Pré-Mercado: Guerra é paz, só que não
Oportunidades do dia
A commodity de 1 trilhão de dólares
Uma improvável commodity tornou-se a protagonista de uma corrida envolvendo as maiores potências e empresas do mundo e estabelecendo um mercado de, pelo menos, 1 trilhão de dólares. Confira o relatório especial liberado hoje.
Bom dia, pessoal!
Na volta de nossa Transparência Radical, os mercados de ações asiáticos se recuperaram nesta quinta-feira (3), enquanto os preços do petróleo continuam subindo depois que o presidente do Federal Reserve disse ontem (2) que apoia um aumento menor nas taxas de juros do que alguns esperavam.
Na Europa, porém, o movimento não é positivo nesta manhã, com a Bolsa de Valores da Rússia ainda fechada. Os futuros americanos acompanham o tom mais negativo, na expectativa para as discussões de hoje entre Rússia e Ucrânia para um cessar-fogo. O encontro entre os dois países será importante, mas dificilmente mudará algo.
O Brasil tem conseguido, na volta do feriado do Carnaval, acompanhar a boa performance das commodities e, caso o dia seja ruim internacionalmente, ainda podemos nos descolar do humor negativo dos mercados estrangeiros — a manhã é de mais um dia positivo para as matérias-primas, em especial as energéticas.
A ver…
O que resta entre os emergentes
Por aqui, a nossa agenda de indicadores continua mais fraca, apesar de ainda contarmos com o IPC-S (dado de inflação pode impactar curva de juros), a balança comercial de fevereiro (pode afetar o câmbio) e o número de emplacamentos de veículos no mês passado (pode medir parcialmente o grau de atividade). De todo modo, o Brasil tem reagido bem às perspectivas de rotação setorial (de crescimento para value) e à alta das commodities.
Em meio ao turbilhão na Rússia, a apatia da China e a complexidade da Índia, o investidor estrangeiro tende a optar por um emergente que, por mais complicado que seja, continua muito barato e com ativos muito bons — pelo menos nós não entramos em guerra com ninguém. Será importante acompanhar hoje, porém, o leilão de títulos públicos do Tesouro, em meio ao choque de commodities energéticas e agrícolas com a guerra na Ucrânia, que pressiona as expectativas de inflação (mais juros).
25 pontos-base estão de bom tamanho
Ontem (2), o presidente do Federal Reserve, Jerome Powell, sinalizou um aumento de 25 pontos-base na taxa de juros na reunião de março, daqui a duas semanas, apesar de acrescentar que o impacto econômico da guerra na Ucrânia ainda é altamente incerto. Notadamente, o impacto inflacionário é o mais relevante, em especial pelo preço dos combustíveis (EUA) e da conta de luz (Europa).
Os comentários do presidente do Fed foram vistos como tendo um tom menos agressivo e mais otimista, pois confirmaram o consenso em Wall Street. A situação Rússia-Ucrânia é certamente volátil e arriscada, mas as perspectivas econômicas dos EUA ainda não mudaram radicalmente.
A Rússia é o segundo maior produtor de petróleo do mundo e exporta 5 milhões de barris de petróleo por dia (cerca de 12% do comércio global); logo, algum impacto começará a ser percebido muito em breve.
Os Estados Unidos até poderiam liberar mais petróleo de reservas de emergência em conjunto com outros países, mas a melhor aposta de Biden para aumentar a oferta e reduzir os preços, puramente do ponto de vista financeiro, pode ser chegar a um acordo nuclear com o Irã.
Mais do mesmo
Os contratos futuros de petróleo subiram para acima de US$ 115 o barril, seu nível mais alto desde maio de 2011, depois de os líderes da Opep+ decidirem na quarta-feira (2) manter os planos de aumentar gradualmente a produção. A coalizão, formada por membros da Opep liderados pela Arábia Saudita e não membros do cartel liderados pela Rússia, optou por aumentar a produção em 400 mil barris por dia em abril, como já tem feito nos últimos meses.
A decisão vem depois que os Estados Unidos e outros grandes consumidores de petróleo da Agência Internacional de Energia concordaram nesta semana em liberar 60 milhões de barris de reservas estratégicas para aumentar a oferta — teve pouco impacto nos preços de mercado, já que se trata de apenas seis dias de produção russa.
