Mercados

Pré-Market: Prudência e Dinheiro no Bolso

09 nov 2018, 7:57 - atualizado em 09 nov 2018, 7:57

Olivia Bulla é jornalista e escreve diariamente sobre os mercados financeiros no blog A Bula do Mercado.

A cautela impera no mercado financeiro, no Brasil e no exterior. Os investidores devem redobrar a postura defensiva neste último pregão da semana, um dia após a decisão de juros do Federal Reserve e de muitas reuniões, mas poucos anúncios, em Brasília. A proximidade de quatro feriados nas próximas duas semanas, dois aqui e dois nos Estados Unidos, tende a esvaziar os negócios até o Thaksgiving, no dia 22, reduzindo a exposição aos ativos de risco.

Ontem, o Federal Reserve manteve os juros nos EUA no intervalo entre 2% e 2,25% neste mês, mas mostrou-se a caminho para elevar a taxa básica norte-americana em mais 0,25 ponto em dezembro, apesar das críticas do presidente Donald Trump. Com os riscos “mais ou menos equilibrados”, o Fed repetiu a intenção de manter um ritmo gradual no processo de aperto monetário, em meio ao crescimento “forte” da atividade econômica e do emprego.

Mas o Banco Central dos EUA esquivou-se em ir muito além e preferiu adotar uma linguagem que não projeta um olhar para frente, garantindo-lhe flexibilidade em relação aos próximos passos, sem se comprometer com ações futuras. É bom lembrar que a partir da próxima reunião do Fed, em dezembro, será concedida sempre entrevista coletiva, ao final de cada encontro, nos moldes do que o BC Europeu (BCE) faz atualmente.

Essa mudança eleva a transparência na comunicação do Fed, mas também torna as decisões menos previsíveis. Afinal, os investidores apenas esperavam novas pistas sobre alterações na condução da taxa de juros norte-americana apenas ao final de cada trimestre, quando as coletivas ocorriam. Agora, essas sinalizações podem acontecer a cada reunião.

Cientes disso e sem mudanças, por ora, na intenção do Fed de continuar subindo a taxa de juros nos EUA, o que eleva a atratividade do retorno seguro nos títulos do país (Treasuries), o mercado financeiro começa, enfim, a avaliar se não é o momento de começar a vender ações, em meio aos recentes níveis recordes em Wall Street. Os índices futuros das bolsas de Nova York amanheceram na linha d’água, mas com um ligeiro viés negativo.

As perdas foram mais pronunciadas na Ásia, onde as preocupações com o crescimento econômico na China pesaram em Xangai (-1,4%) e Hong Kong (-2,5%). A notícia de que Pequim planeja estabelecer cotas para empréstimos de bancos a empresas privadas azedou o humor, ao passo que os índices de preços ao consumidor (CPI) e ao produtor (PPI) chinês mostram sinais de pressão inflacionária.

Em outubro, a inflação no varejo da China permaneceu no segundo maior nível do ano, subindo 2,5% em relação a um ano antes, repetindo a leitura de setembro. Ainda assim, o dado segue abaixo da meta perseguida pelo governo, de 3%. Já os preços no atacado avançaram 3,3% no mês passado, desacelerando da alta de 3,6% no mês anterior.

Nos demais mercados, o dólar mede forças em relação às moedas rivais, à medida que o rendimento (yield) do título norte-americano de 10 anos (T-note) se sustenta acima de 3,20%, nos maiores níveis desde 2011, o que também enfraquece as commodities. O petróleo tipo WTI voltou à faixa de US$ 60, ao passo que o cobre também perde vigor.

A questão fiscal em países europeus, como Itália e Espanha, entra no radar, após alertas da União Europeia (UE) sobre o déficit orçamentário. As moedas de países emergentes recuam, com destaque para o won sul-coreano, o peso filipino e a rupia indonésia. Já o yuan chinês (renminbi) encerrou mais uma semana com perdas, sem sinais de alívio na guerra comercial com os EUA.

