Pré-Mercado: Petróleo, ao infinito e além
Bom dia, pessoal!
Lá fora, os mercados asiáticos sobem, de olho na guerra na Ucrânia, riscos inflacionários e aumento dos preços da energia — os índices subiram no Japão, Coréia do Sul, Austrália e Hong Kong, mas caíram em Xangai. A guerra na Ucrânia e as sanções ocidentais contra a Rússia estão aumentando as preocupações sobre o fornecimento de energia para a Europa, aumentando os preços e prejudicando a recuperação econômica da pandemia.
A Europa, apesar do receio inflacionário, consegue sustentar uma alta nesta manhã, depois de uma segunda-feira (21) de predominância das perdas. Os futuros americanos conseguem acompanhar, diante de uma terça-feira (22) com agenda um pouco mais esvaziada. O Brasil, por sua vez, tem que se preocupar em decifrar o Copom no dia de hoje, com a publicação da ata do último encontro. Se for bem sucedido, podemos ver novamente um descolar positivo dos ativos brasileiros,.
A ver…
Como será que vem essa ata?
Na manhã de hoje, o mercado local estará preocupado com a ata da última reunião do Comitê de Política Monetária (Copom), quando o colegiado decidiu aumentar de 10,75% para 11,75% e deixou muitos investidores em dúvida sobre os próximos passos do Banco Central.
O ponto chave será entender o conceito de “cenário alternativo” descrito no documento, que justificaria só mais uma elevação da Selic, em maio. Parece não ser o que o mercado acredita, precificando uma Selic terminal acima de 13%. De fato, um petróleo acima de US$ 110 por barril e um IPCA da ordem de 7% em 2022 parecem chamar algo do gênero.
Enquanto isso, alguns assuntos de cunho fiscal chamam a atenção. Em primeiro lugar, o Fórum de Governadores discute a questão do ICMS sobre combustíveis, que pode trazer imbróglios sobre o tema a médio e longo prazo considerando as renúncias fiscais propostas por Brasília. Em segundo lugar, o Ministério da Economia divulgará o Relatório de Avaliação de Receitas e Despesas Primárias do 1º Bimestre de 2022.
Este segundo é especialmente importante depois que o governo anunciou medidas adicionais que visam melhorar o ambiente de negócios e incentivar a abertura comercial que representam renúncia de R$1 bilhão. A ideia com as medidas é reduzir o impacto inflacionário dos itens no Índice nacional de preços ao consumidor.
Uma delas é a redução de mais 10%, chegando a 20%, na alíquota do imposto de exportação sobre bens de capital, informática e telecomunicações. Outra medida anunciada é a redução a zero do imposto de exportação da lista de itens da cesta básica. O etanol também terá a alíquota zerada.
Apesar de bem-vinda para desafogar a disponibilidade de renda da população, a sequência de impactos fiscais começa a preocupar o mercado, que teme mais um capítulo como o do segundo semestre de 2022, quando o receio fiscal foi descontado negativamente nos preços dos ativos, no câmbio e na curva de juros.
Pode não ser só um pouquinho de juros
Ontem (21), o discurso do presidente do Fed, Jerome Powell, soou mais agressivo do que o mercado esperava, provocando uma alta nos yields dos títulos de 10 anos (já está acima de 2,3%) e uma realização nos ativos de risco. No final do dia, na verdade, soar duro com a inflação é politicamente sensato, mas os mercados parecem sensíveis demais indicam preferir mentiras fáceis a verdade inconveniente.
Powell disse que o Fed passaria para níveis mais restritivos se isso for necessário para restaurar a estabilidade de preços, o que implicaria a possibilidade de deliberadamente empurrar o crescimento abaixo da tendência. É aqui que entram os riscos de recessão. O desafio, portanto, será o de posicionar delicadamente a economia dos EUA abaixo da tendência, mas acima da recessão. É possível, mas não é trivial.
O Fed sempre se moveu em passos de 25 pontos-base pelo menos nas últimas duas décadas. Para se ter uma ideia, o último aumento de meio ponto ocorreu em maio de 2000, quando a taxa de juros passou de 6,0% para 6,5%. O fato de ter ocorrido durante a última grande bolha do mercado de ações pode ser visto como uma coincidência, mas é mais provável que seja um sinal de que o Fed está particularmente preocupado com o superaquecimento da economia e sente urgência em controlar a inflação.
