Colunista Vitreo

Pré-mercado: Correndo atrás do próprio rabo

16 mar 2021, 8:44 - atualizado em 16 mar 2021, 8:50
Obcecados pela inflação? “Eu penso em Dean Moriarty, eu penso em Dean Moriarty.” / On the road (2012)

Bom dia, pessoal!

Com um IBC-Br acima do esperado nessa segunda-feira (15), apesar de um resultado complicado no acumulado dos últimos 12 meses (-4,04%), o mercado já está precificando um aumento na taxa de juros por parte do nosso BC no dia de amanhã (17).

Com o cenário internacional não impeditivo, talvez conseguiremos repetir o movimento de alta de ontem.

Hoje, as Bolsas europeias abrem o dia em elevação, com futuros americanos acompanhando apenas pelo Nasdaq (Dow e S&P futuros continuam em queda nesta manhã). A ver…

Tem alguém atrás da curva?

Há um temor no mercado de que nosso Banco Central esteja ficando “behind the curve” (ou atrás da curva, em português); isto é, que esteja correndo atrás de seu próprio rabo agora, depois de ter ido, supostamente, longe demais em sua política monetária.

Diante do contexto, com crescimento dos indicadores econômicos, possível pressão inflacionária no curto prazo e escalada do dólar — o efeito de “pass-through” (termo em inglês usado em economia que se refere ao aumento dos preços internos do país, que ocorre quando o dólar se valoriza frente à moeda nacional).

Na inflação também preocupa —, o mercado passa a pressionar o BC para acelerar o movimento, elevando as expectativas para alta maior da Selic amanhã (a reunião, por sua vez, tem início hoje, com decisão apresentada amanhã depois do fechamento dos mercados), de 75 pontos-base para 2,75% de Selic Meta ao ano.

Para os que esperam uma alta mais contida, com um ajuste inicial entre 25 e 50 pontos-base, há um entendimento de que o comunicado, em conjunto com a decisão, venha mais “hawkish”, uma vez que, para muitos, o Copom já está atrás da curva.

Poderio econômico americano em 2021

Economistas começam a esperar que o crescimento econômico dos EUA possa rivalizar com o da China neste ano. Por décadas, a economia chinesa cresceu muito mais rápido do que a norte-americana, fato que pode mudar à medida que a recuperação dos EUA ganhe impulso.

Em grande parte, a movimentação se deve à aprovação do pacote de estímulos de US$ 1,9 trilhão de Joe Biden, que é muito maior do que a maioria dos financistas projetava ser possível apenas alguns meses atrás.

Com crescimento do PIB em 2021 projetado para algo entre 7% e 7,5%, o mercado começou a ver um excesso de crescimento americano quando comparado com a meta oficial do governo chinês de mais de 6%.

Claro, 6% para a China em 2021 é um número conservador. Mais provável que cresça mais de 8%… Ainda assim, se os americanos conseguirem momentum na recuperação econômica atual, principalmente com os próximos pacotes de Biden em infraestrutura e energia renovável, é possível que vejamos uma mudança positiva no crescimento sustentado dos EUA.

Dessa forma, há quem estime que a contribuição norte-americana para o crescimento global em 2021 será mais forte do que a do gigante asiático pela primeira vez desde 2005, ao passo que o país combate a pandemia, imuniza sua população e normaliza a situação. Com isso, temos um tempero adicional nas disputas comerciais entre os dois gigantes.

O palco está formado para a continuação das negociações de comércio. Embora a competição geopolítica muitas vezes possa ser prejudicial para os investidores, acreditamos que a situação atual apresenta oportunidades.

AstraZeneca suspensa e as condições financeiras europeias

Políticos em vários países europeus rejeitaram a opinião médica de especialistas e suspenderam temporariamente a utilização de uma das vacinas contra a Covid-19 — mais precisamente, a da AstraZeneca/Oxford, que está sendo produzida pela Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) no Brasil.

O risco? Que o movimento na Europa seja reproduzido em outras localidades, criando um medo da vacina e reduzindo seu uso, o que retardaria a expectativa de recuperação. Economicamente, isso teria o mesmo impacto que destruir os estoques de vacinas, em um continente que já está com a vacinação atrasada.

Enquanto isso, a presidente do BCE segue enfatizando a importância das condições financeiras estimulativas para a política monetária atual.

Claro, a autoridade percebe que se tornou imprudente enfatizar condições financeiras mais rígidas, dada a sensibilidade do mercado para o grau de estímulos na economia. Gradualmente, os formuladores de políticas monetárias provavelmente devem ser mais e mais vagos, deixando menos claras suas verdadeiras intenções.

O movimento, ainda que amenize a situação vigente, pode gerar um problema em bola de neve no longo prazo. O comunicado de Jerome Powell, presidente do Fed, amanhã será importante para que saibamos quão alinhados os dois estão.

Anote aí!

Em dia de agenda mais pacata no Brasil, vale acompanhar o IGP-10 de março, que deve, segundo a mediana das expectativas, desacelerar e subir 2,84% contra o mês anterior.

O IPC-S da segunda quadrissemana de março também é importante. Com a atual obsessão do mercado pela inflação, todo e qualquer dado que remeta aos preços poderá entusiasmar os investidores.

O Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged) deverá apresentar 179 mil postos formais de trabalho. Números acima do esperado elevaram a expectativa por um tom mais “hawkish” do BC amanhã.

No exterior, o dia abre hoje com a pesquisa de sentimento empresarial e econômico ZEW, para a Zona do Euro e para a Alemanha.

A inflação dos preços finais ao consumidor na França também é importante, mas será ignorada em um dia recheado de dados americanos na véspera do Fomc. Nos EUA, as vendas no varejo de fevereiro são o destaque de hoje.

Os gastos são enviesados ​​para bens por causa de restrições; como os serviços são mais intensivos em mão de obra, isso atenua o impacto dos gastos no mercado de trabalho. Produção industrial e preços de importação também chamam a atenção, assim como os estoques de petróleo.

A agenda nos EUA não está para brincadeira hoje.

Muda o que na minha vida?

A aprovação do pacote de ajuda do presidente Joe Biden de US$ 1,9 trilhão vai contribuir em muito para a recuperação da economia americana e, em uma segunda derivada, da economia global. O problema? O pacote pode elevar os preços de maneira sustentada, o que as autoridades não entendem como possível.

Como há grande ociosidade no mercado de trabalho (hiato do produto), fica mais difícil que a inflação estrutural se materialize, especialmente levando-se em consideração a quantidade de gastos ocasionais que o projeto contém

Claro, o pacote não elimina cicatrizes econômicas. Muitos empregos nos setores de hospitalidade, entretenimento e varejo nunca mais voltarão — como já conversamos algumas vezes neste espaço, o mercado de trabalho mudou de maneira estrutural e permanente em diversos sentidos.

Em estudos recentes, por exemplo, foi observado que a cada 15 trabalhadores desempregados, havia empregos disponíveis para apenas 10 deles. A questão aqui, evidentemente, vai muito além de política fiscal estimulada.

A expectativa? Que venham os novos projetos de lei para tratar da criação de empregos por meio do desenvolvimento de infraestrutura e do investimento em pessoas, em educação e treinamento, além do desenvolvimento da agenda ambiental de Biden por meio de energia renovável.

Até lá, é provável que o Fed consiga manter sua política estimulativa, diferentemente da posição do Brasil, que está infinitamente mais complicada. Aqui, o nosso BC não tem escolha senão subir juros, o que prejudica nossa recuperação.

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