No Brasil, o mercado financeiro está percebendo, aos poucos, que a situação não está tão tranquila assim. Os desafios que o presidente eleito Jair Bolsonaro terá de enfrentar para contornar a trajetória de piora da dívida pública são latentes, o que mantém o investidor estrangeiro afastado do risco local, reduzindo o ímpeto da Bolsa de renovar máximas históricas, rumo aos 90 mil pontos, e impedido o dólar de buscar um piso abaixo de R$ 3,70.

A aprovação pelo Senado do reajuste salarial ao Judiciário, que provoca um efeito cascata em todo o funcionalismo público, foi um recado do Congresso de que existem outros dois Poderes. Essa mensagem sinaliza que as negociações com a Suprema Corte e com o Legislativo podem ser difíceis.

Tal percepção, combinada com a falta de coordenação inicial do governo eleito, com Bolsonaro “batendo cabeça” com sua equipe de transição, tem gerado certo desconforto entre os investidores, trazendo um pouco de nervosismo aos negócios locais. A sensação é de que o time ainda é amador, faltando experiência e, principalmente, traquejo político.

Diante disso, percebe-se, então, as dificuldades para votar – e aprovar – a reforma da Previdência, ou mesmo parte dela, antes do fim do ano. O mercado financeiro brasileiro até que tenta se animar com a articulação da atual gestão com o governo eleito para promover alterações nas regras da aposentadoria que dispensam emendas à Constituição – o que exigiria menos votos para passar entre deputados e senadores.

Mas essa negociação por uma reforma mais “light” também sinaliza uma falta de urgência por uma reforma mais ampla, provocando um fator adicional de risco às contas públicas. A ausência de uma proposta em si do novo governo para a Previdência também incomoda. Afinal, a discussão em torno da reforma ainda está pendente por não se saber qual é o plano.

Isso sem falar na sinalização negativa que o governo eleito tem passado à sociedade, ao eleger a “musa do veneno” para o Ministério da Agricultura, que seguirá dessassociado do Meio Ambiente, e também ao sugerir o fim do Ministério do Trabalho, em meio aos quase 13 milhões de desempregados e à subutilização da força de mão de obra entre cerca de 30 milhões de pessoas. A conta do reajuste ao Judiciário não deve ser vista, por ora, como um derrota do novo governo.

Muitos ruídos em torno da troca de comando no Banco Central, ou a permanência de Ilan Goldfajn no cargo, também tem causado certo mal-estar no mercado financeiro brasileiro. Os nomes ventilados como possíveis substitutos podem até agradar aos investidores, mas há um custo de transição, que envolveria um “período de aprendizado” com quem chega.

Não se trata, porém, de um cenário de instabilidade política. Por ora, o ambiente é apenas de cautela. Até por isso, os investidores estrangeiros ainda continuam com uma posição contrária em relação aos ativos brasileiros, o que tem impedido de dar ritmo aos negócios locais e reduzindo o volume financeiro.

O movimento decorre de perspectivas mais positivas para o Brasil na visão dos investidores locais, sendo confrontadas com os temores dos “gringos”, que têm aumentado a busca por proteção em ativos menos arriscados. Por ora, os locais mostram otimismo e se sentem protegidos do cenário externo mais desafiador, enquanto os estrangeiros estão preocupados com a capacidade do governo eleito de aprovar reformas e promover o ajuste fiscal.

A ver quem vence essa queda-de-braço.

Na agenda econômica do dia, o calendário norte-americano traz dados do atacado sobre a inflação (PPI) em outubro (9h30) e sobre os estoques em setembro (13h), além da leitura preliminar deste mês da confiança do consumidor (13h). Já o calendário doméstico traz a primeira prévia deste mês do IGP-M (8h), além de dados regionais sobre a inflação ao consumidor no início de novembro (8h) e sobre o desempenho da indústria em setembro (9h).

Leia mais sobre: