Pré-Market: O grande encontro

06 abr 2017, 10:54 - atualizado em 05 nov 2017, 14:05

Olivia Bulla é jornalista e escreve diariamente sobre os mercados financeiros no blog A Bula do Mercado.

Os líderes das duas maiores economias do mundo reúnem-se hoje, na Flórida, e esse grande encontro entre Donald Trump (EUA) e Xi Jinping (China) eleva a cautela dos mercados financeiros. A preocupação dos investidores quanto à força política do norte-americano e a forma como conduz questões delicadas tende a potencializar a aversão ao risco nos negócios locais, após o susto com o placar da Previdência ontem.  

Por mais que Meirelles afirme que o governo terá maioria dos votos para aprovar a reforma, os 251 deputados contra as mudanças nas regras da aposentadoria, conforme um levantamento feito na imprensa, mostraram aos mercados domésticos que a aprovação da medida não é tão certa como prevê o cenário-base. Para o ministro, o placar desfavorável e os parlamentares contrários refletem a atual fase de discussão, mas não há uma estratégia clara do governo para reverter tais votos.

A questão é que os números do levantamento apontam apenas 95 deputados a favor, sendo 84 com ressalvas, e isso mostra o quão desfigurado – e até desidratado – pode ser o texto original sobre a reforma da Previdência. As mudanças em pontos polêmicos, como a regra de transição, somados aos recuos já efetuados pelo presidente Michel Temer, como na retirada de servidores estaduais e municipais, levantam dúvidas quanto à eficácia da medida no controle das contas públicas.

Como dito ontem, no cenário-base dos mercados domésticos, as reformas passam com larga vantagem e sem grandes mudanças, o que permitiria uma nova rodada de valorização dos ativos brasileiros. Porém, se até meados do mês que vem a reforma seguir sem sinais de aprovação e os ruídos vindos da base aliada cresceram, bolsa e dólar devem começar a mostrar fraqueza.

À esse ambiente interno mais desafiador soma-se o cenário internacional, que ficou mais azedo após compreender o recado do Federal Reserve sobre a redução do seu balanço de pagamento ao longo de 2017. A intenção do Banco Central dos Estados Unidos de enxugar em US$ 4,5 trilhões a exposição em títulos públicos e imobiliários neste ano foi, enfim, entendida como uma drenagem da atual liquidez global.

Em reação, os ativos de maior risco perdem valor no exterior. Os índices futuros das bolsas de Nova York estão no vermelho, mantendo o sinal negativo que prevaleceu no fechamento do pregão em Wall Street na véspera. Esse comportamento afetou o desempenho das bolsas na Ásia – exceto Xangai (+0,33%) – e contamina o início da sessão na Europa.

Já o rendimento dos títulos norte-americanos (Treasuries) seguem em queda, diante da percepção de que uma redução do balanço do Fed poderia diminuir a necessidade de aumentos na taxa básica de juros dos EUA (FFR). O dólar, por sua vez, avança, o que enfraquece as commodities metálicas, mas o petróleo se segura na faixa de US$ 50.   

A discussão do Fed sobre reduzir o balanço de pagamentos prendeu a atenção dos investidores, que veem na medida uma reversão da injeção recorde de recursos monetários que dominou a política dos principais BCs globais nos anos seguintes à crise de 2008. Para o Fed, altas graduais na taxa básica norte-americana devem acontecer de modo concomitante, com a redução do balanço estando atrelada a um nível de juros.

Isso significa dizer que o Fed está disposto em melhorar a remuneração em títulos, ao mesmo tempo em que busca reduzir a quantidade de papéis em circulação e a exposição a eles. Trata-se de uma estratégia que embute um “risco Trump”, no sentido de recomprar tais ativos, antes que o republicano comece a implantar as promessas polêmicas de campanha.

Desse modo, o Fed lançou luz sobre a agenda do governo Trump para definir a quantidade de altas necessárias na taxa de juros norte-americana neste ano. A ata da reunião de março realçou que a falta de uma posição mais clara do republicano quanto à expansão fiscal mantém a autoridade monetária em suspense.

Por ora, a maioria dos membros do Fed não acredita que estímulos fiscais, como cortes de impostos e aumento dos gastos públicos, devam ser adotados antes de 2018. Para o colegiado, “há incertezas consideráveis sobre o momento e a natureza das mudanças na política fiscal, bem como seus efeitos sobre a economia norte-americana”.

Até por isso, o mercado está em compasso de espera pelo encontro entre Trump e Xi, no clube privado do norte-americano em Mar-A-Lago. Espera-se um tom “conciliatório” nas reuniões de hoje e amanhã, mas é difícil saber como vai decorrer o encontro à medida que questões comerciais e geopolíticas forem sendo levantadas.

É a oportunidade única para Trump enfrentar o líder da nação que ele acusa de roubar milhões de empregos nos EUA, por causa dos produtos chineses baratos, e para avançar na marcha contra a Coreia do Norte e seus testes de míssil nuclear. Será a tentativa do presidente dos EUA de vencer negociações com o principal rival econômico e militar.

Do lado chinês, a visita de Estado terá foco na comunicação efetiva sobre os assuntos de preocupação comum, estabelecendo o tom para o desenvolvimento futuro das relações bilaterais e dando estabilidade à relação China-EUA. É, portanto, o grande evento desta quinta-feira, em meio à agenda econômica mais fraca no exterior.

Nos EUA, saem apenas os pedidos semanais de auxílio-desemprego feitos no país (9h30). Antes, na zona do euro, merece atenção a publicação, às 8h30, da ata da reunião de março do Banco Central Europeu (BCE). O documento também pode tratar da questão de redução de estímulos na região da moeda única. Também é esperado um discurso do presidente do BCE, Mario Draghi.

No Brasil, destaque para a deflação esperada para o IGP-DI de março (8h), de -0,01% ante fevereiro, e também para os números da Anfavea sobre o setor automotivo (11h20) no mês passado e no acumulado do primeiro trimestre.

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