Pré-Market: Recalculando a rota
Olivia Bulla é jornalista e escreve diariamente sobre os mercados financeiros no blog A Bula do Mercado
Os números robustos sobre o emprego nos Estados Unidos ainda ecoam nos mercados financeiros nesta segunda-feira, com os investidores avaliando a exposição ao risco e passando a colocar nos preços dos ativos a possibilidade de mais altas que o esperado na taxa de juros norte-americana neste ano. Essa perspectiva aumenta o custo de empréstimos em toda a economia do país e impacta os negócios pelo mundo, ampliando a correção.
Os índices futuros das bolsas de Nova York exibem perdas aceleradas nesta manhã, porém, bem menos intensas que o observado na sexta-feira, quando o recuo do Dow Jones e do S&P 500 chegou a 2%, encerrando a pior semana desde 2016, com quedas de quase 4%. Esse sinal negativo em Wall Street pesou nas bolsas asiáticas, que tiveram forte queda hoje, com a Bolsa de Tóquio registrando a maior baixa em 15 meses, de -2,55%.
Na China, Hong Kong reduziu as perdas (-0,95%) e Xangai fechou em alta (+0,73%), após intervenção do órgão regular local para conter a queda, elevando as garantias nas operações. Na Europa, as principais bolsas iniciam a sessão no vermelho, diante das apostas de quatro elevações nos juros dos EUA pelo Federal Reserve, quando antes se pensava em três altas. Nas moedas, o euro e a libra estão de lado, assim como as divisas emergentes.
Por sua vez, o petróleo estende as perdas, em meio ao aumento da exploração da commodity nos EUA, ao passo que os metais básicos ensaiam alta. Já no mercado de bônus, o rendimento dos títulos norte-americanos (Treasuries) segue atraente, o que elevou o juro projetado pelo papel de 10 anos (T-note) acima de 2,87% pela primeira vez desde janeiro de 2014. Para se ter uma ideia, no início do ano, a taxa desse bônus estava em 2,4%.
Esse movimento implica maiores rendimentos (yield) nos papéis de longo prazo e provoca uma reprecificação nos mercados, deslocando o fluxo de recursos de ativos mais arriscados. Os investidores estão se questionando se o Federal Reserve manterá um ritmo gradual de aperto monetário ou se deve acelerar o cronograma de alta dos juros dos norte-americanos, aumentando a taxa mais que o esperado, na esteira dos dados de emprego no país (payroll).
A criação de postos de trabalho nos EUA avançou em janeiro, com a abertura de 200 mil vagas, o que manteve a taxa de desemprego no menor nível em 17 anos, com o mercado de trabalho atingindo as condições de pleno emprego. Os salários cresceram ainda mais, registrando o maior ganho anual em mais de oito anos e meio.
Esses números ampliaram as expectativas de que a inflação no país vai acelerar neste ano. Dias antes da divulgação do payroll de janeiro, o Fed disse prever que os preços ao consumidor vão subir neste ano, em um sinal de que mantém o curso para elevar os juros em março, sob o comando do novo presidente Jerome Powell.
Porém, em razão de certa inércia da inflação norte-americana, ainda são majoritárias as chances de três aumentos na taxa de juros dos EUA ao longo de 2018 – como prevê o Fed. Mas só a possibilidade de um quarto aperto neste ano leva os investidores a realizar lucros, colocando no bolso os ganhos nos negócios com ações, moedas e commodities.
O Brasil está na mira desse movimento. Só na Bolsa, os investidores estrangeiros colocaram R$ 9,5 bilhões em janeiro, no maior ingresso de capital externo para o período em 11 anos. No mês passado, o Ibovespa subiu mais de 11%, na maior alta para o mês em seis anos, enquanto o dólar teve a maior queda mensal em seis meses em relação ao real.
As incertezas no front político local podem ser o motivo crucial usado como motivador para as realizações aqui, em um movimento capitaneado pelos “gringos”, que têm grandes lucros para embolsar. Afinal, seja por causa do cenário eleitoral, seja por causa do avanço das reformas, sobram dúvidas e o dinheiro lá de fora só deve voltar com força quando houver maior clareza.
Para começar, não se sabe quem irá presidir o país a partir de 2019. Por mais que o ex-presidente Lula tenha sido condenado em segunda instância, ainda não é certo quem será o candidato petista nas eleições de outubro, nem como ficarão as alianças à esquerda. Da mesma forma, as pesquisas eleitorais não mostram um candidato de centro, com viés reformista, disputando a corrida presidencial, enquanto a direita se divide em extremos.
Já em Brasília, o destaque é a volta aos trabalhos no Congresso, em sessão solene marcada para hoje, no fim da tarde. Porém, o retorno é simbólico e o início das atividades deve acontecer somente amanhã, quando ganha força as negociações sobre a reforma da Previdência.
Porém, após o presidente Michel Temer ter dado a entender que desistiu de aprovar novas regras para aposentadoria neste mês, é apenas uma questão de tempo o assunto sair do radar dos mercados domésticos. O governo sabe que será difícil colocar em votação um tema tão polêmico em ano eleitoral e reunir os 308 votos necessários entre os deputados.
Ainda assim, o governo deve jogar as últimas fichas para tentar aprovar a matéria na Câmara, encaminhando o tema ao Senado. O relator da proposta, o deputado Arthur Maia, admitiu mudar dois pontos no texto, flexibilizando as regras sobre acúmulo de pensão e para a transição dos servidores públicos que ingressaram antes de 2003.
Com o presidente e a equipe econômica lavando as mãos em relação à reforma da Previdência e deixando o tema para o governo eleito, em 2019, o Banco Central deve mudar o tom e adotar uma postura mais conservadora em relação ao ciclo de cortes na taxa básica de juros (Selic). A primeira reunião de 2018 começa amanhã.
Na quarta-feira, o Comitê de Política Monetária deve anunciar uma nova queda, de 0,25 ponto percentual, no juro básico, renovando o mínimo histórico da Selic, a 6,75%. Porém, os riscos vindos da conjuntura local e, cada vez mais, do cenário externo devem levar o BC a uma postura mais conservadora.
Afinal, a atividade doméstica vem ganhando força e a inflação já não surpreende mais para baixo, ao passo que os juros norte-americanos, como dissemos, podem subir um pouco mais. No mínimo, o BC deve adotar um tom mais neutro na comunicação, deixando as próximas decisões em aberto, sem se comprometer com qualquer movimento.
Aliás, a agenda de indicadores econômicos no Brasil traz os números oficiais da inflação ao consumidor (IPCA) em janeiro, na quinta-feira, e também sobre o desempenho das vendas do varejo em pleno mês de Natal, na sexta-feira. No mesmo dia, saem os dados da indústria automotiva. Hoje, o calendário do dia traz a Pesquisa Focus (8h25).
No exterior, o calendário traz dados de atividade na zona do euro e nos Estados Unidos, já nesta segunda-feira. Na China, o índice Caixin/Markit do setor de serviços subiu a 54,7 em janeiro, alcançando o maior nível desde maio de 2012, de 53,9 em dezembro. Também são esperados os números sobre a balança comercial chinesa e sobre a inflação ao produtor e ao consumidor no país, na quinta-feira. No mesmo dia, sai a decisão de juros no Reino Unido.