Política

Preferido da vez para PGR, subprocurador pode enfrentar resistência no MPF

19 ago 2019, 17:38 - atualizado em 19 ago 2019, 17:38
Raquel Dodge
Reportagem recente da Reuters mostrou que, apesar de o indicado pelo presidente para procurador-geral ter o aval para escolher relevantes cargos na estrutura do MPF (Imagem: REUTERS/Ueslei Marcelino)

A eventual indicação pelo presidente Jair Bolsonaro do subprocurador-geral da República Antonio Carlos Simões Martins Soares –tido como desconhecido e sem respaldo de colegas– para o cargo de procurador-geral da República pode motivar uma rebelião interna de procuradores, afirmaram à Reuters nesta segunda-feira dois experientes quadros do Ministério Público Federal (MPF).

Nos últimos dias, o nome de Soares tornou-se um dos principais na bolsa de apostas para o cadeira de sucessor de Raquel Dodge, que fica no cargo até 17 de setembro.

O subprocurador foi um dos cotados que estiveram com o senador Flávio Bolsonaro (PSL-RJ), filho do presidente. Segundo a assessoria de imprensa do senador, Flávio recebeu-o e repassou suas impressões –assim como a de outros cotados– para que Bolsonaro decida. A assessoria negou que Flávio tenha apadrinhado a indicação –conforme noticiado por veículos de imprensa.

A possível escolha de Soares é vista, segundo dois procuradores que falaram reservadamente, como até pior do que a do subprocurador Augusto Aras, que dias atrás chegou a ser tratado como favorito na disputa. Isso porque, não bastasse ser um nome de fora da lista tríplice feita pela categoria (a exemplo de Aras), ele é visto como um desconhecido dentro da cúpula do órgão, sem participar de conselhos e órgãos, e opinar sobre assuntos que estão na ordem do dia para a carreira, como é o caso da execução da pena após condenação em segunda instância.

A avaliação, dizem as fontes, é que ele cuidou apenas dos processos em seu gabinete e também de demandas pessoais, como questões referentes a vantagens financeiras da própria carreira.

“Ele não vai ser bem recebido não”, disse um importante quadro do MPF, ao afirmar que a sensação interna é de “perplexidade” e confirmar a possibilidade de “rebelião”. Para ele, como exemplo do que poderia ser na prática a rebelião, Soares “não montaria ou teria uma dificuldade imensa” de montar uma equipe para chefiar à Procuradoria-Geral da República.

Bolsonaro tem dito que pretende escolher um procurador-geral da República que seja alinhado com os interesses do seu governo e que não atrapalhe o desenvolvimento do país.

Reportagem recente da Reuters mostrou que, apesar de o indicado pelo presidente para procurador-geral ter o aval para escolher relevantes cargos na estrutura do MPF, não conta com total liberdade para mudar os rumos da atuação independente da carreira, o que na prática impede um alinhamento completo aos ditames do governo.

Os procuradores destacam ainda que a situação do MPF –que, pela Constituição, tem independência funcional e garantias que o blindam de influências externas– é bem diferente das disputas que o presidente tem travado nos últimos dias com a Polícia Federal, a Receita Federal e o Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf). Ele já anunciou mudanças ou reclamou de ações feitas por esses três órgãos de governo.

“As pessoas às vezes ocupam postos importantes e se acham sobrenaturais, poderosíssimas, com a propensão para controlar tudo. Isso pode valer para PF, Receita e Coaf, mas não tem como fazer isso com procuradores da República”, disse outro experiente procurador.

Esse procurado deu um exemplo para explicar seu argumento: o procurador-geral não tem poder para impedir que um colega da primeira instância em Mato Grosso não vá à Justiça para barrar uma causa que esteja prejudicando índios com base na lei.

“Quem venha com propósitos controladores, vai entrar pelo cano. Isso é um delírio”, completou essa fonte, ao avaliar que no governo Fernando Henrique Cardoso o então procurador-geral da República, Geraldo Brindeiro, pode até não ter levado adiante investigações sobre integrantes do Executivo, mas procuradores da República que atuavam na primeira instância questionaram várias iniciativas daquela gestão na Justiça.