O contrato futuro do petróleo bruto aumentou mais de 20% desde a invasão da Ucrânia pela Rússia e as sanções que se seguiram. O salto nos preços do petróleo bruto é um lembrete perturbador dos tipos de choques na década de 1970 que levaram a um boom impressionante da inflação e a desacelerações econômicas esmagadoras.
Se o petróleo dos EUA chegar a US$ 119 o barril, isso significaria que o preço dobrou em um ano. Nas últimas três vezes que isso aconteceu, a economia dos EUA logo se viu em recessão: em 1990, 2000 e 2008. Isso porque a dor de um aumento nos preços da energia é rapidamente transmitida às famílias dos EUA na forma de preços mais altos na bomba e nas contas de aquecimento.
O J.P. Morgan observou que cada aumento de 10% nos preços do gás adiciona US$ 4 bilhões em custos aos consumidores e cada aumento de 10% nos preços do petróleo adiciona US$ 19 bilhões. A Moody’s Analytics, por sua vez, estimou recentemente que o petróleo a US$ 100 o barril subtrairia dos EUA um décimo de ponto percentual do crescimento do PIB no segundo trimestre e meio ponto percentual no terceiro trimestre.
Anote aí!
Lá fora, começamos o dia digerindo a taxa de desemprego na Zona do Euro, que veio melhor do que o esperado em 6,8% ao final de janeiro. Por ali, ainda contamos com os dados de preço ao produtor, que já podem começar a repercutir o estresse energético.
Nos EUA, os dados de produtividade e custo unitário do trabalho do quarto trimestre estão previstos para hoje. Além disso, o presidente do Federal Reserve, Jerome Powell, voltará a falar no Capitólio, desta vez para testemunhar perante o Comitê Bancário do Senado. Outros Fed boys também são aguardados nesta quinta-feira.
Por aqui, no Brasil, o ministro da Economia, Paulo Guedes, toma café da manhã com Paulo Passoni, sócio-diretor do SoftBank. Ainda no ambiente político, entramos na abertura final da janela partidária, que permite que deputados federais e estaduais mudem de partido até o dia 1º de abril sem o risco de perder o mandato.
Muda o que na minha vida?
Após a invasão da Ucrânia pela Rússia, os governos ocidentais acionaram pesadas sanções contra bancos, empresas e elites russas, incluindo o próprio presidente Vladimir Putin. A mais relevante, porém, foi a chamada “opção nuclear”, que proíbe a Rússia de usar o SWIFT.
O que é SWIFT? Trata-se da Sociedade de Telecomunicações Financeiras Interbancárias Mundiais, que administra um serviço de mensagens que facilita transações em mais de 11 mil instituições financeiras em todo o mundo. Ou seja, a SWIFT não é uma instituição financeira e não é um canal de pagamento, mas, sim, um sistema de mensagens.
É como um grande banco confirma que a outro grande banco que um grande pagamento está sendo feito, especificando o remetente, banco receptor, valor, moeda, data e outros detalhes. Uma vez enviada a mensagem, o banco receptor torna-se o proprietário legal do valor em questão. As mensagens SWIFT são irrevogáveis.
Entidades em todos os países, exceto a Coreia do Norte, usam o SWIFT para embaralhar trilhões de dólares em fundos através das fronteiras. E a Rússia é um usuário avançado do SWIFT: como um grande fornecedor de energia e outros bens, ocupa o sexto lugar globalmente em mensagens de pagamento enviadas no SWIFT.
Isso é como cortar o oxigênio de alguém em terapia intensiva. A economia russa vai sufocar lentamente sem acesso ao SWIFT — o ocidente não apenas expulsou os bancos comerciais russos do SWIFT, mas também expulsou o Banco Central da Rússia do sistema. O efeito pode ser brutal para a economia russa. A invasão começa a sair muito mais cara do que o planejado por Putin.
Entretanto, a Rússia é um dos três maiores produtores de petróleo do mundo, sendo também a fonte de muitas commodities industriais críticas. Se você prejudica a economia russa, pode prejudicar a economia global. Sentiremos os efeitos em breve.
Um abraço,
Jojo Wachsmann