Anteriormente, a expectativa para este ano era que veríamos a inflação atingindo o pico no primeiro trimestre e talvez se estabilizando, já vendo muito progresso no segundo semestre. Essa história já desmoronou com a guerra na Ucrânia. Com a constatação, as chances de um aumento de meio ponto em maio passaram de 44% de chance na sexta-feira para 64% hoje. Na esteira, uma clara maioria dos investidores agora espera que as taxas terminem o ano em 2,25% ou mais.
Mais sanções
Sem progresso nas negociações de paz, circulam relatos de que a União Europeia estaria preparando a mesa para um embargo de petróleo russo. Consequentemente, voltamos a ver o petróleo subindo, com o contrato Brent já acima de US$ 113 por barril. O problema aqui é que os preços de energia mais altos prejudicam enormemente as economias ocidentais.
É uma verdadeira sinuca de bico.
Acontece que, como bem sabemos, a Rússia é desproporcionalmente importante em commodities de energia, então os preços da energia têm sido até agora um mecanismo de transmissão chave para a economia global.
Adicionalmente, o alerta da Rússia de que as relações diplomáticas com os EUA estariam à beira da ruptura não ajudou em nada. Agora, o presidente dos EUA, Joe Biden, alertou sobre ataques cibernéticos como consequência da invasão da Ucrânia pela Rússia. A Rússia também é desproporcionalmente importante em ataques cibernéticos, de modo que também é um canal significativo economicamente.
Anote aí!
Lá fora, as finanças públicas do Reino Unido foram publicadas, de maneira geral, mais fortes do que o previsto, refletindo a atividade econômica melhor do que muitos pressupunham. Na Suíça, a presidente do BCE fala hoje e poderá trazer mais novidades sobre a política monetária na Zona do Euro. Nos EUA, em dia de agenda mais esvaziada, investidores prestam a atenção nas falas de autoridades monetárias regionais, como o presidente do Fed de Cleveland. No Brasil, destaque fica para a ata do Copom. Porém, além da ata, vale conferir os comentários de Roberto Campos Neto hoje durante o evento “LIFT Day 2022”.
Muda o que na minha vida?
O conflito na Ucrânia já levou os países a reavaliar sua segurança energética, mas com dois dos maiores exportadores de grãos do mundo em guerra, a segurança alimentar também está causando problemas.
Basicamente, a Ucrânia produz 10% das exportações globais de trigo, 14% das exportações de milho e cerca de metade do óleo de girassol do mundo, de acordo com o Departamento de Agricultura dos EUA. Paralelamente, a Rússia é o maior exportador mundial de trigo, respondendo por mais de 18% das exportações internacionais.
Dessa maneira, o que está acontecendo na Ucrânia vai mudar toda a nossa abordagem e nossa visão sobre o futuro da agricultura. Consequentemente, autoridades ao redor do mundo têm se reunido para discutir maneiras de tornar o abastecimento de alimentos mais seguro, como permitir que terras em pousio sejam usadas para cultivos de proteína, relaxar as regras de eventual auxílio estatal para conceder assistência aos agricultores ou oferecer apoio à indústria de carne suína.
Mas não é só na Europa que se discute. O protecionismo alimentar está até envolvendo mercados fora da Europa como a Indonésia, o maior produtor de óleo de palma, que está aumentando as tarifas de exportação para tornar mais lucrativo para as empresas abastecer o mercado doméstico.
Nossa vizinha, a Argentina, maior exportadora de farelo e óleo de soja, está impedindo os vendedores de registrar cargas para exportação, enquanto o Egito está proibindo alimentos básicos, como farinha, lentilha e trigo, de deixar o país por três meses.
Há um temor real pela segurança alimentar a médio e longo prazo. Qualquer estabilidade que você obtenha no país que está colocando a proibição de exportação é uma instabilidade exportada para o resto do mundo. Tudo isso deverá se traduzir em potencialmente falta de alimentos e, quando existentes, alimentos mais caros.
Um abraço,
Jojo Wachsmann