Pré-Market: Pânico global
Olivia Bulla é jornalista e escreve diariamente sobre os mercados financeiros no blog A Bula do Mercado
Não parece haver trégua nos mercados financeiros, um dia após Wall Street assustar os investidores, com o índice Dow Jones registrando a maior queda em pontos na história, caindo 6% na reta final do pregão e encerrando a sessão no maior recuo em mais de seis anos, zerando os ganhos acumulados desde janeiro. Nesta manhã, os índices futuros das bolsas de Nova York têm perdas aceleradas, o que imprimiu baixas de quase 5% na Ásia e prejudica o início dos negócios na Europa, espalhando certo temor nos demais ativos.
O chamado indicador de medo de Wall Street subiu mais de 100% desde ontem, atingindo o nível mais alto desde agosto de 2015, em um sinal de que os investidores estão assumindo características de pânico, quando a ordem do dia é sair dos ativos e embolsar o lucro ou, no máximo, buscar proteção em posições menos arriscadas. É o que acontece, por exemplo com o iene e os títulos norte-americanos (Treasuries), que são tidos como ativos seguros.
Na outra ponta, o petróleo cai pelo terceiro dia e se junta ao tombo entre os metais básicos, em meio à força do dólar frente as moedas correlacionadas às commodities. O motivo crucial para tanta aversão ao risco é a percepção de que o Federal Reserve pode ser mais enfático na trajetória de alta dos juros dos Estados Unidos neste ano. Portanto, não há nenhuma novidade no front para causar tanto temor pelo mundo.
Só que como os mercados financeiros iniciaram 2018 em um ritmo intenso, valorizando as ações, moedas e commodities em um curto intervalo de tempo, há espaço de sobra para corrigir os preços. E o movimento de volta parece ser na mesma velocidade, só que em direção contrária, provocando maiores distorções e gerando grande volatilidade nos negócios pelo mundo, sem saber onde encontrar algum tipo de fundo, capaz de dar suporte à queda.
Tal correção no exterior tende a ser potencializada nos mercados domésticos, pois ficou “barato” o recuo ao redor de 2,5% do Ibovespa ontem, sustentando-se ainda na faixa dos 80 mil pontos e permanecendo no azul neste ano. Já o dólar sentiu um pouco mais o impacto e pulou para a casa dos R$ 3,25, mas pode ter pressão renovada de venda hoje.
Até porque os fatores locais tampouco são animadores, com a cena política voltando ao radar dos negócios. A volta do Congresso aos trabalhos ontem resgata a expectativa em torno da votação da reforma da Previdência neste mês, mas é cada vez mais esvaziada a chance de o texto ser apreciado na Câmara dos Deputados na semana seguinte ao carnaval.
As dificuldades na negociação com a base aliada – seja para conquistar os 308 votos necessários, seja para alterar pontos da proposta – deixa o mercado doméstico cético quanto à aprovação de novas regras para a aposentadoria em 2018. Assim, se o governo desistir da matéria, o impacto nos negócios pode até ser diluído.
Talvez seja melhor aprovar uma reforma da Previdência por um governo eleito, a partir de 2019, com mudanças que eliminem, de fato, os “privilégios” na concessão dos benefícios aos aposentados. Afinal, o balanço de 2017 deixou claro que o rombo nas contas da seguridade social é causado mais pelos servidores públicos – civis, políticos e militares.
Conforme os números, do rombo da Previdência de quase R$ 270 bilhões em 2017, o maior já registrado, apenas um milhão de servidores públicos responderam por R$ 86,3 bilhões, ou quase um terço (32%) do déficit. Enquanto isso, pouco mais de 34 milhões de aposentados e pensionistas geraram um saldo negativo de R$ 184 bilhões, ou quase 70%.
Diante disso, a discussão em torno da reforma da Previdência passa a ser outra: quem vai assumir a responsabilidade por um eventual fracasso da aprovação da proposta do governo no Congresso. De olho nas eleições de outubro, nem o presidente da Câmara, Rodrigo Maia, nem o ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, querem assumir esse ônus e um tenta transferir ao outro a responsabilidade pelo fracasso.
No front econômico, começa hoje e termina amanhã a primeira reunião de 2018 do Comitê de Política Monetária (Copom), que deve renovar o piso histórico da taxa básica de juros, levando a Selic a 6,75% ao ano, dos atuais 7%. Os investidores aguardam o tom do comunicado que acompanhará o anúncio da decisão, para saber se ainda há espaço para novas quedas ou se o corte de 0,25 ponto neste mês será o último do ciclo.
A expectativa é de que o Banco Central adote um tom mais neutro, citando incertezas locais e externas. Já em termos de indicadores, a agenda desta terça-feira está fraca. No Brasil, destaque para o resultado de janeiro do IGP-DI (8h) e para o desempenho da indústria automotiva no período (11h20), enquanto no exterior as atenções se voltam para os dados de dezembro nos EUA sobre a balança comercial (11h30) e sobre o número de vagas de emprego disponíveis (13h).