Pré-Market: Mercado não se engana com tom dócil do Fed
Olivia Bulla é jornalista e escreve diariamente sobre os mercados financeiros no blog A Bula do Mercado
O mercado financeiro até que tentou respirar aliviado com o tom mais suave (“dovish”) do Federal Reserve ao final da reunião de maio, mas uma releitura do comunicado que acompanhou o anúncio da decisão ontem falhou em esvaziar a expectativa de um viés mais duro (“hawkish”) na condução da taxa de juros norte-americana. Apesar da ausência de indicações de que o aperto monetário nos Estados Unidos será mais forte do que o inicialmente previsto, os investidores reavaliam o apetite por ativos de risco pelo mundo.
As principais bolsas asiáticas fecharam em queda, seguindo as perdas da véspera em Wall Street, que contaminou o sentimento global nos negócios. Nesta manhã, porém, os índices futuros das bolsas de Nova York estão em alta, mas o sinal positivo não anima o pregão na Europa, onde as bolsas também estão no vermelho.
O destaque nas bolsas ficou com o anúncio da fabricante chinesa de celular Xiaomi de lançar ações em Hong Kong, na maior abertura de capital (IPO) desde 2014, que deve arrecadar US$ 10 bilhões. Já o rendimento (yield) do título norte-americano de 10 anos (T-note) oscila em alta, enquanto o dólar perde terreno, depois de atingir o maior valor desde janeiro. As principais commodities industriais avançam, com destaque para o cobre e o petróleo.
As atenções dos investidores se voltam, agora, para as negociações sobre o comércio internacional entre EUA e China, com a chegada de uma missão norte-americana em Pequim. Porém, um avanço na questão é improvável e as autoridades de ambos os lados trataram de esvaziar as expectativas em relação ao encontro, com as partes seguindo insatisfeitas.
Com isso, o mercado financeiro segue digerindo a mensagem deixada ontem pelo Fed, tentando mensurar qual (e quando) deve ser a próxima ação da autoridade monetária.
Ao manter a taxa de juros norte-americana na reunião de ontem, o Fed sequer corroborou as expectativas de que elevará o custo do empréstimo nos EUA em junho. Contudo, a observação de que a inflação está se aproximando do alvo de 2% e a avaliação otimista sobre a atividade e o desemprego no país trouxe uma linguagem um pouco mais hawkish.
O viés mais duro foi percebido, mas o mercado financeiro ainda questiona se tal postura significa uma guinada rumo a um total de quatro altas nos juros do país neste ano ou se prevê uma condução mais agressiva no processo só no ano que vem. O Fed já elevou a taxa uma vez neste ano, em março, e ainda há dúvida se serão mais duas ou três altas em 2018.
Os investidores mantiveram, então, as apostas de que o Fed aumentará os juros pelo menos mais duas vezes neste ano, mas a decisão do mês que vem passou a ficar em aberto. A curva implícita reduziu para menos de 50% a possibilidade de uma quarta elevação neste ano, em dezembro, sendo que as chances mais expressivas são de altas em junho e em setembro.
Assim, a reunião deste mês do Fed forneceu poucas informações novas e trouxe apenas pequenas alterações no texto do comunicado, mantendo a perspectiva, por ora, de que devem ocorrer apenas mais duas altas na taxa básica de juros dos EUA, sem pressão adicional sobre o fluxo global de recursos – principalmente nos países emergentes.
Aliás, o real brasileiro pode respirar aliviado hoje, um dia após o dólar ir além da marca de R$ 3,55. A decisão do Banco Central de aumentar a oferta de contratos de swap cambial para além do necessário deve atenuar a pressão de alta na moeda estrangeira, com o aumento da liquidez de recursos no mercado de câmbio satisfazendo a busca por proteção (hedge).
Ainda assim, o cenário externo desafiador somado às incertezas eleitorais penaliza o mercado doméstico. Afinal, o investidor ainda não vislumbra um candidato com perfil reformista apto para disputar a corrida presidencial. A preferência do investidor é de que o próximo presidente dê continuidade ao ajuste das contas públicas e à agenda de reformas estruturais. Contudo, tal possibilidade não aparece nas pesquisas de intenção de voto.
Na agenda econômica doméstica, o destaque fica com o desempenho da indústria em março. A expectativa é de que a produção industrial avance pelo segundo mês consecutivo, em +0,5% em relação a fevereiro, registrando a décima primeira alta seguida na comparação anual. Em relação a março do ano passado, a previsão é de alta de 3,3%.
Os números efetivos serão conhecidos às 9h e podem lançar luz sobre o impacto do setor na atividade doméstica no início deste ano. Antes, saem os dados regionais da inflação ao consumidor (IPC-S) em abril (8h). Já na safra de balanços, destaque para os resultados trimestrais das varejistas Lojas Renner e Magazine Luiza, após o fechamento do pregão local.
Já no exterior, a zona do euro divulga, logo cedo, a primeira estimativa do Produto Interno Bruto (PIB) nos três primeiros meses de 2018, além do índice de preços ao produtor em março. Dados de atividade no setor de serviços do Reino Unido, Estados Unidos e da China recheiam o calendário econômico ao longo do dia.
Ainda na agenda norte-americana, merecem atenção o resultado da balança comercial em março, os pedidos semanais de auxílio-desemprego e o custo da mão de obra e da produtividade nos EUA no primeiro trimestre deste ano – todos às 9h30. Depois, às 11h, é a vez das encomendas às fábricas em março.