíquota unificada pode levar a uma elevação no imposto, podendo chegar a 25%. Essa mudança tende a ter um impacto negativo no setor como um todo.
Por outro lado, a proposta de desoneração das exportações, que se mostra essencial para manter a competitividade do agronegócio brasileiro nos mercados globais, é motivo de um otimismo moderado.
Telecomunicações
Impacto: Negativo
Atualmente, o setor de telecomunicações enfrenta inúmeras questões judiciais relacionadas ao ICMS. Segundo Vitor, a proposta de uma alíquota única, com a extinção do ICMS, é negativa para o setor, pois pode aumentar a carga tributária de 11% para 25%.
“No entanto, há uma possibilidade remota do setor receber uma carga tributária diferenciada e ser desonerado”, afirma.
Imobiliário
Impacto: Neutro/Negativo
A reforma tributária determina que tanto o setor de incorporação quanto o de properties serão categorizados como regimes específicos de tributação.
Atualmente, o regime de tributação de incorporadoras já é diferenciado, com alíquotas mais baixas que a média dos outros setores. Na avaliação de Vitor, a atual tributação deve continuar mesmo após a reforma tributária.
Já em properties, os principais impostos indiretos que impactam o setor são: PIS, Cofins e ISS. Isso vale, principalmente, e para empresas cuja atividade é relacionada à locação de imóveis, como shoppings.
Em relação ao ISS, a participação é muito baixa no segmento, uma vez que um percentual pequeno da receita das empresas se enquadra como “serviços”. A maior parte do ISS pago é referente à administração de imóveis de terceiros.
Olhando por esse lado, a reforma seria negativa, já que a alíquota do ISS tende a ser mais baixa do que as expectativas das alíquotas para o CBS e IBS.
Já no caso do PIS/Cofins, as empresas de adotam dois possíveis regimes de tributação: lucro real e presumido. Na prática, isso significa que a alíquota efetiva fica em um intervalo entre 3,65% e 9,25%.
“Como o segmento se enquadra em regime especial, o impacto é totalmente dependente da força do lobby do segmento, que deve tentar buscar alíquota efetiva menor que 7%”, afirma.
Varejo
Impacto: Negativo
O varejo é um dos grandes impactados com a aprovação da reforma tributária. Hoje, o setor é bastante exposto a benefícios fiscais, principalmente atrelado ao ICMS, e deve sofrer um aumento de carga tributária.
“Vale lembrar que esses efeitos só deverão ser plenamente percebidos em cerca de 10 anos, após o período de transição, e até lá a estratégia tributária das companhias serão ajustadas à nova legislação, o que deve ajudar a mitigar os efeitos nos resultados”, afirma Vitor.
A princípio, as empresas que comercializam bens essenciais, como alimentos e medicamentos, sofreriam um aumento de carga tributária – considerando a redução de 50% da alíquota para os setores.