Pré-Market: Sem Trégua
Olivia Bulla é jornalista e escreve diariamente sobre os mercados financeiros no blog A Bula do Mercado.
A pressão sobre o Supremo Tribunal Federal (STF) esvaziou-se, após a decisão do ministro Marco Aurélio Mello de não levar hoje ao plenário da Corte nova discussão sobre prisões na segunda instância, o que deve aliviar os negócios locais, diante da perspectiva de que o ex-presidente Lula segue preso. Com isso, as atenções dos mercados domésticos se voltam ao exterior, onde os investidores ponderam um aparente alívio das tensões do comércio global e a escalada do conflito na Síria, diante de um iminente ataque militar dos Estados Unidos.
Os índices futuros das bolsas de Nova York amanheceram no vermelho, uma vez que termina hoje o prazo de 48 horas dado pelo presidente norte-americano, Donald Trump, para tomar uma “decisão importante” em relação ao regime de Assad, acusado de usar armas químicas em ataque à cidade de Duma. Em meio a esse suspense, as principais bolsas europeias abriram em queda, após uma sessão de desempenho misto na Ásia.
Trump afirmou que os responsáveis pelo ataque químico na cidade vizinha à capital Damasco vão pagar um “alto preço”. A ação matou pelo menos 40 pessoas e a expectativa pela resposta vinda da Casa Branca reduz o apetite por risco, o que pesa nas commodities industriais, ao mesmo tempo em que mantém a busca por proteção em ativos seguros, com destaque para o dólar e os títulos norte-americanos (Treasuries).
Esses ativos também aguardam os números sobre a inflação ao consumidor norte-americano em março (9h30). A possibilidade de inflação mais alta nos EUA também está no radar dos investidores, uma vez que pode demandar do Federal Reserve uma postura mais agressiva no processo de aumento da taxa de juros do país. A ata da reunião do Fed em março (15h) também pode calibrar as apostas sobre a carga total de alta dos juros norte-americanos neste ano.
Na China, os índices de preços divulgados na virada do dia mostraram perda de força da inflação no atacado, que subiu 3,1% em março, em base anual, ante alta de 3,7% em fevereiro e previsão de +3,3%. No varejo, também houve desaceleração, para 2,1% no mês passado, de +2,9% em fevereiro e abaixo da previsão de +2,6%.
Aliás, o novo presidente do Banco Central chinês (PBoC), Yi Gang, divulgou ontem mais detalhes sobre as promessas do líder do país, Xi Jinping, em abrir a segunda maior economia do mundo, dando um alívio adicional à agenda protecionista dos EUA. Segundo Yi, a abertura do setor financeiro na China começa em 30 de junho, sendo que já em 1º de maio, a cota diária de compra de ações entre Xangai e Hong Kong irá quadruplicar.
Ainda assim, o mercado internacional segue muito volúvel. Por aqui, o ambiente está igualmente envolto de muitas incertezas, o que não deve dissipar o vaivém dos negócios locais no curto prazo, deixando os mercados domésticos sem uma tendência firme e ainda bastante frágeis.
Ontem, foi mais um dia de forte pressão no dólar, que defendeu a marca psicológica de R$ 3,40 e chegou a ir além de R$ 3,43, com os investidores estrangeiros demandando mais prêmio para manter seus recursos aplicados no Brasil.
Isso significa que os “gringos” decidiram reduzir o capital especulativo alocado no risco brasileiro, diante da menor atratividade proporcionada pelo retorno, por causa das incertezas internas no horizonte à frente. De maneira simplista, é o mesmo que dizer que as eleições entraram de vez no radar dos investidores e a ausência de um quadro eleitoral mais definido começa a incomodar o mercado – em especial os locais, que estão excessivamente alocados.
Há quem diga que a saída do ministro Henrique Meirelles criou uma motivação extra para diminuir a tomada de risco no Brasil, uma vez que a chegada de Eduardo Guardia à Fazenda não garante a credibilidade que se tinha com o “time dos sonhos”. Mais que isso, os ruídos vindos dos caciques do MDB, que preferem emplacar o presidente Michel Temer em uma chapa para reeleição, deixa dúvidas sobre as chances eleitorais do ex-capitão da equipe econômica.
Assim, goste ou não, a eleição de outubro é de longe o maior evento deste ano no país e a dinâmica do mercado doméstico deve ser um misto de receio político com o desafio que os candidatos de centro-direita irão enfrentar para ganhar o pleito e, então, colocar o país na trajetória de crescimento econômico com responsabilidade fiscal, via propostas reformistas. Mas essa receita pode desandar…
Afinal, o primeiro passo era tirar o ex-presidente Lula da eleição – e não transformá-lo em prisioneiro político. Os partidos de esquerda, movimentos sociais, apoiadores progressistas e até a imprensa internacional não abandonaram a tese de que o líder petista foi vítima de perseguição, baseada na hipótese de que ainda que ele não pudesse se candidatar, por causa da Lei da Ficha Limpa, a intenção era impedí-lo de atuar até como cabo eleitoral.
Diante disso, novos desdobramentos da decisão da Justiça de prender Lula por causa de um esquema de corrupção no âmbito da Lava Jato ainda podem surgir. Mas não será hoje que o STF irá colocar em julgamento as ações declaratórias de constitucionalidade (ADCs), que poderiam rever o entendimento da Corte sobre a punição de condenados em segunda instância – o que beneficiaria Lula.
Na agenda econômica do dia, o destaque doméstico fica com a primeira prévia de abril do IGP-M (8h) e para os dados regionais da produção industrial em fevereiro (9h). Depois, às 12h30, saem os dados parciais do fluxo cambial, que mostram o movimento sobre a entrada e saída de dólares do país no início deste mês, tanto na conta financeira quanto do lado comercial.
Ainda no calendário econômico norte-americano saem os estoques semanais de petróleo bruto e derivados no país (11h30). Às 15h, é a vez dos dados do Orçamento do Tesouro do país no mês passado. Na Europa, destaque apenas para o discurso do presidente do Banco Central Europeu (BCE), Mario Draghi (8h), durante um evento em Frankfurt.